O Globo, n. 32718, 06/03/2023. Política, p. 5

Ministro Juscelino Filho vira pivô de disputa entre PT e União Brasil

Fernanda Trisotto


Alvo de denúncias de desvio de conduta, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, virou pivô de um embate público entre o PT e o União Brasil, seu partido. Ontem, as bancadas do União Brasil no Congresso saíram em defesa do correligionário e criticaram a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), que na semana passada pediu o afastamento temporário do ministro. Hoje, ele deverá se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se explicar sobre as suspeitas.

Em nota assinada pelos líderes na Câmara, Elmar Nascimento (BA), e do Senado, Efraim Filho (PB), o União repudia a postura da dirigente petista e a acusa de agir com incoerência. “Lamentamos que Gleisi utilize dois pesos e duas medidas para tratar de assuntos inerentes à vida pública. Quando atitudes dos seus aliados são contestadas —e não faltaram acusações a membros do PT na história recente do país —a parlamentar prega o direito de defesa”.

Elmar e Efraim lembram no texto que Juscelino Filho já foi eleito deputado federal três vezes e sustentam que ele sempre manteve “uma postura respeitada” no Congresso. Por fim, os dois líderes questionam como a presidente do PT se comportará se surgirem denúncias contra correligionários dela: “Será que Gleisi fará a mesma declaração caso um integrante do seu partido seja alvo de ataques?”.

Os líderes do União Brasil, porém, não entram no mérito das denúncias contra Juscelino Filho, que nega as acusações e diz ser o maior interessado em explicar-se. O ministro usou um avião da Força Aérea Brasileira para ir a São Paulo, onde acompanhou um leilão de cavalos, e recebeu diárias pela viagem. Além disso, ele omitiu de sua declaração de bens entregue à Justiça Eleitoral no ano passado, quando se elegeu deputado novamente, um patrimônio de cavalos de raça avaliado em R$ 2,2 milhões. As informações foram publicadas pelo jornal O Estado de São Paulo.

Briga por espaço

A presidente do PT foi categórica ao comentar a situação de Juscelino Filho na sexta-feira.

— Olha, em situações como essa, eu acho que o ministro devia pedir um afastamento para poder explicar, justificar, se for justificável o que ele fez. Isso impede o constrangimento de parte a parte — disse Gleisi em entrevista concedida ao portal Metrópoles.

O embate entre União Brasil e PT vai além da permanência de Juscelino Filho no governo. Na prática, trata-se de uma disputa por espaços no primeiro escalão. A pasta entregue a Juscelino por pouco não ficou com um petista, o deputado Paulo Teixeira (SP), que acabou sendo nomeado ministro do Desenvolvimento Agrário. Ele foi preterido às vésperas da posse pelo presidente Lula. O plano era contemplar o União Brasil para garantir a fidelidade do partido no Congresso.

O União Brasil controla três ministérios. Além das Comunicações, indicou Daniela Carneiro para o Turismo e Waldez Góes, filiado ao PDT, para a Integração Nacional. Apesar das cadeiras que ocupa na Esplanada, o partido ainda não pacificou o apoio ao governo. A bancada na Câmara não se sente contemplada, já que os cargos foram negociados pelo senador Davi Alcolumbre (AP).

Os deputados do partido exigem publicamente mais postos para votar de acordo com os interesses do Palácio do Planalto. Na tentativa de dar fim ao impasse, recentemente, Lula decidiu manter o comando da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) com Elmar Nascimento, um dos que estavam descontentes.

A postura do União Brasil já foi criticada pela própria Gleisi. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo no mês passado, ela afirmou que, se a sigla não demonstrar a fidelidade que o governo deseja, “não tem por que permanecer onde está”.