O Estado de S. Paulo, n.
46734, 30/09/2021. Economia & Negócios, p. B2
Escassez de energia e a
pressão sobre a Petrobras
Celso Ming
As projeções mais ousadas sobre o avanço dos preços internacionais do petróleo
estão sendo confirmadas. Na última terça-feira, a cotação do barril (196
litros) de óleo tipo Brent (referência do Mar do Norte) ultrapassou os US$ 80
pela primeira vez em três anos. E a tendência é de alta.
De repente, ficou
evidenciada uma forte escassez de combustíveis, principalmente de gás natural –
com que a maioria dos analistas não contava.
Por toda a parte,
sobreveio uma crise de energia. Não foi apenas o aumento do calor no Hemisfério
Norte no último verão que exigiu mais dos aparelhos de arcondicionado
e do consumo de energia elétrica. A recuperação da pandemia, especialmente na
China e nos Estados Unidos, passou a exigir mais energia. Muitas unidades de
produção foram paralisadas na Europa para atender às novas exigências
ambientais. Nos Estados Unidos, a produção de óleo e gás de xisto vem sendo
desestimulada pela nova política empreendida pelo presidente Biden. Aqui no
Brasil, as autoridades se viram na contingência de canalizar mais gás natural
para a operação das termoelétricas, para compensar, nesta crise hídrica, a
redução da geração de energia pelas hidrelétricas. Enfim, por motivos vários,
estamos diante de uma escassez global de energia, que pode ser temporária, mas
que não tem data para acabar.
O governo Bolsonaro
parece não ter desistido de adotar soluções populistas para estancar a alta dos
combustíveis. Desta vez, não é apenas o presidente Jair Bolsonaro que pretende
segurar ou reverter artificialmente os preços. O presidente da Câmara dos
Deputados, Arthur Lira, advertiu que: “O Brasil não pode tolerar gasolina a
quase R$ 7 por litro e gás de cozinha a R$ 120”. Mas ainda não explicou como
pretende impedir o intolerável.
O impacto da alta dos
combustíveis sobre o custo de vida é muito forte. Apenas neste ano, os preços
da gasolina subiram 31,0%; os do óleo diesel, 28,0%; e os do gás de cozinha,
23,7%.
As pressões para conter
os preços não vêm sendo feitas apenas sobre a Petrobras. O governo quer que os
Estados abandonem a sistemática atual que prevê determinada porcentagem sobre
os preços dos combustíveis e que passem a adotar um valor fixo,
independentemente das variações de preços, que hoje são determinadas pelas
cotações internacionais e pela variação do câmbio.
No gráfico, você tem a
alíquota de ICMS cobrada em cada Estado sobre os preços da gasolina comum ou
aditivada. Atualmente, cada Estado tem competência para definir a alíquota, que
hoje varia entre 25% e 34%.
A ideia de definir um
imposto fixo por litro parece aproveitável. O problema aí é convencer os
Estados (e sete municípios que têm participação nessa receita) a abrir mão de
arrecadação, que é relevante. Em 2020, do total arrecadado com o ICMS no Estado
do Tocantins, 31,7% foram com a tributação de combustíveis. O Piauí obteve
29,7%; e o Pará, 26,7%, segundo dados do Confaz.
Mas a motivação do
presidente da Câmara parece tão populista quanto a do presidente Bolsonaro.
Ambos querem ganhar as eleições com uma tampa nos preços dos combustíveis. E
Arthur Lira quer colocar uma pedra no sapato do seu adversário político em
Alagoas, o filho do senador Calheiros, Renan Filho.
A alta interna dos
combustíveis não se deve apenas à escalada dos preços do petróleo. Deve-se,
também, como já observado, ao avanço das cotações do dólar, que, por sua vez,
tem a ver com o aumento das incertezas que provêm dos erros e omissões da
política econômica. Não basta cobrar da Petrobras e dos governadores. É preciso
colocar o governo na linha para que as cotações do dólar possam cair. E isso
parece complicado.