Título: O fim da festa para o baixo clero
Autor: Sérgio Prado
Fonte: Jornal do Brasil, 22/09/2005, País, p. A2

Acabou ontem o desastroso reinado de 216 dias de Severino Cavalcanti (PP-PE) na cadeira de presidente da Câmara. Em seu discurso de renúncia, o deputado fechou com chave de ouro sua retórica a partir das três bravatas de ¿voltarei¿. O entardecer a ser esquecido no Parlamento terminou com a cena lamentável da truculência dos seguranças sobre um punhado de estudantes, que ousaram se manifestar nas galerias. Instantes depois, cambaleante, suado, nervoso e abalado Severino saiu pelo comitê de imprensa. Estava calado e sério, acompanhado de familiares e seguranças. Só abriu a boca para renovar. ¿ Volto em breve.

A Era Severino foi marcada pelo escândalo do mensalão, pelo aumento de privilégios aos parlamentares e pela paralisia das votações em meio a uma crise política sem precedentes na Casa.

Agora, novas eleições ocorrerão. Talvez nesta sexta-feira, como quer o governo. Ou em cinco sessões ordinárias como manda o regimento. Desde as primeiras horas de ontem, a mão pesada do Executivo entrou firme para elevar a presidente da Câmara o ex-ministro Aldo Rebelo, eleito deputado pelo nanico PCdoB. Os operadores do Planalto passaram o dia na tentativa de convencer as bancadas que este seria o caminho para um acordo.

A entrada do governo no jogo sucessório, no entanto, é mais um ingrediente no enorme caldeirão do impasse dentro da Câmara. E nada indicava até a noite de ontem que será superado com facilidade. O entendimento, propalado na semana passada, em torno da escolha do novo presidente ficou na retórica. Os partidos estão se digladiando na batalha sucessória, que tem mais de dez candidatos.

¿ Ocorre que estão trabalhando só em cima de nomes e isso é impraticável. Se não houver um diálogo em torno de uma agenda para a Câmara, o consenso não virá ¿ diz o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), vice-líder do governo na Casa.

No meio desta batalha campal, o PP de Severino também resolveu ter o seu candidato. O escolhido é o deputado carioca Francisco Dornelles. Na mesma linha, os peemedebistas resolveram ratificar a candidatura de Michel Temer (SP).

Pelo que se vê, o PT não aprendeu a lição de fevereiro, quando sua divisão interna abriu a porta para o baixo clero e a oposição elegerem Severino. Ao apresentar quatro nomes para a disputa, o partido com a maior bancada (89 deputados) deu argumentos para o campo oposicionista também ter candidato. Os pefelistas repetiram que irão disputar com José Thomaz Nonô (AL) e querem contar com a adesão dos tucanos.

A situação é muito diferente da semana passada, quando até PFL e PSDB estavam dispostos a apoiar o PT. Nem isso, entretanto, sensibilizou os petistas, que se debateram entre José Eduardo Cardoso (SP), Sigmaringa Seixas (DF), Paulo Delgado (MG) e Arlindo Chinaglia (SP).

Só depois de 21 horas, o partido fechou em torno de Chinaglia, o atual líder do governo na Câmara e que enfrenta fortes resistências dentro da base de apoio a Lula. Na oposição, ele também sofre críticas pela suposta falta de diálogo.

Enquanto isso, a ausência de entendimento leva o Congresso a dar novos sinais de que cometerá equívocos sérios. Como as reformas da lei eleitoral e política ficaram sem tempo hábil para serem aprovadas até a data limite de 30 de setembro, recorre-se ao casuísmo.

Por isso, começa a tramitar uma mudança na Constituição, que prorrogaria para dezembro a hipótese de a nova legislação ser aprovada a tempo de valer na eleição do ano que vem. Perdem todos, em especial o Palácio do Planalto, que no início da crise prometeu votar estes projetos, os quais viriam para coibir a corrupção nas campanhas. Ledo engano.

Má notícia para o Planalto, entretanto, vem todo os dias. Ontem, o Ibope divulgou outra pesquisa encomendada Confederação Nacional da Indústria (CNI), que apontou novo tombo na aprovação a Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, 51% dos brasileiros não confiam mais no presidente da República.

O clima de Brasília ficou ainda mais quente na reunião conjunta das CPIs dos Correios e do Mensalão. Os holofotes estavam sobre o banqueiro Daniel Dantas e os parlamentares queriam saber sobre suas possíveis ligações com o caixa 2 de campanhas eleitorais.

Menos mal para Lula. Comedido e gelado, Dantas o livrou de culpa, optando por jogar lama no antecessor, Fernando Henrique Cardoso. No governo petista, segundo o depoimento, ele disse não ter obtido êxito nas tentativas que fez em operações com os fundos de pensão.

Como ocorreu nas galerias da Câmara, na reunião das CPIs quando faltou argumento sobrou agressão física e verbal. Em vários momentos, os parlamentares partiram para o ataque como se estivessem numa briga de rua. Deplorável.