O Globo, n. 32736, 24/03/2023. Política, p. 8

Impasse rea­cende no Con­gresso riva­li­dade local

Bernardo Mello


Adversários políticos em Alagoas, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), e o senador Renan Calheiros (MDB) trocaram farpas ontem por conta da disputa sobre o rito de análise das medidas provisórias (MPs). Renan, que é favorável à volta das comissões mistas, acusou Lira de tentar “usurpar” as funções do Senado, referindo-se à resistência do presidente da Câmara de retomar o modelo previsto na Constituição.

Ao criticar a insistência do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de retomar as comissões mistas, Lira disse lamentar que a “política regional de Alagoas interfira no Brasil”. Além de cutucar Renan, aliado do presidente Lula (PT), Lira também alfinetou o senador Davi Alcolumbre (União-AP), outro parlamentar próximo do Palácio do Planalto. O presidente da Câmara lembrou ainda que ambos os senadores emplacaram aliados em ministérios de Lula.

— O Senado não pode ser refém da política de Alagoas nem do Amapá. O maior interessado na vigência da MPs é o Senado, porque foram eles que indicaram ministros —disse Lira.

Renan, por sua vez, provocou Lira afirmando que derrota seus oponentes “em eleições diretas”, numa referência à eleição do atual governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), contra o candidato apoiado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Cunha (União). Em reação à fala de Lira, o senador emedebista argumentou, em suas redes sociais, que “o rito das MPs é constitucional, não paroquial”, ao defender a volta das comissões mistas.

“Sou defensor das diretas, desde as Diretas-Já, ao contrário dos meus adversários em Alagoas que gostam de indiretas. Aliás, os derroto em eleições diretas e, por isso, Arthur delira sem compreender o tamanho do cargo que ocupa”, rebateu Renan, fazendo um trocadilho com o sobrenome do presidente da Câmara.

Lira tornou a subir o tom, após a publicação de Renan, respondendo a outra publicação do senador, do dia anterior, na qual havia chamado o presidente da Câmara de “tiranete”. Em sua resposta, Lira criticou a postura de Renan e lhe sugeriu “a cadeira do psicanalista”.

“O bom da liberdade de expressão é que permite até os bobos se manifestarem, embora no geral se comportem de maneira ridícula, panfletária e incendiária. Para gente desse naipe o melhor seria a cadeira do psicanalista, não a do Parlamento, pois em nada contribui com a democracia”, escreveu Lira em suas redes.

Após uma campanha eleitoral acalorada em Alagoas no ano passado, Lira e Renan já acumularam novos atritos, por exemplo, com posições divergentes em relação à PEC da Transição.

Em meio à escalada da rivalidade com Renan e ao impasse sobre as MPs, Lira desistiu de se juntar à comitiva de Lula que viaja hoje à China. Renan, que preside a Comissão de Relações Exteriores do Senado, participará da viagem.