O Globo, n. 32655, 02/01/2023. Economia, p. 23

Isenção de impostos

Geralda Doca
Jussara Soares
Letycia Cardoso


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou ontem uma medida provisória (MP) mantendo a isenção dos impostos federais sobre combustíveis. A MP foi um dos primeiros atos assinados por Lula logo após tomar posse. O texto mantém zerados os impostos federais (PIS/Cofins e Cide) sobre gasolina e etanol por 60 dias. Já a desoneração do diesel foi prorrogada pelo prazo de um ano.

A retirada dos tributos federais foi adotada pelo governo Bolsonaro em meados de 2022 por conta da disparada do preço e de olho na campanha eleitoral. A medida, porém, perdeu a validade no último dia do ano. Assim, para evitar um tarifaço, o governo Lula editou uma MP prorrogando o benefício, mesmo temporariamente. Os valores necessários para isso já estavam previstos no Orçamento —que reservou R$ 52 bilhões para este fim, suficiente para a isenção durante todo o ano.

Na gasolina, por exemplo, a isenção representa um impacto de R$ 0,69 por litro na bomba. A expectativa do governo é que a nova direção da Petrobras, cuja presidência será do senador Jean Paul Prates (PT-RN), mude a política de preços da estatal e reduza os valores. Com isso, seria possível revogar a isenção. O impacto da desoneração temporária não foi informado.

Popularidade do governo

Na semana passada, o novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a pedir para o governo Bolsonaro não prorrogar a desoneração porque queria discutir esse assunto após a posse. Políticos do governo, como a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, defendiam abertamente a necessidade de prorrogar a desoneração por temor de impactos na popularidade do governo que se inicia. O risco de danos políticos também explica a prorrogação da desoneração do diesel por um ano, já que a medida é uma reivindicação principalmente dos caminhoneiros — categoria que deu grande apoio a Bolsonaro.

A prorrogação da desoneração já era esperada pela maioria dos economistas e analistas. Embora tenha impacto na receita da União, a medida consegue adiar a alta na inflação. O mercado financeiro, porém, deve reagir com aversão no curto prazo, devido ao impacto fiscal.

O economista-chefe do Banco Alfa, Luís Otávio Leal, considera positiva a decisão de não voltar a cobrar os tributos logo em janeiro e esperar pela nova política de preços da Petrobras:

— Pode ser que se consiga, lá na frente, balancear o aumento dos combustíveis que viria com a volta da tributação com uma política de preços mais benéfica ao consumidor. Iniciar um mandato com alta na inflação não é bom para o governo.

Nas contas do economista, a prorrogação da isenção de sobre a gasolina e o etanol por 60 dias posterga um impacto de 0,7 ponto percentual de alta que o retorno do tributo federal traria sobre o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para os meses de março e abril, ante janeiro e fevereiro.

Efeito nos juros

Já a desoneração do diesel pelo prazo de um ano terá um efeito indireto positivo sobre os preços de uma gama de produtos, dado que é o principal combustível utilizado para o transporte de mercadorias e alimentos.

Gabriel Meira, da Valor Investimentos, também não se surpreendeu coma notícia da prorrogação da isenção. Além de serem comuns gastos maiores no começo de novas gestões, estrategicamente faz sentido, segundo ele, evitar aumento de inflação nos primeiros 90 dias de governo.

Já o estrategista em renda variável da Senso Corretora, João Frota, acredita que o governo voltará a cobrar impostos sobre combustíveis no segundo trimestre:

— Não vai segurar esse problema que herdou do governo passado. Embora a Bolsa esteja cautelosa, acho que a notícia vai reverberar nas ações.

Bruno Komura, da Ouro Preto Investimentos, avalia que a prorrogação por mais tempo, por mais que ajude a conter a inflação, é uma sinalização ruim pelo lado fiscal:

— Se continuarmos vendo medidas populistas, vamos ver um acréscimo na curva de juros.