O Estado de S. Paulo, n. 46733, 29/09/2021. Internacional, p. A12

Senadores dos EUA fazem alerta contra Bolsonaro

Beatriz Bulla


Senadores democratas enviaram ontem uma carta ao governo de Joe Biden, na qual demonstram preocupação com os ataques do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, ao sistema eleitoral do País. No texto, os congressistas pedem que o secretário de Estado, Antony Blinken, deixe claro que a relação entre EUA e Brasil estará em risco se Bolsonaro não respeitar o jogo democrático nas eleições presidenciais do ano que vem.

"Instamos o senhor a deixar claro que os EUA apoiam as instituições democráticas do Brasil e qualquer ruptura antidemocrática da ordem constitucional atual terá graves consequências", escreveram os senadores, entre eles Robert Menendez, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado.

Ao falar das alegações falsas de Bolsonaro sobre a possibilidade de fraude no sistema eleitoral, os congressistas afirmam que "esse tipo de linguagem imprudente é perigosa para qualquer democracia" e, no caso do Brasil, é também injusta porque o "País, por décadas, se mostrou capaz de facilitar transferências pacíficas de poder".

Os americanos também citam ataques pessoais de Bolsonaro a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Além de Menendez, a carta foi assinada por mais três senadores, incluindo Dick Durbin, presidente da Comissão de Justiça do Senado americano, Ben Cardin e Sherrod Brown. O documento foi encaminhado a Blinken e pede que ele faça do tema uma prioridade diplomática na relação com o País.

Pressão. Em agosto, quando o Conselheiro de Segurança Nacional, Jake Sullivan, esteve no Brasil, o respeito ao processo eleitoral brasileiro foi tema de encontro entre a comitiva dos EUA e o presidente Bolsonaro.

Em uma nova rodada da ofensiva para tentar barrar a entrada da chinesa Huawei no mercado 5G do Brasil, os americanos visitaram Brasília e acenaram com a possibilidade de estreitamento da cooperação militar entre os dois países. A oferta aconteceu, no entanto, em meio às investidas de Bolsonaro contra o sistema eleitoral vigente no País – o que despertou reação negativa entre muitos democratas.

Logo após a visita, Washington ressaltou que a conversa sobre a confiança dos americanos no sistema eleitoral brasileiro foi parte importante do encontro com Bolsonaro.

Com frequência, democratas do Congresso pressionam o governo americano a manter distanciamento do governo Bolsonaro e a romper relações com o presidente do Brasil em razão de sua posição com relação a direitos de minorias, meio ambiente e democracia. As cartas que têm Bolsonaro como alvo tiveram início ainda na campanha eleitoral de 2018 e só se intensificaram.

Mensagens. Desde a eleição de Joe Biden, no entanto, a reclamação dos democratas tem mais força junto ao governo americano, comandado por um presidente também democrata.

Em fevereiro, Menendez enviou uma mensagem a Biden cobrando que o presidente brasileiro e o então chanceler brasileiro Ernesto Araújo "condenassem" e "rejeitassem categoricamente" os ataques de partidários do ex-presidente Donald Trump ao Capitólio, no dia 6 de janeiro. Em tom de ameaça, a carta afirmava que, caso isso não acontecesse, haveria "sérios prejuízos para a relação bilateral".

O posicionamento do governo americano tem sido de pragmatismo. Biden evita se aproximar demais de Bolsonaro – os dois nunca conversaram por telefone – e sabe que qualquer contato seria mal visto entre democratas mais progressistas e junto à base da legenda.

O alto escalão de seu governo, no entanto, mantém diálogo aberto com o time de Bolsonaro. Na semana passada, em Nova York, o chanceler brasileiro, Carlos França, teve uma reunião com Blinken.

O ministro do meio ambiente do Brasil, Joaquim Leite, se encontrou no mesmo dia com o enviado especial para o clima do governo Biden, John Kerry.