Valor Econômico, v. 20, n. 4882, 19/11/2019. Brasil, p. A3

Projeto deve trazer perdas a serviços; indústria vê avanço

Fabio Graner


O desenho de reforma tributária que o governo sinaliza estar prestes a enviar ao Congresso já provoca nova rodada de ataques do setor de serviços, que vê risco forte de corte de empregos e de alta da inflação. Por outro lado, a indústria vê um sinal positivo com a unificação do PIS/Cofins, embora tenha dúvidas se, de fato, haverá redução de carga com medidas como a transformação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em um tributo seletivo que incidirá apenas sobre alguns setores.

O secretário especial da Receita Federal, José Tostes, disse, em entrevista publicada na edição de ontem de “O Estado de S. Paulo”, que o governo enviará a reforma em quatro etapas, sendo a primeira com a unificação do PIS/Cofins ainda neste ano (em novembro), provavelmente com uma única alíquota entre 11% e 12%. Disse ainda que a segunda fase, no início de 2020, prevê transformar o IPI em imposto seletivo sobre setores como combustíveis e cigarros.

O diretor da CBPI Produtividade Institucional e consultor de entidades do setor de serviços, Emerson Casali, demonstrou grande preocupação com o modelo apresentado. Segundo ele, a alíquota de PIS/Cofins pode triplicar a carga tributária de alguns serviços, mesmo que em alguns casos haja aproveitamento de créditos de impostos recolhidos na aquisição de insumos. O setor defende que haja diferentes alíquotas, de forma a aliviar o peso do novo formato, mas a Receita tem resistido à ideia.

Para ele, essa elevação do peso dos tributos federais deve cobrir toda a margem de lucro dos segmentos dos serviços e forçar repasses para os preços finais.

Casali produziu uma análise técnica na qual aponta que a reforma do PIS/Cofins significará fortes “perdas de empregos e aperto nos salários de professores, vigilantes, médicos, enfermeiros, atendentes de call centers, advogados, jornalistas, engenheiros, serventes de obras, porteiros, dentre outros”. Além disso, o estudo aponta que o aumento da carga fiscal afetará Estados e municípios que contratam serviços como construção pesada, saúde e informática.

O economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Marcel Solimeo, disse que ainda é preciso ver os detalhes da proposta, mas a indicação é de forte aumento de carga nos serviços, repercutindo na inflação. Embora em princípio o novo modelo possa trazer algum benefício para a indústria, Solimeo pondera que hoje esse ramo é forte consumidor de serviços e pode acabar sendo prejudicado. “É preciso analisar bem os impactos”, disse.

O advogado Luiz Gustavo Bichara afirma que o primeiro passo da reforma do governo é “dramática” e que, ao fatiar a proposta, não concorda com o que está tramitando no Congresso. “Será um aumento brutal de receita e o resto [da reforma] deve vir muito fatiado. A mensagem que o governo está passando é que não quer reforma tributária”, disse Bichara.

O vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, José Ricardo Roriz Coelho, destaca que o setor industrial é quem paga a maior parte dos impostos e que a ideia de compensar o custo de produção é “excelente”. Ele lembra, contudo, que para o setor de serviços o ideal seria desoneração da folha de pagamentos para mitigar os impactos da reforma.

Segundo ele, a ideia de transformar o IPI em seletivo pode representar uma desoneração para a indústria se a alíquota de PIS/Cofins ficar na casa dos 12%, mas ele pondera que ainda não há definição clara sobre isso. Depende também do que o governo vai fazer com outros impostos, como o IRPJ. “Não tenho dúvida de que a retirada do IPI será compensada de alguma forma”, afirmou Roriz Coelho.