Valor Econômico, v. 20, n. 4871, 01/11/2019. Política, p. A10

Ato representou fechamento de regime autoritário
César Felício


O Ato Institucional número 5 representou o fechamento de um regime autoritário em sua origem, até então contido por uma Constituição ilegítima em sua essência. As circunstâncias de 13 de dezembro de 1968, dia em que o Ato entrou em vigor, são portanto radicalmente diferentes das atuais no Brasil e das que podem se configurar no país em caso de perturbações sociais semelhante as do Chile.

Logo após o golpe militar de 1964, a junta que representava o Comando Supremo da denominada “Revolução” recorreu ao ex-ministro da Justiça do Estado Novo Francisco Campos, para vestir o arbítrio com a roupa do direito, baixando o primeiro dos Atos Institucionais, que não tinha número. No preâmbulo da medida, havia o alerta. “A revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma (...). Ela edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória.” A Constituição de 1946, portanto, tornou-se letra morta.

Sob esta filosofia o marechal Humberto Castelo Branco governou o país por quase três anos, outorgando ainda o AI-2, em 1965, que extinguiu partidos políticos, e o AI-3, que tornou indiretas as eleições para governador, e o AI-4, que convocou o Congresso para aprovar a toque de caixa uma nova Constituição, redigida dentro da Casa Civil por um seleto grupo.

Foi esta nova Constituição que o sucessor de Castelo Branco, o marechal Arthur da Costa e Silva, que representava outra corrente dentro das Forças Armadas, foi obrigado a jurar em 1967. Costa e Silva tinha que enfrentar a insatisfação social e política sem ter nas mãos a mesma caixa de ferramentas ditatoriais que Castelo Branco dispôs. Não podia cassar mandatos, expurgar o Supremo, prender pessoas sem habeas corpus, censurar a imprensa, fechar o Congresso, intervir em Estados e municípios e confiscar bens. Todas estas medidas arbitrárias faziam parte do AI-5, que libertou Costa e Silva das amarras criadas por seu antecessor.

O pretexto para a decretação do AI-5, que vigorou até 31 de dezembro de 1978, foi uma rebelião na Câmara dos Deputados. A Casa recusou-se a cassar o mandato de Marcio Moreira Alves (MDB-GB), que tinha feito, por ocasião da Semana da Pátria, um pronunciamento em que pedia que as moças casadoiras não dançassem nos bailes com cadetes do Exército. O pronunciamento de Moreira Alves havia sido uma provocação banal, mas estava em um contexto de complicações políticas crescentes para o governo de então, que enfrentava greves, ocupações de universidades e todo clima que caracterizou no mundo o ano de 1968.

Na reunião do ministério no Palácio das Laranjeiras que sacramentou o AI-5, apenas uma voz no governo Costa e Silva se ergueu contra a medida: a do vice-presidente Pedro Aleixo, que propôs o estado de sítio. No ano seguinte, quando Costa e Silva ficou inválido e teve que ser afastado do cargo, os ministros militares impediram que Aleixo assumisse a Presidência.