O Estado de São Paulo, n. 46777, 12/11/2021. Economia p.B2

 

Senadores querem reduzir folga para novos gastos

 

Contas públicas PEC dos precatórios

Segundo relator da PEC, parlamentares articulam usar sobra no teto apenas para bancar pagamento do Auxílio Brasil

 

EDUARDO RODRIGUES

 

Designado como relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), admitiu ontem que parte dos senadores defende reduzir o espaço fiscal de R$ 91,6 bilhões criado pelo texto para novos gastos em 2022, ano eleitoral. A proposta, em resumo, posterga o pagamento de dívidas judiciais do governo e altera a correção do teto de gastos – regra que atrela o crescimento das despesas públicas à inflação.

Esse grupo de senadores quer encolher a folga para novos gastos em R$ 11,6 bilhões, com o argumento de que o espaço no Orçamento seja usado apenas para o pagamento do novo programa social Auxílio Brasil (substituto do Bolsa Família) e para gastos de saúde e educação – e não para incrementar as verbas destinadas para emendas parlamentares, que foi alvo de críticos da proposta.

Bezerra, no entanto, defende a folga do tamanho que foi aprovada pelos deputados. "O espaço fiscal que está sendo aberto (de R$ 91,6 bilhões) é o espaço necessário", afirmou ele em entrevista à GloboNews. Depois de ser aprovada na Câmara dos Deputados, a PEC precisa agora do voto de pelo menos 41 senadores em dois turnos de votação.

Como mostrou o Estadão, os sinais dados pelo mercado financeiro de que a PEC seria melhor solução para bancar o novo programa social do governo do que o "plano B" (com a prorrogação do auxílio emergencial) também estão sendo ouvidos pelos senadores.

Há um movimento, no entanto, que pretende mudar o texto para restringir o uso da folga de R$ 91,6 bilhões aberta com a PEC em ano eleitoral via redução das emendas de relator, base do chamado orçamento secreto, que foi colocado em xeque pelo resultado do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF).

"Alguns senadores sugerem que o espaço fiscal ideal ficaria entre R$ 75 bilhões e R$ 80 bilhões. Vamos debater, porque R$ 50 bilhões serão consumidos pelo novo Auxílio Brasil. A correção dos benefícios previdenciários consumirão outros R$ 24 bilhões. E a correção das despesas de outros Poderes e dos mínimos constitucionais de educação e saúde levam R$ 6 bilhões. É uma matemática, o espaço necessário nunca será inferior a R$ 80 bilhões", argumentou.

 

'CASUÍSMO'. O líder do governo enfatizou que o que os senadores têm questionado é a necessidade desses R$ 11,6 bilhões adicionais para além dos R$ 80 bilhões "já contratados" em despesas para 2022. "Mas é preciso lembrar que as despesas de investimento foram sacrificadas no Orçamento. A construção de casas, estradas e as obras hídricas serão paralisadas?", questionou. As críticas à proposta se concentram no "casuísmo" de mudar a correção do teto de gastos para abrir espaço a novos gastos, incluindo mais emendas parlamentares, em ano eleitoral.

Bezerra disse que o governo está aberto a discutir e checar os números, e quer mostrar que o espaço fiscal aberto é "justo, adequado e necessário". "O governo vive arrecadação recorde e vai entregar um déficit primário próximo de zero em 2022. Por isso, interessa ao governo o debate para que a PEC dos precatórios seja aprovada com responsabilidade. O governo quer espaço fiscal adequado, sem excessos", alegou.

Questionado sobre a mudança no cálculo do teto de gastos, com a sincronização pela inflação de janeiro a dezembro, e não mais de julho de um ano a junho do outro, o senador respondeu que essa mudança é tecnicamente legítima e evitará uma revisão da regra em 2026. "Não é nenhum arrumadinho", disse. "Não houve essa sincronização do teto antes porque a inflação era descendente, e no fim do ano se chegava com um teto melhor. Agora é o contrário."

Apesar do seu partido, o MDB, ter proposto a manutenção da regra atual do teto de gastos na Câmara, Bezerra argumentou que o MDB do Senado teria "compreensão" da necessidade da PEC. Ele admitiu, porém, que o líder do partido na Casa, Eduardo Braga (AM), quer aprofundar a discussão sobre a necessidade de R$ 91,6 bilhões ou R$ 80 bilhões de espaço fiscal aberto pela proposta. "Vamos mostrar nos próximos dias como será usado o espaço fiscal que está sendo aberto", concluiu.

A previsão é de que a votação do texto ocorra entre os próximos dias 23 e 24 na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A ideia é que a apreciação no plenário se dê na mesma semana, mas, caso não seja possível, essa etapa poderia ficar para a semana do "esforço concentrado", entre os dias 29 de novembro e 2 de dezembro.

 

"Alguns senadores sugerem que o espaço fiscal ideal ficaria entre R$ 75 bilhões e R$ 80 bilhões. Vamos debater"

Fernando Bezerra

Líder do governo e relator da PEC dos precatórios

 

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20 milhões não terão direito ao Auxílio Brasil, admite líder do governo

 

O líder do governo e relator da PEC dos precatórios no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), admitiu ontem que, com o fim do auxílio emergencial, cerca de 20 milhões de brasileiros ficarão de fora do Auxílio Brasil, o próximo programa federal. Segundo ele, o governo confia na retomada da economia e do emprego informal para que essas pessoas possam voltar a ter alguma renda.

"De fato, 20 milhões de brasileiros deixarão de receber o auxílio emergencial, porque o governo acredita que a economia está voltando, sobretudo no setor de serviços, com o avanço da vacinação. Vai voltar o emprego informal, muito forte na nossa economia", disse, em entrevista à GloboNews.

Mais de 40 milhões de brasileiros receberam o auxílio emergencial até outubro, em parcelas que variavam de R$ 150 a R$ 375.

"Para manter o auxílio emergencial em 2022, o governo gastaria R$ 140 bilhões. Se este governo pensasse na eleição, não tiraria 20 milhões de pessoas do auxílio. Mas o governo busca atender de fato os que estão passando fome, com cautela e prudência. Enfrentamos uma crise alimentar inédita no País, e é preciso focar nessas pessoas, temos de ter prioridades", argumentou.

Bezerra disse ainda que o valor de R$ 400 para o Auxílio Brasil valerá apenas até dezembro de 2022 pela necessidade de aguardar a performance da economia ao longo do ano. Ele lembrou que a equipe econômica ainda trabalha com a projeção de crescimento entre 1,5% e 2,0% em 2022.