Valor Econômico, v. 20, n. 4873, 05/11/2019. Especial, p. F4

5G vai intensificar parcerias na indústria

Ana Luiza Mahlmeister


Após o leilão de frequências para a rede 5G, previsto para o segundo semestre de 2020, uma longa jornada de desafios na implantação da infraestrutura, regulação dos serviços e a definição de novos negócios vai começar. Diferente do 3G e 4G, em que as operadoras foram construindo a rede e lançando os serviços aos poucos, nessa nova tecnologia a estratégia deve vir primeiro para estar bem alinhada entre os diversos parceiros que participarão do ecossistema.

“São necessárias regras bem definidas que não desfavoreçam os investimentos das grandes operadoras; que os objetivos de cobertura sejam realistas com as necessidades do país, e que os lotes de espectro sejam favoráveis para a digitalização dos serviços”, afirma Christian Gebara, CEO da Vivo.

A baixa latência, ou maior velocidade de resposta, com dados transmitidos em tempo real habilita de forma inédita a conexão entre as coisas, impulsionando a aplicação massiva da internet das coisas (IoT) e a indústria 4.0. “O 5G será pilar da conexão da sociedade com grandes ganhos na indústria e agronegócio, trazendo também grandes desafios como a cobertura geográfica, implantação maciça de fibra e antenas”, diz Paulo Bernadocki, diretor da Ericsson.

Segundo um estudo da UIT, o mercado de 5G vai representar US$ 1 trilhão globalmente em cinco anos, e os ganhos com os novos serviços devem alcançar US$ 120 bilhões em três anos. Com ênfase em serviços corporativos - como saúde, carros autônomos, IoT - atrai múltiplos fornecedores além das operadoras de redes, que foram as protagonistas nos serviços e infraestruturas de 3G e 4G. Por envolver tantos segmentos de negócios, além das parcerias com empresas de conteúdo como Netflix, Amazon e Spotify, outros atores formarão esse ecossistema como operadoras móveis virtuais, fornecedores de rede sem fio, redes privadas e empresas de segurança.

“O 5G segmenta e desagrega as redes, aprofundando a divisão entre os serviços de valor agregado, dispositivos móveis, clientes e infraestrutura”, afirma Márcia Ogawa, sócia líder da Deloitte. Cada uma dessas camadas pode ser oferecida por diferentes empresas.  “O fatiamento da rede habilita novos modelos de negócio, com diversas empresas prestando serviços fazendo com que as operadoras tradicionais se posicionem estrategicamente”, diz Márcia.

Quanto mais próximas do cliente, mais as empresas “dominam” serviços. As que oferecem a camada de acesso (infraestrutura de rede) terão que estender parcerias e a inteligência de dados (perfis de clientes) “dentro de casa”. “Esse mercado também dá margem para o crescimento das operadoras de serviços virtuais que alugam redes para segmentos específicos, dando espaço para o surgimento de um novo atacado, o agregador de serviços para terceiros”, explica.

Outra característica da nova rede é que ela vai conectar diferentes dispositivos e o celular não será predominante. Carros, eletrodomésticos, sensores industriais, equipamentos de saúde vão representar bilhões de pontos de conexão. E um dos grandes desafios será administrar tudo isso, principalmente no que diz respeito aos requisitos de segurança, afirma Osvaldo Di Campli, diretor de Latam da Nokia. Além de investir na operação, as empresas devem dar conta de gerenciar uma planta de milhões de sensores ou uma rede privada de uma indústria ou hospital. “Não há pessoal capacitado e em número suficiente para endereçar esses problemas”, afirma.

Com a virtualização da rede, a infraestrutura será ainda mais comandada por software e serviços em nuvem. “As empresas com licenças de operação terão que ter grande capacidade de investimento em infraestrutura básica de conectividade, datacenters, processamento em nuvem e na borda da rede para habilitar servidores para a camada de aplicação”, diz Paulo Bernadocki, diretor de soluções e tecnologia de redes da Ericsson.

Outro desafio trazido pelo 5G e as novas tecnologias é a incerteza sobre o futuro do trabalho. “Uma das preocupações mais importantes será a formação e retreinamento da mão de obra que vai trabalhar em unidades extremamente automatizadas”, afirma Campli, da Nokia. A empresa anunciou durante a Futurecom uma parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai-SP) para equipar o laboratório para o ensino de mecatrônica com planta modelo da indústria 4.0 em São Caetano do Sul.

Antes de pensar nesse futuro, ainda faltam redes 3G e 4G chegarem a todas as cidades brasileiras e ampliar a infraestrutura de fibras ópticas, lembra Vitor Menezes, secretário de telecomunicações do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). O Ministério lançou o programa Conecta Brasil para atendimento de áreas sem conexão com um plano de ação até 2022.