Correio Braziliense, n. 21553, 21/03/2022. Mundo, p. 9

10 milhões fora de casa



Temendo os efeitos da ofensiva russa, cerca de 25% da população da Ucrânia foi obrigada a deixar as suas casas. Segundo as Nações Unidas, são 10 milhões de pessoas fugindo de uma “guerra devastadora” e, atualmente, na condição de deslocadas dentro do próprio país ou refugiadas no exterior. “Entre as responsabilidades daqueles que fazem a guerra, em todo o mundo, está o sofrimento infligido aos civis que são forçados a fugir de suas casas”, escreveu, no Twitter, o alto comissário da ONU para os Refugiados, Filippo Grandi.

A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) calcula que, até ontem, 3.389.044 ucranianos haviam deixado o país desde 24 de fevereiro, outros 60.352 seguiam o caminho do êxodo. Cerca de 90% dos refugiados são mulheres e crianças. Isso porque os homens com idade entre 18 e 60 anos podem ser convocados para servir no Exército e, por isso, não estão autorizados a deixar o país.  

Preocupado com o deslocamento tão grande de meninos e meninas, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) alertou, no sábado, que as mais de 1,5 milhão de crianças que estão fugindo para o exterior estão sob riscos “reais e crescentes” de serem vítimas de “tráfico e exploração de seres humanos” e pediu aos governos vizinhos que tomem medidas para “mantê-las seguras”.

Dentro da Ucrânia, escolas e estações de metrô têm sido usadas pela população que teve que sair de casa — cerca de 6,5 milhões de pessoas — para se proteger dos confrontos. A estação de metrô Syrets, a noroeste da capital, Kiev, abriga cerca de 200 pessoas, entre adultos, idosos e crianças. Os trens circulam em uma única via, e os demais, imóveis, servem para dezenas de pessoas dormirem lá dentro. A cerca de 60 metros de profundidade, as pessoas querem dar uma falsa sensação de normalidade, até instalaram uma televisão.

Corredores humanitários

Ontem, 7.295 pessoas evacuaram Mariupol usando quatro corredores humanitários, segundo a vice-primeira-ministra da Ucrânia, Iryna Vereshchuk. A cidade está sitiada há dias, e há queixas de que organizações de ajuda humanitária estão encontrando dificuldades para chegar aos civis. “Devido à violação do cessar-fogo, a evacuação de Borodyanka para Bila Tserkva falhou pelo segundo dia consecutivo, e não foi possível entregar ajuda humanitária à aldeia de Mala Rohan. A comunicação com seis pessoas que deveriam entregar ajuda à cidade de Vovchansk foi perdida”, relatou Vereshchuk.

No norte do país, o prefeito de Chernihiv, Vladislav Atroshenko, descreveu a situação em sua cidade como uma “catástrofe humanitária absoluta”. “O fogo de artilharia indiscriminado continua em áreas residenciais, dezenas de civis, crianças e mulheres estão morrendo”, disse, em entrevista a um canal de tevê local. Segundo o prefeito, não há eletricidade e água, e “a infraestrutura da cidade está completamente destruída”. “Em um hospital bombardeado, pacientes operados ficam nos corredores a uma temperatura de 10 graus”, relatou.

Pressão sobre a China  

Também ontem, o Reino Unido somou-se à pressão internacional por um posicionamento chinês contrário à invasão russa. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, pediu que Pequim “saia de cima do muro” e alertou que, com a atual postura, o país corre o risco de “estar do lado errado da história”.  

Há insistência por parte dos americanos e de outras potências para que a China critique a ofensiva russa. Porém, o ministro de Relações Exteriores do país, Wang Yi, insistiu que a posição adotada por seu país é “justa, objetiva e compatível com os interesses da maioria das nações” e alertou que não vai aceitar pressão externa. “Nunca aceitaremos qualquer coerção e pressão externa e nos oporemos a quaisquer acusações e suspeitas infundadas contra a China”, disse a repórteres na noite de sábado.

Na mesma linha, o embaixador da China nos Estados Unidos, Qin Gang, criticou, ontem, em entrevista ao canal americano CBS, especulações em torno do envio de armamento ao governo russo. “O que a China está fazendo é enviar alimentos, medicamentos, sacos de dormir e fórmula para bebês, não armas ou munições para qualquer das partes”, enfatizou. Segundo ele, Pequim continua “promovendo as negociações de paz e pedindo um cessar-fogo imediato.” Para analistas, uma ajuda militar à Rússia por parte dos chineses transformaria um conflito transatlântico já explosivo em uma disputa mundial entre o Ocidente e a segunda maior economia do mundo.