O Globo, n. 32655, 02/01/2023. Política, p. 11
Brasília em festa
Bruno Abbud
Patrick Camporez
Aguirre Talento
Com um nível de tensão inédito, a cerimônia de posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que reuniu milhares de pessoas ontem na Esplanada dos Ministérios, mobilizou aproximadamente sete mil policiais. O efetivo foi o dobro do empregado há quatro anos, quando Jair Bolsonaro assumiu o governo. Decisões como se haveria ou não o tradicional desfile em carro aberto, no Rolls-Royce presidencial, só foram tomadas minutos antes de o evento começar.
Desde as 5h, apoiadores de Lula enfrentaram uma fila quilométrica para acessar a Praça dos Três Poderes e conseguir chegar mais próximo do Palácio do Planalto, onde o petista recebeu a faixa presidencial de representantes do povo brasileiro e discursou por volta das 17h. Ao meio-dia, quando a área alcançou 30 mil pessoas, limite máximo estabelecido pelas autoridades de segurança, a Polícia Militar do Distrito Federal bloqueou a entrada.
O esquema de segurança reforçado era notado desde a chegada de apoiadores à Esplanada dos Ministérios, de onde quem não conseguiu entrar na área restrita pôde participar, desde as 11h, das atividades do que foram chamadas de Festival do Futuro, incluindo shows musicais. O ex-ministro José Dirceu, homem-forte do primeiro governo Lula e que ontem não esteve nas agendas oficiais, acompanhou a posse com os militantes do partido e, reconhecido, atendeu a pedidos de selfie.
Atiradores de elite, os chamados snipers, foram posicionados nas coberturas de diversos prédios. E para acessar a Praça dos Poderes, era preciso passar por dois pontos diferentes de revista com detectores de metais. Isqueiros, garrafas de vidro e até um espelho foram barrados pelos policiais.
Quem conseguiu entrar, porém, sofreu com o calor — temperatura chegou aos 28 graus na capital federal. Sem poder sair enquanto a cerimônia não acabasse, algumas pessoas furaram mangueiras da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) para beber água. Jatos d’água foram lançados para refrescar o público.
No total, o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal registrou 160 atendimentos sem gravidade, de pessoas com sintomas de mal-estar, desidratação e pressão alta.
O momento de maior preocupação foi por volta das 14h20m, quando Lula embarcou no Rolls-Royce. Como mostrou a colunista do GLOBO Bela Megale, 40 policiais acompanharam o veículo no seu percurso pela Esplanada dos Ministérios, mais que o dobro de seguranças que fizeram o mesmo trabalho em posses anteriores. Diferentemente da primeira vez em que assumiu a Presidência, em 2003, não houve qualquer furo no protocolo. Naquela ocasião, por duas vezes apoiadores do petista romperam as barreiras de segurança e conseguiram abraçá-lo.
Barreiras foram montadas nas laterais da pista da Esplanada, o que impedia o acesso da população à pista, o que facilitou a análise de risco. Eram 20 policiais ao lado do carro, sendo dez de cada lado, e outros 20 no perímetro mais externo acompanhando o deslocamento. Nos dias anteriores, a equipe de segurança de Lula chegou a desaconselhar o desfile em carro aberto e defendeu o uso de um veículo blindado, mas o petista resistiu. As semanas que precederam aposse foram marcadas por clima de apreensão, especialmente após a Polícia Civil localizar um artefato explosivo um caminhão de combustível próximo ao aeroporto de Brasília. As investigações mostraram se tratar de uma tentativa de apoiadores de Bolsonaro para promover o caos. Ontem, foram registradas apenas quatro ocorrências com um potencial maior de risco. Três suspeitas de bomba, em locais afastados da Esplanada dos Ministérios, foram descartadas. Além disso, um homem tentou ingressar na área da posse portando uma faca grande e fogos de artifício, mas acabou sendo detido.
— Não houve nenhuma ocorrência mais grave. O andamento do evento foi bem tranquilo —afirmou o secretário de Segurança Pública do DF, Júlio Danilo, que fez a estimativa extraoficial do público total de 300 mil pessoas.
Um agente da Polícia Federal usou um dispositivo anti-drone — uma arma que parece ter saído de um filme de ficção científica — para cortar o sinal de aparelhos que invadiram o espaço aéreo da Esplanada. O GLOBO apurou que ao menos quatro drones pelo equipamento da PF. O dispositivo emite uma frequência interrompendo a comunicação entre o drone e quem estava no controle. Assim, o agente passa a controlar o aparelho. Ele pode mantê-lo voando até que abateria acabe ou pousá-lo em um local para que seja destruído ou apreendido. Os agentes podem ainda localizar quem estava usando o drone usando uma função que faz o aparelho voltar ao local de decolagem.
Às 20h, a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal divulgou boletim informando que a Esplanada dos Ministérios ficaria fechada pelo menos até o fim da programação musical, prevista para terminar somente na madrugada de hoje. A reabertura seria reavaliada pelas autoridades após as apresentações.