O Estado de S. Paulo,
n. 46734, 30/09/2021. Política, p. A10
Câmara aprova projeto
que regulamenta 'IA'
André Shalders
A Câmara dos Deputados aprovou ontem um projeto de lei para regulamentar o uso
e o desenvolvimento da inteligência artificial no Brasil. Com apenas nove
artigos, o projeto não traz detalhes sobre o uso da tecnologia no Brasil,
criando apenas princípios gerais para o desenvolvimento e a aplicação da
tecnologia. O texto teve o apoio de todos os partidos, com exceção do PSOL, e
foi aprovado por 413 votos a 15. Agora, o projeto segue para o Senado Federal.
O projeto aprovado é
de autoria do deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE), e foi relatado pela deputada
Luísa Canziani (PTB-PR). De acordo com o texto, os
softwares de inteligência artificial devem ser construídos respeitando
princípios como a dignidade humana, a proteção de dados pessoais, a não
discriminação, a transparência e a segurança dos usuários – embora não haja
detalhes sobre como estes princípios serão garantidos.
Na ficção, a
inteligência artificial geralmente é retratada em histórias ameaçadoras, às
vezes envolvendo máquinas que se rebelam contra os seres humanos. Ela está, por
exemplo, em filmes como 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), ou Matrix (1999).
Na vida real, a inteligência artificial é um tipo de programa de computador
capaz de interpretar dados, aprender a partir deles e tomar decisões de forma
autônoma para cumprir uma determinada tarefa definida pelo seu criador. É usada
em lojas online, no controle de estoques de empresas, em ferramentas de
reconhecimento facial, em sistemas de prevenção de fraudes e na análise de
padrões de comportamento de consumidores, entre outras aplicações.
"O projeto de
Bismarck também cria a figura do 'agente de IA', que pode ser tanto o
desenvolvedor quanto o operador do algoritmo, e que passa a ser o responsável
legal pelas decisões tomadas pelo software. Este "agente de IA"
também é o responsável por garantir que o software respeite as normas da Lei
Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Mudanças. Inicialmente
contrário ao projeto, o PT chegou a obstruir a votação, mas depois de um acordo
com o autor e a relatora, votou a favor. O partido mudou de posição depois de
duas modificações no texto: uma que incluía a transparência entre os princípios
para a nova tecnologia; e o outro que determina a responsabilidade objetiva do
Estado em projetos públicos que utilizem a IA. Ou seja: se o uso da nova
tecnologia por parte do governo resultar em dano a alguém, o Estado será
responsabilizado, mesmo que não tenha tido a intenção de fazer mal. Outros dois
destaques apresentados pelo PT foram derrotados no plenário.
Professor da Faculdade
de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Lawgorithm,
uma associação de pesquisa em Inteligência artificial e direito, Juliano
Maranhão, afirmou que o projeto aprovado na Câmara tem o defeito de não
estabelecer regras vinculantes para o desenvolvimento da IA, mas apenas
princípios éticos baseados na regulamentação existente na União Europeia.
Segundo Maranhão, isto
pode resultar numa situação em que os detalhes da regulamentação serão
definidos por diferentes juízes em todo o país – e nem sempre de modo uniforme,
criando insegurança jurídica.