O Globo, n. 32718, 06/03/2023. Política, p. 8

Recibo mostra que Planalto “recebeu outro pacote de joias''



Enquanto um conjunto de joias com valor estimado em R$ 16,5 milhões ficou retido pela Receita Federal, um segundo pacote que teria sido enviado pelo regime da Arábia Saudita, de presente para o então presidente Jair Bolsonaro, chegou ao Palácio do Planalto. É o que mostra um recibo oficial revelado pelo jornal Folha de S. Paulo.

O segundo pacote inclui relógio, caneta, abotoaduras, anel e um tipo de rosário, todos da marca suíça Chopard. Ele estava na bagagem de um dos integrantes da comitiva do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que esteve em missão oficial na Arábia Saudita, sem a presença de Bolsonaro, em outubro de 2021.

Os itens só foram entregues ao Planalto mais de um ano depois, em 29 de novembro de 2022, pelo assessor especial do Ministério de Minas e Energia (MME) Antônio Carlos Ramos de Barros Mello.

“Encaminho ao Gabinete Adjunto de Documentação Histórica — GADH caixa contendo os seguintes itens destinados ao Presidente da República Jair Messias Bolsonaro”, diz um trecho do recibo de entrega ao qual a Folha teve acesso.

Mello afirmou à Folha que os itens estavam sob a guarda do MME. Segundo ele, o ministério informou a Receita e a Presidência e pediu orientações assim que os supostos presentes foram recebidos. Ainda de acordo com o ex-assessor especial, houve uma série de tratativas para definir qual seria o destino do material, o que teria feito com que a entrega ocorresse mais de um ano após o recebimento.

Na tarde de sábado, Bolsonaro afirmou que as joias apreendidas no Aeroporto de Guarulhos iriam para o acervo da Presidência. As peças foram encontradas na mochila de um servidor do MME. Ao saber do ocorrido, o ministro Bento Albuquerque retornou à alfândega e disse que se tratava de um presente para a então primeira-dama Michelle Bolsonaro. O caso foi revelado pelo jornal O Estado de São Paulo.

— Eu estava no Brasil quando esse presente foi acertado lá nos Emirados Árabes para o ministro das Minas e Energia. O assessor dele trouxe, em um avião de carreira, e ficou na alfândega. Eu não fiquei sabendo. Dois, três dias depois a Presidência notificou a alfândega de que era para ir para o acervo. Até aí tudo bem, nada demais. Poderia, no meu entender, a alfândega ter entregue. Iria para o acervo, e seria entregue à primeira dama. O que diz a legislação?

Ela poderia usar, não poderia desfazer-se daquilo — disse Bolsonaro ao SBT, na saída da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), realizada em Washington (EUA).

O governo Bolsonaro fez oito tentativas de ficar com as joias (mais detalhes ao lado). Uma delas foi capitaneada pelo coronel Mauro Cid, chefe da Ajudância de Ordens da Presidência e homem de confiança de Bolsonaro, no dia 29 de dezembro do ano passado.