O Estado de São Paulo, n. 46694, 21/08/2021. Política p.A12

 

Bolsonaro veta fundo e emendas do orçamento secreto

 

Presidente decide não sancionar na LDO o valor de R$ 5,7 bi da reserva eleitoral e os repasses de recursos indicados pelo relator

Lauriberto Pompeu

Daniel Weterman 

O presidente Jair Bolsonaro decidiu vetar a adoção das chamadas emendas de relator e o valor de R$ 5,7 bilhões para o fundo eleitoral previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano que vem. Na prática, os vetos atingem a modalidade de liberação de recursos a parlamentares que é a base do esquema do orçamento secreto, revelado pelo Estadão, e barram o "fundão" turbinado pelo Congresso para financiar as campanhas em 2022.

Pressionado por diferentes setores da sociedade e por sua própria base eleitoral, que criticou fortemente nas redes sociais o aumento do financiamento público de campanhas, Bolsonaro já havia anunciado a intenção de vetar o valor aprovado em junho pelo Legislativo.

A decisão sobre os vetos foi comunicada em nota divulgada ontem pela Secretaria Geral da Presidência e seria publicada em edição extra do Diário Oficial da União – o que não ocorreu até a conclusão desta edição. O Congresso ainda terá de avaliar os vetos e pode vir a reverter as decisões do presidente sobre a LDO.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias foi relatada pelo deputado Juscelino Filho (DEM-MA) e garante a permanência da indicação das verbas pelo relatorgeral do Orçamento (modalidade RP-9) e pelas comissões do Congresso (modalidade RP-8). As emendas de comissões também foram vetadas por Bolsonaro. As duas modalidades de emendas não permitem identificar os congressistas que as solicitaram. Foram usadas pelo Planalto, em 2020, para enviar verbas às bases eleitorais de parlamentares sem os critérios de distribuição e transparência adotados para as demais emendas. O mecanismo foi questionado no Tribunal de Contas da União (TCU), que concluiu que o modelo fere a Constituição.

Ao justificar o veto, o governo informou que o fez "por motivos de política fiscal". A Secretaria-geral da Presidência afirmou, em nota, que as modalidades de emendas vetadas "ampliam a segregação" de emendas de livre escolha de responsabilidades de ministérios e que engessam "excessivamente a despesa". Isso pode "prejudicar a condução e execução efetiva de políticas públicas sob responsabilidades de cada Pasta", destacou a nota.

 

Novo projeto. Em 2020, os partidos obtiveram R$ 2 bilhões de fundo eleitoral para as disputas municipais. Nas eleições gerais de 2018, o total distribuído foi de R$ 1,8 bilhão. Bolsonaro deve agora encaminhar um novo projeto ao Congresso, alterando o modelo de cálculo para a despesa. O valor deve ficar entre R$ 3 bilhões e R$ 3,5 bilhões, de acordo com o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO). A análise do novo valor do fundo ocorrerá em dezembro, durante a votação do Orçamento.

A quantia citada por Gomes está abaixo do patamar de R$ 4 bilhões que o Centrão estava disposto a negociar. Apesar do valor sugerido pelo Palácio do Planalto, o governo federal e partidos ainda não chegaram a um acordo sobre o valor do fundo eleitoral de 2022.

Dirigentes de partidos consultados pelo Estadão disseram que ainda não há definição sobre o valor e evitaram afirmar se a quantidade sugerida pelo governo vai ter apoio. Os chefes das legendas não pretendem dar celeridade às negociações e querem usar todo o prazo até a votação do orçamento para definir o tamanho do fundo.

"A gente vai conversar entre os partidos para verificar qual o valor que vamos propor de acordo. Como foi feito lá atrás (na votação que havia definido os R$ 5,7 bilhões). É um negócio que ainda temos um prazo para fazer, e é só conversar", disse o presidente do Solidariedade, deputado Paulinho da Força (SP).

"Ele (Bolsonaro) vai ter de mandar um valor no orçamento e esse valor vai ser negociado daqui para votação do orçamento, ou seja, daqui para dezembro", completou o deputado.

