Título: Obesidade à margem do SUS
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 17/09/2005, Rio, p. A13

A espera por uma cirurgia bariátrica, para redução de estômago, tem sido um pesadelo para os obesos mórbidos cariocas que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS). Eles denunciam que, por falta de recursos, os hospitais públicos têm deixado de fazer as cirurgias. No Hospital de Ipanema, o único credenciado para o procedimento no estado, 2.815 pessoas esperam pela operação. Enquanto os doentes sofrem com as complicações da obesidade, o Hospital Clementino Fraga Filho, da UFRJ, na Ilha do Fundão, tenta há dois anos o credenciamento no SUS. Neste período, quase 2 mil pessoas procuraram o hospital para se submeter à cirurgia bariátrica. Mesmo depois de receber pareceres favoráveis das autoridades municipal e estadual de Saúde, o hospital da UFRJ não conseguiu o credenciamento para a realização da cirurgia pelo SUS. Há dois meses, segundo o coordenador do Programa de Cirurgia Bariátrica do hospital, Vinícius Gomes da Silveira, o Ministério da Saúde enviou uma resposta à unidade alegando que o credenciamento não seria feito por ''falta de alguns dados''.

- Disseram que faltavam algumas informações específicas na documentação. Esta justificativa mostra a incompetência administrativa do SUS - critica o médico, lembrando que o hospital passou por vistoria em 2003.

A assessoria de imprensa do Ministério da Saúde informou que o processo para o credenciamento do Hospital Clementino Fraga Filho está paralisado desde julho. Na época, o atual ministro Saraiva Felipe cancelou as portarias do antecessor, Humberto Costa. Havia a intenção da adoção de novos critérios para o credenciamento de hospitais que podem realizar as cirurgias bariátricas.

De acordo com Silveira, por causa da falta de verba, há dois anos,o Clementino Fraga não faz inscrições de novos pacientes. Atualmente, 200 pessoas estão em fase de preparo para serem operadas no hospital. São pacientes que fazem tratamentos de alguma especialidade médica, como os cardíacos graves, casos em que a cirurgia é indicada. Silveira lembra, no entanto, que cada cirurgia, quando os pacientes já levam os grampos usados no procedimento, causa um prejuízo de R$ 10 mil para o hospital. Os gastos incluem despesas com pessoal, internação e instrumental.

O Clementino Fraga Filho conta com estrutura de leitos especiais, instrumental, enfermaria e equipe médica adequada para realizar até cinco cirurgias por semana. No entanto, desde 2002, foram feitas apenas 100 operações de redução de estômago.

- Assim como nos casos de transplantes, o procedimento para realização das cirurgias bariáticas no hospital depende de uma verba específica - explica Silveira.

Segundo o coordenador do Programa de Cirurgia Bariátrica, estima-se que 0,4% da população do Grande Rio - quase 40 mil pessoas - tem indicação absoluta para a cirurgia bariátrica. De acordo com o especialista, a cirurgia de redução do estômago é indicada quando o índice de massa corporal (IMC) é superior a 40 quilogramas por metro quadrado. O procedimento também é recomendado nos casos de obesidade moderada, quando o IMC está acima de 35, associados com doenças como hipertensão e diabetes. Em média, uma cirurgia bariática custa R$ 18 mil.

- Não podemos deixar que o obeso morra na fila. Os obesos mórbidos dão grande prejuízo aos cofres públicos com internações que ocupam muito mais tempo nos hospitais públicos - lamenta Rosimere Lima da Silva, presidente do Grupo de Resgate a Alta Estima e Cidadania do Obeso (Graco).

Segundo Rosimere, os obesos também não têm conseguido operar no Hospital de Ipanema. Depois de cinco anos de municipalização, em maio a unidade foi devolvida ao governo federal. A assessoria de imprensa da unidade esclareceu que as cirurgias foram paralisadas por oito meses mas foram retomadas em março. Entretanto, há apenas uma cirurgia por semana. O hospital esclarece que trabalha com demanda além da sua capacidade.

O vereador Carlos Eduardo Mattos (sem partido), vice-presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal lembra que o Hospital de Ipanema sofre com problemas estruturais. Segundo ele, por causa de uma obra no telhado, apenas quatro das 11 salas do CTI estão funcionando. Ainda segundo o vereador, não existem programas públicos nas esferas municipal, estadual e federal de prevenção a obesidade.

- A obesidade é um dos principais fatores de risco para doenças vasculares. O que vemos é um jogo de empurra das autoridades que não assumem as suas responsabilidades - critica o vereador.