Valor Econômico, v. 20, n. 4877, 09/11/2019. Brasil, p. A4

Jovens fora da escola são 12%; um terço sai por desinteresse
Ana Conceição


Cerca de 12% dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos não estão na escola e um levantamento feito pela consultoria IDados mostra que a falta de interesse nos estudos é o principal motivo apontado por esses adolescentes, superando até mesmo dificuldades como a falta de dinheiro para as despesas escolares, gravidez precoce, problemas de saúde e ausência de vagas na região onde moram. O quadro mostra que, depois de universalizar o ensino, o país ainda tem um longo caminho para atrair o jovem para a escola, diminuir a evasão e, consequentemente, incluí-los no mercado de trabalho.

Segundo os números obtidos pelo IDados a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua - Educação, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2018, dos 9,75 milhões de jovens brasileiros com idade entre 15 e 17 anos, 1,15 milhão (12%) não estava na escola. Desse total, 33% apontaram o desinteresse como principal motivo para ter desistido dos estudos.

Entre os meninos, esse percentual chega a 39,7%. Entre as meninas é de 25,5%, apenas um pouco acima das 24,7% de adolescentes que apontaram a gravidez ou cuidado com crianças da casa como principal motivo para ter saído da escola.

Enquanto para os meninos o trabalho ou a procura de emprego são o segundo maior motivo para desistir da escola (24%), entre as meninas esse percentual é dois terços menor, chegando a 8,3%, na terceira colocação.

Guilherme Hirata, pesquisador da área de educação do IDados, diz que uma possível explicação é o desalento. “É uma questão de falta de perspectiva. O jovem olha ao redor e vê um contexto muito precário. Falta chegar a esses jovens a informação de que o retorno dado pela escolaridade ainda é alto no país.” Como a pesquisa não tem uma série longa, Hirata diz que não dá para dizer a partir dela se o problema é mais estrutural que conjuntural. Desde a primeira edição da Pnad Contínua Educação, em 2016, os percentuais oscilam pouco. Mas levantamentos anteriores feitos pelo IBGE, com a Pnad anterior à Contínua, e por outros institutos mostram que esse é um problema que resiste inclusive aos ciclos de alta da economia.

A Pnad Contínua Educação 2018 mostra que o acesso à escola tem melhorado em todos os níveis, mas permanecem os problemas do atraso e da evasão escolar. A taxa de escolarização, ou seja, o índice de quem está frequentando a escola em relação à toda população daquela faixa etária, que chega a 99,3% no grupo de 6 a 14 anos, diminui a partir dali: cai para 88,2% entre a população de 15 a 17 anos, recua fortemente para 32,7% entre quem tem de 18 a 24 anos até chegar a 4,6%, entre os que têm 25 anos ou mais.

Estudo da pesquisadora Maitê Rimekká Shirasu, da Universidade Federal do Ceará (UFC), que procura entender o que determina a decisão dos jovens de 15 a 24 anos de deixar de estudar, de trabalhar, ou os dois, ou seja, virar o chamado “nem-nem”, indica que a depender da faixa etária alguns fatores são mais preponderantes que outros. Assim, na fase mais precoce, que vai de 15 a 19 anos, a maternidade de fato continua como um grande impeditivo para as meninas. Para elas, ter filho reduz em 14 pontos percentuais a probabilidade de só estudar, enquanto para as jovens de 20 a 24 anos a redução é de apenas 2,5 pontos.

“Esses indícios sugerem que a maternidade em si não é determinante na redução das chances de as jovens estudarem, mas sim a gravidez precoce”, diz Maitê.

Na faixa de 15 a 19 anos, a educação dos pais é importante tanto para as meninas quanto para os meninos. “Esta é a faixa de idade que tem maior vulnerabilidade social”, diz a pesquisadora. Na Síntese de Indicadores Sociais, divulgada semana passada, o IBGE informa que o abandono escolar é oito vezes maior entre jovens de famílias mais pobres.

Maitê aponta que iniciativas como o Bolsa Família, o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (ProJovem) e o Programa Nacional de Acesso ao

Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) não deram conta de resolver a questão, embora possam ter contribuído para que o problema não se agravasse mais. Além de ter sua efetividade reavaliada, Maitê chama atenção para a necessidade de entender melhor o perfil do jovem que abandona a escola e que também não está no mercado de trabalho. “O que vimos é que é importante diferenciar grupos de jovens por gênero, por faixa etária, para formular políticas públicas mais eficientes.”

Na faixa dos 15 a 19 anos, as políticas teriam que atacar a evasão escolar tornando a escola mais atrativa, ao mesmo tempo em que se tomam medidas para reduzir a gravidez precoce. Acima dos 20 anos, qualificação profissional e políticas de inserção no mercado de trabalho têm de vir juntas com medidas de suporte às jovens mães, como aumento na oferta de creches. “Uma política única não vai resolver o problema de um grupo que é muito heterogêneo”, diz, chamando atenção para o fato de que a ausência dessas políticas contribui para manutenção do ciclo de pobreza e desigualdade.