O Estado de S. Paulo, n. 46712, 08/09/2021. Política, p. A16

Quatro partidos vão ao STF contra MP do Marco Civil

Vinícius Valfré


Partidos políticos de oposição anunciaram ontem que vão entrar com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo para que seja declarada inconstitucional a medida provisória publicada pelo governo de Jair Bolsonaro que dificulta a remoção de conteúdos das redes sociais.

Ao menos quatro legendas devem apresentar uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) à Suprema Corte: PT, PSDB, PSB e Solidariedade. Nas ações, vão argumentar que a medida, publicada no dia 6, inviabiliza o combate às fake news, representa retrocesso legislativo, prejudica a liberdade de expressão e facilita ameaças à democracia pela internet. O texto altera o Marco Civil da Internet, de 2014. Com ela, o presidente acenou à sua militância digital, que vem sofrendo retaliações das grandes plataformas por causa da desinformação, do discurso de ódio e dos ataques às instituições.

Em comunicado, o Solidariedade, presidido pelo deputado Paulinho da Força (SP), classificou a medida como “inconstitucional e inconveniente” e sem “os requisitos constitucionais de urgência e relevância”. “Não tem urgência nem relevância que justifique. É um desrespeito com o Congresso, com o STF e com a população”, apontou Paulinho. Sindicalista, ele tem dito que deve levar o partido a aderir a pedidos de impeachment a partir dos protestos de ontem pelo País.

O PT pede medida cautelar para que a suspensão se dê de forma imediata, por entender que a medida “tem o notório intuito de subverter a vontade do legislador infraconstitucional”, com vistas “ao favorecimento de usuários de redes sociais que extrapolam a liberdade de expressão e promovem a desinformação e o discurso de ódio”, afirma o advogado do PT, Eugênio Aragão.

Para o PSDB, a MP “inviabiliza o combate à disseminação de notícias falsas nas redes sociais” e deixa “caminho aberto para ataques à democracia”. Após o discurso de Bolsonaro ontem de manhã em Brasília, o presidente da sigla, Bruno Araújo, convocou reunião dos tucanos para discutir hoje uma posição sobre o impeachment de chefe do Poder Executivo. A medida provisória foi publicada na véspera dos atos convocados em defesa do governo. Ela não proíbe a retirada de publicações das redes mas cria novas regras para que isto aconteça.

Conteúdos. Pelo texto, plataformas como Instagram, Twitter e Facebook serão obrigadas a tornar públicos os critérios usados para definir quais conteúdos serão removidos. Também terão de restituir ao usuário o conteúdo que ele publicou na rede, no caso do banimento do perfil; e a rede social terá de notificar o usuário sobre a suspensão, explicando os motivos e informando sobre a possibilidade de recorrer. A MP foi elaborada pela Secretaria Especial de Cultura, vinculada ao Ministério do Turismo, e recebeu parecer favorável da área jurídica do governo. Pelas redes sociais, o titular do órgão, Mario Frias, defendeu o texto.

Mas as legendas entendem que o documento mina os esforços dos Poderes Legislativo e Judiciário no combate à desinformação, violando os princípios da legalidade, da proporcionalidade, da livre iniciativa e da função social da empresa.

De acordo com o PSB, a inconstitucionalidade da MP de Bolsonaro ‘é patente’ e sua manutenção ‘implica ameaça de dano à saúde e à segurança da população brasileira e de enfraquecimento das instituições democráticas, o que não se pode admitir’. O partido justifica a urgência de se derrubar o texto no fato de ele ter sido publicado às vésperas de atos antidemocráticos marcados para o feriado do dia 7 de setembro.

A ideia de recorrer contra a nova MP do Planalto já havia sido anunciada, antes, pelo deputado Alessandro Molon (PSBRS), líder da oposição na Câmara. Em 2014, Molon havia sido o autor do relatório que originou a lei do marco civil. Foi dele a sugestão inicial de que, além de pedir a devolução da MP, a oposição recorresse ao STF para impedir que ela entre em vigor. “Espalhar discurso de ódio não é liberdade de expressão. Eu não tenho direito de entrar em um avião que está decolando e gritar ‘bomba!’, comparou o deputado carioca. “Posso ser preso por isso. Não posso descer na rua e dizer que minha liberdade de expressão é ameaçar uma pessoa”, acrescentou.

Reações

“Não tem urgência nem relevância que justifique. É um desrespeito com o STF e com a população”

Paulinho da Força

SOLIDARIEDADE-SP

“Eu não tenho direito de entrar em um avião que está decolando e gritar ‘bomba!’”

Alexandre Molon

PSB-RJ