O Globo, n. 32686, 02/02/2023. Política, p. 9

Tropa anti-Planalto

Gabriel Sabóia
Jeniffer Gularte
Jussara Soares
Luísa Marzullo


Senadores e deputados eleitos com o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) iniciaram seus mandatos ontem com o discurso de que farão uma oposição combativa, exemplificada com cartazes pedindo “fora, Lula” logo na retomada do Congresso. A ideia é se distanciar das cenas de vandalismo de 8 de janeiro, mas sem largar bandeiras da direita com as quais se elegeram, como pautas de costumes e críticas ao que classificam como excessos do Supremo Tribunal Federal (STF).

No Senado, a tropa bolsonarista é composta por 14 nomes, como o ex-vicepresidente Hamilton Mourão (RepublicanosRS) e os ex-ministros Damares Alves (Republicanos-DF), Marcos Pontes (PL-SP) e Tereza Cristina (PP-MS). O ex-juiz da Lava-Jato Sergio Moro (União-PR) também engrossa as fileiras da oposição.

A ex-primeira dama Michelle Bolsonaro compareceu ontem ao Senado para acompanhar a posse dos eleitos no ano passado. Ela se engajou para a eleição de Rogério Marinho (PL-RN) para a presidência da Casa.

Questionada se Bolsonaro teme ser preso, Michelle foi enfática ao dizer que não. O ex-presidente viajou para os Estados Unidos pouco antes da posse de Lula e permanece naquele país desde então.

— Não é ele que tem que ter medo de ser preso — disse Michelle.

Na Câmara, onde o PL, de Bolsonaro, tem a maior bancada, com 99 deputados, integrantes do antigo governo também estiveram presentes, como Ricardo Salles (PL-SP), exministro do Meio Ambiente, e Eduardo Pazuello (PL-RJ), que comandou o Ministério da Saúde. A dupla debutou no Congresso ontem, assim como o youtuber bolsonarista Nikolas Ferreira (PL-MG).

Primeiro embate

Ontem deputados federais do PL deram a largada na legislatura com adesivos com dizeres de oposição ao governo Lula. Parlamentares como Nikolas, Eduardo Bolsonaro (SP), Julia Zanatta (SC), Gilvan da Federal (ES) e Gustavo Gayer (GO) apareceram no plenário com as frases “fora, Lula” e “fora, ladrão” coladas em seus ternos e também em cartazes.

A disposição já provocou o primeiro embate entre bolsonaristas e petistas no plenário da Câmara. Deputados do PT posaram para uma foto oficial e entoaram “olê, olê, olá: Lula, Lula”, tradicional jingle do presidente da República. Em resposta, aliados de Bolsonaro e gritaram: “Lula, ladrão, seu lugar é na prisão”.

Deputados do PSOL como Guilherme Boulos (SP) e Tarcísio Mota (RJ) responderam à provocação com o grito de “sem anistia”, em uma referência a investigações contra o ex-presidente e aliados.

Apesar do embate, os dois lados estavam unidos ontem para para reeleger Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara. Eleito para a segunda vice-presidência da Casa, Sóstenes Cavalcante chegou a usar um adesivo de Maria do Rosário (PT), que é candidata à segunda secretaria, como barganha para atrair os votos dos petistas.

No Senado, a estreante Damares não nega a ambição por protagonismo: ela quer integrar comissões estratégicas para suas pautas conservadoras, como a de Direitos Humanos. Planeja ainda compor o colegiado de Fiscalização e Controle e a cobiçada Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A ex-ministra, porém, diz que não fará “oposição por oposição”:

— Os bolsonaristas eleitos (para o Senado) são sensatos. Não vamos fazer oposição por oposição, seremos uma direita propositiva. Não vamos querer CPI para engessar o governo.

Apesar de ter apoiado Bolsonaro no segundo turno das eleições, Moro se declarou independente e disse que terá como principais bandeiras a segurança pública e o combate à corrupção. Ele também promete aderir a uma “oposição racional”.

— Eu não comungo das mesmas ideias e princípios do governo do PT. O PT acredita em uma economia fechada, numa sociedade fechada, e eu acredito em uma sociedade aberta, em uma economia aberta. Além disso, o PT normalmente é leniente com o combate à criminalidade e a questão da corrupção — disse o novo senador.

Ontem, Moro tomou posse ao lado da senadora do PT Teresa Leitão (PE). A escalação se repetirá ao longo do mandato: ele ficará entre Leitão e Humberto Costa (PT-PE) e atrás de Jussara Lima (PSDPI), suplente do ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, também petista. A proximidade com aliados de Lula chamou atenção nas redes. O ex-juiz ganhou projeção durante a Operação Lava-Jato quando foi responsável pela condenação do atual presidente. Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que o julgamento havia sido parcial.

A organização do Senado coloca os estados em ordem alfabética. O Acre fica logo na primeira fileira, enquanto o Tocantins está na última. Por este motivo, Moro se senta ao lado de dois senadores de Pernambuco.

Prioridades

Já Mourão diz que terá como prioridades as reformas tributária, administrativa e política, bem como as questões ligadas à saúde, educação, segurança pública e defesa.

— Sou contra as pautas que nada significam em termos de geração de emprego e renda. A favor de um equilíbrio fiscal e de ordem nas contas públicas. Atento ao uso do nosso dinheiro em projetos duvidosos junto a vizinhos mais duvidosos ainda.

O deputado Ricardo Salles (PL-SP), por sua vez, disse ter vontade de “aprender na prática” e, apesar de se dizer militante do bolsonarismo, não viu problemas em integrar o mesmo bloco que os petistas pela reeleição de Lira.

— Não é um problema ser oposição. Quero aprender na prática e me dedicar ao dia a dia da Câmara. Espero ocupar uma das vices dentre as três lideranças que o PL terá direito e ter tempo para ser deputado. Sobre a composição do bloco com os petistas, está claro que o acordo é pontual —minimizou o ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro.