O Globo, n. 32732, 20/03/2023. Política, p. 10

IPEC: 57% querem terceira via viável contra polarização

Nicolas Iory
Bianca Gomes
Julia Noia


A despeito do resultado das urnas no ano passado, em que a votação ficou concentrada em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), pesquisa Ipec divulgada ontem revela que 57% da população gostaria que uma nova liderança política emergisse na chamada terceira via para que o país pudesse fugir da polarização. O percentual se refere à soma dos 39% que dizem concordar totalmente com essa necessidade e os 18% que afirmam concordar em parte. São 27% os que declaram discordar total ou parcialmente. Outros 5% disseram nem concordar nem discordar.

Na eleição presidencial de 2022, os candidatos que tentaram furar a polarização entre Lula e Bolsonaro não conseguiram somar nem 10% dos votos válidos no primeiro turno. A mais bem votada do grupo foi Simone Tebet (MDB), que totalizou 4,9 milhões de votos e depois apoiou Lula no segundo turno contra Bolsonaro. Hoje, a ex-senadora é ministra do Planejamento no governo do petista.

—Vários pesquisadores já constataram que ninguém gosta de votar em quem não tem chances de ganhar. E, além disso, os candidatos talvez não tenham se diferenciado o suficiente. A pesquisa mostra que há espaço para uma terceira via, à direita e à esquerda, mas não diz como. Esse será o principal desafio: se diferenciar —analisa a cientista política Mayra Goulart, da UFRJ.

Os dados do Ipec mostram ainda que o anseio por uma alternativa é compartilhado praticamente na mesma medida entre todos os segmentos da população. Entre católicos e evangélicos, grupos que se opõem em relação a alguns temas, o apoio a um nome de fora do eixo Lula-Bolsonaro alcança o mesmo patamar: 57% entre católicos e 59% entre evangélicos.

O maior percentual de brasileiros que dizem concordar totalmente com a ideia de ter uma terceira via está no Sul do país: 46%. Foi nessa região que Bolsonaro teve a maior diferença percentual para Lula no segundo turno, somando 62% dos votos válidos, contra 38% do petista.

“Representante do povo”

Quem menos apoia o surgimento de um terceiro nome no cenário político nacional são os brasileiros que avaliam positivamente o início do governo Lula. Nesse estrato, 53% dizem concordar com a necessidade de uma terceira via, índice que é de 62% entre os que classificam a gestão petista como regular e de 58% no grupo que vê a administração federal como ruim ou péssima.

O Ipec também perguntou aos entrevistados se concordavam com a afirmação de que “Lula é do povo e defende os mais pobres”: 61% disseram que sim. Cerca de um terço discordou total ou parcialmente da frase (35%), enquanto 2% não concordaram nem discordaram, e outros 2% afirmaram não saber ou não responderam.

Nas faixas de renda, o petista se destaca como representante popular entre quem recebe até um salário mínimo (71%). Jovens entre 16 e 24 anos (66%) e idosos (64%) também estão entre os segmentos que mais concordam com a afirmação, bem como pessoas com somente Ensino Fundamental completo (68%) e moradores do Nordeste (77%).

Como a eleição mostrou, o desempenho de Lula é melhor entre as classes mais baixas e pessoas com menor escolaridade, segmentos mais contemplados por políticas sociais implementadas durante seus dois primeiros mandatos (2003-2010) e retomadas agora. É o caso do Bolsa Família, que passa a ter benefício mínimo de R$ 600, do Farmácia Popular e do programa Minha Casa, Minha Vida, que vai privilegiar a faixa 1, voltada para famílias mais pobres.

Bolsonaro, por outro lado, é mais associado como uma liderança em prol da população mais pobre por brancos (36%), evangélicos (44%), pessoas que recebem mais de cinco salários mínimos (38%) e entre moradores das regiões Norte e Centro-Oeste (41%), segmentos em que o ex-presidente costuma ter taxas mais altas de aprovação.