O Globo, n. 32660, 07/01/2023. Economia, p. 15

Governo terá despesa de R$ 7,7 bi a mais com INSS e reajuste do mínimo

Manoel Ventura


O aumento no número de aposentados do INSS a partir do segundo semestre do ano passado aumentou os gastos com a Previdência e está dificultando a engenharia necessária para o governo cumprir a promessa do presidente Lula de reajustar o salário mínimo acima da inflação (ou seja, com ganho real). A equipe econômica, que ainda está em formação, busca saídas para subir o piso nacional para R$ 1.320, como já foi anunciado pelo governo durante o período da transição. No fim do ano passado, o governo Jair Bolsonaro enviou um ofício à equipe da transição calculando que, por conta do aumento de beneficiários da Previdência e da alta real do salário mínimo, haveria um impacto extra de R$ 7,7 bilhões nas contas públicas. Esse número, segundo o ofício, não estava previsto no Orçamento de 2023. O dado foi revelado pelo jornal “Folha de S.Paulo”. A equipe do atual governo resolveu então refazer as contas. O trabalho ainda não está concluído, mas dados preliminares mostram que de fato o aumento do gasto com a Previdência neste ano, somado ao aumento real que Lula deseja dar, será maior do que o que comporta o Orçamento.

Saída é cortar outro gasto

Dessa forma, seria necessário bloquear ou cortar outras despesas. Embora o teto de gastos tenha sido remendado diversas vezes e deva ser substituído, a regra segue travando de alguma forma as despesas da União. É por conta do teto que o aumento acima do previsto dificulta ao governo subir o salário mínimo de R$ 1.302 (como foi estabelecido por Bolsonaro no fim do ano passado) para R$ 1.320.

O piso nacional serve de referência a mais de 56 milhões de pessoas, das quais 24 milhões são beneficiários do INSS. Com a chamada “PEC da Transição”, que permitiu ampliar os gastos do governo federal em R$ 168 bilhões neste ano, ficou reservado um valor de R$ 6,8 bilhões para o aumento real do mínimo. O valor extra de R$ 7,7 bilhões — que inclui gastos totais dessas novas aposentadorias, não apenas a correção do salário mínimo —é acima desse número.

O novo governo ainda está calculando, porém, se de fato essaéa contaexata. Dentroda atual equipe do Ministério da Fazenda, há uma percepção inicial de que o número está superestimado, o que facilitaria o trabalho do governo. O entendimento é que há algum “conservadorismo” em algumas premissas adotadas pelo governo anterior, como o percentual de crescimento vegetativo da folha. O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, deve conceder uma entrevista à imprensa na segunda-feira para tratar do assunto. O patamar de R$ 1.320 foi fixado na peça pelo relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI), com base em acordo feito com o vicepresidente Geraldo Alckmin durante a tramitação da proposta orçamentária. Para ter validade, esse valor depende da publicação de uma medida provisória no Diário Oficial da União —o que não aconteceu até o momento.

Com isso, segue em vigor, nos primeiros dias deste ano, o salário mínimo de R$ 1.302, que foi proposto pelo governo Bolsonaro em dezembro do ano passado. Entretanto, como o salário e os benefícios de janeiro só são pagos em fevereiro, uma correção neste mês faria os salários serem pagos com valor maior no próximo mês — cumprindo a promessa de Lula.

Em 2022, houve um “represamento” de liberação de aposentadorias, na visão do atual governo. Com isso, diversos benefícios que deveriam ser concedidos acabaram não sendo liberados para a população. Esses benefícios foram liberados no fim do ano, o que impactará as contas públicas a partir deste ano. De agosto a novembro de 2022, a liberação de benefícios foi superior ao registrado no ano anterior, de acordo com dados do Ministério do Trabalho. Os dados de dezembro ainda não estão disponíveis. Após a reunião ministerial ontem, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que houve um represamento das aposentadorias, o que foi revertido ao longo do segundo semestre:

— O que demonstrava que o represamento não era de dificuldade administrativa, era uma estratégia financeira de conter pagamentos, já que, se fossedificuldadeadministrativa, não haveria como liberar um volume gigantesco como foi liberado após eleição.