Título: PF comete erros dentro de casa
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 22/09/2005, Rio, p. A13
A Polícia Federal do Rio cometeu, dentro de casa, erros primários que podem comprometer a elucidação do furto de mais de R$ 2 milhões da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE). Agentes federais revelam que a sala-cofre - onde estava a quantia apreendida na Operação Caravelas - não foi preservada para perícia. Até a chegada da primeira equipe de peritos, vários policiais estiveram no local, que também foi limpo por uma faxineira. Segundo especialistas, o grande número de pessoas pode ter apagado algumas evidências, entre elas, impressões digitais. De acordo com o depoimento de um policial, que prefere não ser identificado, a primeira pessoa a chegar no local foi uma faxineira. Ela teria fechado gavetas que foram arrombadas e iniciado a limpeza da sala. O corregedor-regional da Polícia Federal, Vitor Hugo Poubel, confirmou que a faxineira foi a primeira a ver a cena do crime e a encontrar a porta da sala-cofre aberta.
- Ouvimos a moça da limpeza. Ela chegou a dar uma varrida na sala do cofre. Logo depois, avisou que a DRE estava com as portas abertas - disse Poubel.
Segundo um agente, antes da avaliação técnica, a porta de madeira que dá acesso à sala-cofre foi arrombada com chutes.
- A porta de madeira estava trancada com um cadeado, apenas a porta de ferro foi deixada aberta. O dinheiro desapareceu de uma estante de aço. No mesmo espaço, estavam guardados entorpecentes e fuzis que não desapareceram - disse o policial, lembrando que a quantia poderia ser transportada numa mochila de uma alça, usada atravessada no corpo.
Após a constatação do desaparecimento do dinheiro, entre 7h e 8h, o trabalho dos peritos teria começado por volta das 10h.
- O local não foi isolado devidamente, muitos curiosos estiveram lá. Quando os papiloscopistas chegaram de Brasília, tudo já estava contaminado - lamenta o agente.
Segundo o perito e legista Talvane de Moraes, as alterações no local eliminam provas como impressões digitais.
- Uma vez sobreposta, não é mais possível identificar a primeira impressão digital. Com isso, por exemplo, perde-se o valor da comparação das digitais com um grupo de suspeitos - explica Talvane, acrescentando que as pegadas só poderiam ser avaliadas se houvesse umidade nos sapatos usados pelo ladrão.
Além do desaparecimento do dinheiro, uma pistola Glock 9 milímetros sumiu de um armário da DRE. Segundo Poubel, na terça-feira, ele ouviu o chefe do cartório da delegacia, que informou o furto da pistola, registrada em seu nome.
Diretores do Sindicato dos Servidores da Polícia Federal do Rio e delegados lembram que outros crimes na superintendência da instituição ficaram sem explicação. No final da década de 80, segundo Fábio Domingos, diretor do sindicato, um túnel estava sendo cavado na sala-cofre. Um vaso de planta encostado na parede tampava o buraco que, segundo policiais, foi descoberto por acaso.
- Seria preciso que a administração oferecesse à instituição equipamentos de segurança, como câmeras. Fatos como esse já ocorreram no mesmo local - defendeu Domingos, temendo que sejam cometidas injustiças contra os policiais durante as investigações.
Um delegado federal lembrou ainda que, em 1981, 30 mil dólares desapareceram da sede da DRE. Até hoje, o sumiço do dinheiro não foi explicado. O mesmo delegado conta que, em janeiro deste ano, sumiram R$ 80 mil da Polícia Federal de Minas.
- Os policiais envolvidos com os crimes não cometem os mesmos erros que os bandidos comuns porque conhecem as técnicas de investigação e a rotina dos locais - comparou o delegado.
O agente federal lembra que, em janeiro do ano passado, quando a PF de Nova Iguaçu apreendeu 470 mil dólares com uma mulher ligada ao traficante Luis Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, o delegado, dois agentes e um escrivão dormiram na delegacia. No caso do furto dos R$ 2 milhões da DRE, a quantia não foi depositada na agência do Banco do Brasil no Andaraí, como de costume, porque o material foi liberado para fotografias e filmagens até as 17h30. Depois desse horário, o expediente bancário já tinha sido encerrado.