Relator-geral no Congresso do orçamento de 2022, no qual a quantia vai ser definida, o deputado Hugo Leal (PSD-RJ) também afirmou que o valor do fundo ainda não tem um acordo: "Esta discussão é do coletivo de líderes. Vamos aguardar a consolidação da informação e ver as repercussões".

O deputado Luciano Bivar (PE), presidente do PSL, um dos partidos mais beneficiados com o aumento do fundo, declarou que o espaço para aumentar o dinheiro para as campanhas eleitorais pode ser feito como remanejamentos dentro da própria previsão do orçamento.

"Sem alterar o orçamento público, apenas com um pequeno ajuste em remanejar as emendas de relator. Isso atenderia a milhares de candidatos com valores razoáveis sem qualquer prejuízo de acréscimo orçamentário", afirmou Bivar ao fazer críticas ao esquema do orçamento secreto.

 

Defesa. Em evento promovido pela Frente Parlamentar do Empreendedorismo na última quarta-feira, o presidente do PSD, Gilberto Kassab, defendeu a decisão do Congresso de aumentar o fundo para R$ 5,7 bilhões. "Se não (houver aumento do fundo), a sociedade vai olhar e pensar que as reformas políticas são feitas para manter os mesmos políticos", declarou. Além dos

R$ 5,7 bilhões do "fundão", o Congresso previu outras mudanças e um valor para o Fundo Partidário que pode significar a aplicação de aproximadamente mais R$ 1,3 bilhão de recurso público no financiamento das campanhas em 2022. De acordo com Kassab, o aumento dos recursos públicos para as candidaturas acontece por causa da proibição de doações eleitorais de empresas privadas. "Empresas não vão doar. Criou-se uma cultura de que a doação era corrupta, e parte dela era. Se não tiver (financiamento) público, haverá caixa 2", disse o presidente do PSD.

 

Debate

"Esta discussão é do coletivo de líderes. Vamos aguardar a consolidação da informação e ver as repercussões."

Hugo Leal (PSD-RJ)

RELATOR-GERAL DO ORÇAMENTO DE 2022 NO CONGRESSO

 

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Maia toma posse e declara apoio à candidatura de Doria


Ex-presidente da Câmara assume a secretaria estadual de Projetos e Ações Estratégias e fará interlocução com políticos

Pedro Venceslau

 

No momento em que o governador João Doria disputa prévias no PSDB para ser candidato à Presidência em 2022, o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (sem partido), assumiu, ontem, o cargo de Secretário de Projetos e Ações Estratégicas de São Paulo em uma cerimônia formatada para ser uma demonstração de força do tucano.

Em seu discurso, Maia disse que é "natural" que o PSDB tenha candidato ao Palácio do Planalto, declarou apoio a Doria e defendeu que o paulista seja o representante da terceira via na disputa. "Não teremos cinco caminhos (em 2022). Teremos um caminho. Está na hora de fortalecer um projeto no nosso campo. Minha sinalização política está clara", afirmou o deputado fluminense, que se licenciou da Câmara para assumir o cargo no governo de São Paulo.

Maia disse ainda que, além de Doria, também considera natural a candidatura do ex-ministro Ciro Gomes (PDT). "Fora isso corremos o risco de deixar Bolsonaro chegar ao 2° turno", afirmou. Quando questionado se pretende entrar no PSDB e se ele estaria numa eventual chapa de Doria no ano que vem, o ex-presidente da Câmara afirmou que pretende se candidatar novamente a deputado federal pelo Rio de Janeiro, onde, segundo ele, seu projeto político está "vinculado" ao do prefeito Eduardo Paes (PSD).

Para dar peso ao evento de posse, Doria convocou seu secretariado e convidou o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo, que estava na plateia.

Ex-ministro da Fazenda de Michel Temer, o secretário estadual da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), fez um discurso no qual enalteceu o papel de Maia como presidente da Câmara e elogiou o "estilo Doria de governar".

O vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), que deve ser candidato ao governo paulista no ano que vem, também discursou. "Já estamos ganhando esse jogo. Com Rodrigo Maia vamos ganhar de goleada", afirmou.

Além do caráter administrativo da função, Maia, adversário de Jair Bolsonaro, assim como Doria, vai ajudar na interlocução do governador de São Paulo com políticos de outros Estados.