Título: Crime de guerra chega aos mosteiros
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Fonte: Jornal do Brasil, 21/09/2005, Internacional, p. A8

A promotora-chefe para questões da ex-Iugoslávia do Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia, acusou ontem o Vaticano de estar ajudando a esconder o maior suspeito de crimes de guerra da Croácia. Carla Del Ponte acredita que o general Ante Gotovina, acusado da morte de 150 civis sérvios em 1995 ¿ durante a guerra de independência da Iugoslávia ¿ , está escondido em um dos 80 mosteiros croatas ainda não identificados. Junto com Radovan Karadzic e Ratko Mladic, figura entre os criminosos de guerra mais procurados pelo organismo internacional e está foragido há quatro anos. Suas tropas também teriam matado e expulsado até 200 mil sérvios da região de Krajina.

Em entrevista ao jornal britânico Daily Teleraph, a promotora disse que ¿a Igreja católica¿ está escondendo seu paradeiro. ¿Tenho informações de que o general se encontra dentro de um mosteiro franciscano e, por isso, o Vaticano o está protegendo. Abordei o assunto com o Vaticano, mas eles se recusam a cooperar conosco¿, declarou, afirmando estar ¿extremamente desapontada¿.

O Vaticano, por sua vez, negou as denúncias:

¿A senhora Del Ponte não nos indicou com base em quais informações afirma que o general Ante Gotovina se encontra refugiado nos edifícios religiosos da Croácia de maneira a poder entrar em contato com as autoridades eclesiásticas competentes¿, afirma um comunicado divulgado pela Santa Sé. O assessor de imprensa do Vaticano, Joaquín Navarro Valls, diz que a Secretaria de Estado do Vaticano ¿não pode colaborar institucionalmente com os tribunais¿.

Valls ressaltou que a promotora ainda não respondeu aos pedidos de informações mais precisas feito pelo Vaticano.

O TPI, organismo da ONU, respondeu que se tivesse informações detalhadas não teria pedido ajuda à Igreja, mas à polícia croata, para prendê-lo.

O porta voz do Ministério do Interior da Croácia, Zlatko Mehun, disse que a polícia investigou há mais de um ano pistas que indicavam Gotovina escondido ¿numa construção da Igreja¿. No entanto, mostraram-se incorretas.

¿ A Igreja cooperou conosco ¿ acrescentou.

Já a mídia local sugeriu que os ¿linha-dura¿ franciscanos podem estar abrigando o criminoso sem o conhecimento dos líderes da Santa Sé.

A promotora italiana espera ainda uma resposta do papa Bento 16, a quem escreveu pedindo apoio no caso. Ela se reuniu e julho com o arcebispo Giovanni Lajolo, secretário das Relações Exteriores para os Estados do Vaticano, que afirmou não ter pistas do criminoso e que a Santa Sé não é obrigada a ajudá-la.

Para Carla, a Igreja pode identificar rapidamente o lugar em que se encontra o ex-oficial, foragido há quatro anos.

¿ Dizem que não sabem de nada, mas não acredito neles. Acho que possuem um serviço de inteligência muito desenvolvido.

Já a Conferência dos Bispos da Croácia rejeitou a denúncia, alegando não saber do paradeiro do criminoso. O escritório de Carla disse que a Igreja se recusou a fazer uma advertência a um bispo croata que classificou Gotovina como herói.

Os croatas são, em sua maioria, católicos romanos. Os sérvios são ortodoxos. As duas igrejas se separaram durante o processo de fragmentação da antiga Iugoslávia, no início dos anos 1990.

O fato de Zagreb não ter ainda capturado Gotovina, atrasa a entrada da Croácia na União Européia, afirmam representantes do bloco. O governo do país garante que está fazendo todo o possível para capturar e entregar o general ao tribunal de crimes de guerra, em Haia. O franciscano Petar Krasic, do mosteiro de Masna Luka, está na lista negra da UE por apoiar o criminoso.