O Estado de São Paulo, n. 46693, 20/08/2021. Política p.A6

 

CPI quebra sigilos de Barros e Wassef

 

Daniel Weterman

Amanda Pupo

Julia Affonso

 

A CPI da Covid aprovou ontem um novo pedido de quebra de sigilo fiscal do deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR), líder do governo Jair Bolsonaro na Câmara. O colegiado vai requerer os dados à Receita Federal, assim como informações sobre investigações que envolvam Barros no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal de Contas da União (TCU). Anteriormente, a comissão havia aprovado o acesso a informações bancárias do parlamentar. Na sessão de ontem, os senadores também deram aval a um requerimento que quebra o sigilo fiscal do advogado Frederick Wassef, que defende o presidente e sua família.

Em junho do ano passado, a Polícia Federal prendeu Fabrício Queiroz, o ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) – acusado de comandar um esquema de rachadinha para o parlamentar quando ele era deputado estadual pelo Rio –, em uma propriedade do advogado na cidade de Atibaia (SP).

As informações sobre Wassef deverão ser fornecidas pela Receita Federal, com dados de empresas em que o advogado possa ter participação, como de faturamento desses negócios. No total, a CPI aprovou 186 requerimentos na reunião de ontem.

Algumas quebras de sigilo foram aprovadas para acessar informações sobre empresas que negociaram com o Ministério da Saúde. Um dos principais focos está na Precisa Medicamentos, que intermediou a compra da Covaxin, e em empresas que negociaram vacinas e medicamentos para a pasta.

Em depoimento ontem à CPI, o dono da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiniano, ficou em silêncio durante a maior parte do tempo quando questionado sobre as suspeitas envolvendo a aquisição da Covaxin (mais informações nesta página). O contrato é investigado pela comissão, que aponta para um esquema de corrupção no governo do presidente Jair Bolsonaro.

Maximiano levou à Índia uma comitiva de empresários com os quais suas firmas fizeram transações milionárias, consideradas suspeitas. A CPI apura se algumas dessas movimentações financeiras serviram para lavagem de dinheiro.

Os senadores quebraram o sigilo fiscal e pediram informações ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) de pessoas e empresas ligadas à Precisa, entre elas Maximiano. Aprovaram, ainda, a quebra de sigilos fiscal, bancário, telefônico e telemático da Global Gestão em Saúde, outra empresa de Maximiano que foi alvo de investigação do Ministério Público Federal (MPF) por um contrato com o Ministério da Saúde, em 2017.

Representantes de duas empresas que negociaram com o Ministério da Saúde foram convocados para prestar depoimento. O sócio da Belcher Farmacêutica, Emanuel Catori, e o executivo da World Brands Jaime José Tomaselli serão chamados para depor, conforme os requerimentos aprovados.

 

‘Constrangimento’. Na tradicional transmissão ao vivo que faz às quintas-feiras pelas redes sociais, Bolsonaro criticou a CPI. “Quebra de sigilo é coisa séria, meu Deus do céu! É um constrangimento para inocentes. Igual uma busca e apreensão. É um constrangimento, a pessoa fica marcada. Essas pessoas, com toda a certeza, se for quebrado de forma aleatória, como parece que foi, têm que entrar na Justiça para ir para cima da CPI”, disse o presidente na live. “Começar a mostrar para aqueles três ou quatro da CPI que eles não são os donos do mundo, não. Tentaram de toda maneira achar corrupção no meu governo, não acharam”, completou, numa referência ao presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM); ao vicepresidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e ao relator, Renan Calheiros (MDB-AL).

A CPI também aprovou uma série de pedidos para solicitar informações sobre hospitais do Rio de Janeiro. Ao depor, o exgovernador Wilson Witzel (PSC) indicou um esquema de corrupção na gestão do sistema.

Os integrantes da comissão deram aval ainda para a quebra de sigilos fiscal, bancário, telemático e telefônico da Fib Bank, que teria dado a garantia ao negócio fechado entre a Precisa Medicamentos e o governo federal na compra da vacina indiana Covaxin. Para senadores da comissão, há suspeitas de irregularidades na garantia apresentada pela empresa. A CPI também aprovou a convocação de dois diretores do Fib Bank, Roberto Pereira Ramos Junior e Luiz Henrique Lourenço Formiga.

 

Blogueiros. Com reação contrária da base governista, a comissão aprovou um bloco de requerimentos para quebrar o sigilo bancário e fiscal de pessoas ligadas a portais de apoio ao presidente Jair Bolsonaro na internet e acusados de disseminar notícias falsas na pandemia. Um dos alvos é o blogueiro Allan Lopes dos Santos, acusado de disseminar informações falsas na internet e investigado em comissão, a CPMI das Fake News no Congresso. A CPI também pedirá informações sobre as movimentações financeiras de blogueiros ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

 

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Dono da Precisa diz conhecer líder do governo, mas nega lobby

 

Empresário afirma à CPI que não teve influência na aprovação de lei para importação da Covaxin, proposta por Barros

 

O dono da Precisa Medicamentos, Francisco Maximiano, disse ontem, em depoimento à CPI da Covid, conhecer o deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR), líder do governo na Câmara, mas negou ter influência na aprovação de uma lei para destravar a importação da vacina indiana Covaxin, cuja negociação foi intermediada pela empresa.

A sugestão foi aprovada no Congresso após emenda apresentada pelo parlamentar os, investigado pela comissão.

“Por óbvio, tornava a Covaxin elegível, também como outras autoridades, mas não houve absolutamente nenhum contato com o deputado Ricardo Barros e tampouco com outro para fazer essa inclusão”, disse o empresário. O contrato é investigado pela comissão, que aponta para um esquema de corrupção no governo do presidente Jair Bolsonaro.

 

Preço. Maximiano, no entanto, optou por ficar em silêncio durante a maior parte do depoimento. Pressionado por senadores e com ameaça de prisão, ele afirmou que o preço das doses da Covaxin foi estabelecido pela fabricante indiana do produto, a Bharat Biotech.

Segundo ele, outra empresa, a Envixia Pharmaceuticals, intermediadora do laboratório indiano nos Emirados Árabes, foi a responsável por falsificar documentos junto ao Ministério da Saúde.

Em julho, a farmacêutica indiana anunciou a rescisão de seu acordo com a Precisa para venda da vacina Covaxin ao governo brasileiro, após o avanço das investigações. Na ocasião, a Bharat negou ter assinado duas cartas que fazem parte do processo administrativo de compra do imunizante e foram enviadas ao Ministério da Saúde.

 

‘Entendimento’. Em documento enviado à CPI, o laboratório indiano negou ter um contrato formal com a Precisa, mas um “momento de entendimento”. Maximiano disse que o contrato com o Ministério da Saúde previa pagamento diretamente para o fabricante, no caso, a Bharat Biotech, na Índia, mas não quis explicar por que o empenho de R$ 1,6 bilhão foi feito à Precisa. / D.W., A.P.e J.A.