Valor Econômico, v. 20, n. 4881, 16/11/2019. Política, p. A8

Falta de consenso deve adiar para 2020 votação da PEC da segunda instância

Renan Truffi e Raphael Di Cunto


O Congresso retoma amanhã o debate sobre o momento de execução das penas de prisão por condenação criminal, se após a decisão de segunda instância ou somente depois do trânsito em julgado (fim de todos os recursos), ainda longe do consenso sobre qual o meio jurídico adequado e sem apoio suficiente para aprovação. Com isso, o mais provável é que a votação em plenário não ocorra este ano, o que agrada os contrários à prisão antecipada.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado começa a discutir a proposta de emenda constitucional (PEC) do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) na quarta-feira, mas o texto ainda é foco de resistência de parte dos parlamentares. Na prática, isso cria a possibilidade de o colegiado ter que recorrer a outras propostas sobre o mesmo assunto para conseguir um consenso. A presidente da comissão, senadora Simone Tebet (MDB-MS, tem ao menos seis textos similares no radar e tenta traçar um calendário otimista: colocar o tema em votação até o dia 27 de novembro. Somente depois disso, a questão poderia ser apreciada pelo plenário da Casa em caráter de urgência, o que dependeria de novo entendimento entre os líderes partidários.

Na Câmara, a avaliação é que a CCJ deve aprovar esta semana a PEC que autoriza a prisão após a condenação em segunda instância, mas que não há prazo suficiente para votar em plenário até este ano - o projeto ainda passa por uma comissão especial. “Tem prazo para apresentação de emendas, depois de discussão. O mais crível é votar na comissão e no plenário só em 2020”, diz o deputado Alex Manente (Cidadania-SP), autor da PEC.

O adiamento da votação para 2020 agrada aos contrários à prisão em segunda instância, que acreditam que a temperatura está mais alta agora, em consequência da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de exigir o trânsito em julgado antes da execução da pena e da libertação de condenados como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do ex-ministro José Dirceu e de empresários, mas que tende a baixar com o tempo.

Já os favoráveis as PECs preveem que as eleições municipais, quando parte dos deputados e senadores concorrerá a prefeito ou pelo menos atuará como cabo eleitoral de outros candidatos, pode fazer com que a pressão popular por prisões mais rápidas tenha mais efeito no plenário. Hoje não há, publicamente, apoio suficiente para aprovar as propostas, que, por alterarem a Constituição, exigem o voto de 308 dos 513 deputados e de 49 dos 81 senadores.

A pressão externa já levou, por exemplo, a um racha no Centrão, grupo de partidos que tem apoiado todos os governos no Congresso. Enquanto PP e PL tem atuado contra a PEC, o Republicanos, antigo PRB, declarou apoio à proposta na semana passada e há divisão nos partidos, com deputados tentando forçar uma posição favorável de suas legendas.

Outro motivo para a falta de apoio são divergências sobre qual o texto mais adequado para modificar a Constituição. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou a PEC de Manente, dizendo que alterar o artigo 5º modificará uma cláusula pétrea, o que é proibido, e sugeriu mudanças em outros pontos. Manente começou a coletar assinaturas para propor outra PEC, que seria anexada e discutida junto na comissão especial.

Já no Senado, a resistência explícita será feita pelo PT, partido que teve Lula como um dos beneficiados pelo entendimento do Supremo. Os petistas, no entanto, não são os únicos. Eles têm o apoio velado de outras parlamentares, incluindo aqueles que já tiveram ou enfrentam algum tipo de investigação aberta pela Operação Lava-Jato.

Uma saída para conseguir o apoio desse grupo, formado por senadores tidos como da “velha guarda”, seria uma flexibilização que permitisse a tramitação do processo até a instância do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, só então, o cumprimento da prisão. A ala identificada como “lavajatista” sabe que precisará negociar esse tipo de detalhe, mas, por enquanto, não tem considerado essa como uma mudança aceitável.