Título: Nova ordem nas praias
Autor: Carolina Benevides e Florença Mazza
Fonte: Jornal do Brasil, 25/09/2005, Rio, p. A23

Em time que está ganhando não se mexe. Mas a orla do Rio, conhecida internacionalmente e cantada em versos, passa por uma monumental repaginação para o verão. Além dos 30 novos quiosques que serão inaugurados nos próximos três meses, o carioca vai encontrar camelôs uniformizados na praia, deques e banheiros na próxima estação. Os banhistas vêem as mudanças com bons olhos, mas temem que a modernização implique na redução dos serviços tradicionais, preços mais altos ou, pior, na perda da identidade carioca. ¿ Temos um patrimônio ímpar no nosso litoral e qualquer mudança tem que ser feita com cuidado ¿ preocupa-se a jogadora de vôlei Isabel, que treina diariamente em frente à Rua Garcia D¿Ávila, em Ipanema, e curte os fins de tarde no Arpoador.

As mudanças na praia poderão ser vistas a partir de sábado, quando serão inaugurados os dois primeiros da nova leva de quiosques, na altura do Copacabana Palace. No lugar das antigas construções, surgem o Bar Luiz e a Cafeteria e Creperia Nescafé. Os próximos, duas filiais da já famosa rede de botequins Belmonte, ficam prontos em um mês.

¿ Hoje temos muito pouco para oferecer em termos de comida, e poucas mesas. Com a reforma, o movimento vai aumentar muito ¿ anima-se José Arteiro, 34 anos, funcionário há nove do quiosque que será transformado em cafeteria e creperia. A estudante e surfista Bianca Weber, 18 anos, concorda: para ela, faltavam restaurantes na orla do Rio. Ela acredita que a reforma na orla há muito era desejada, e vai ser favorável para o turismo.

¿ A praia estava muito abandonada, principalmente em Copacabana.

Vice-presidente da Associação Brasileira de Hoteís no Rio (ABIH-RJ), Ângelo Vivacqua afirma que a principal queixa dos turistas é em relação à desordem na orla. Ele acha que os novos quiosques, uma vez transformados em restaurantes, vão ser limpos, organizados e darão mais segurança ao visitante, que saberá que não vai ser enganado.

¿ Se houver algo errado vai ser mais fácil reclamar. Óbvio que as pessoas pagam mais caro para ter certeza de que o produto é decente ¿ diz.

O presidente da Associação de Operadores de Receptivo Internacional (Bito), Roberto Dultra, reconhece o profissionalismo que a orla passará a ter, mas teme que as mudanças intimidem os cariocas ou os turistas brasileiros

¿ Existe o hábito de sentar só para ler o jornal ou tomar uma água de coco. Isso pode se perder ¿ ressalva Dultra. ¿ Ah, e nada de água de coco engarrafada. O coco é a cara do Rio, um símbolo do nosso clima.

Se por um lado os cariocas aprovam a chegada dos restaurantes e a padronização dos vendedores ambulantes ¿ que vão usar coletes numerados da prefeitura, como adiantou o Jornal do Brasil ¿, os contratos de exclusividade com determinadas marcas desagradam. Vice-presidente da Orla Rio, concessionária que administra os 309 quiosques do Leme ao Recreio, João Marcello Barreto explica que os acordos são uma forma de rever o investimento feito na reforma dos quiosques. A concessionária já fechou com a Nestlé, única fornecedora oficial de água, sorvetes e café.

¿ Mas eles poderão comprar onde quiserem, desde que respeitem a marca e comprovem origem do produto ¿ diz João Marcello Barreto.

¿ Não pode haver restrição de marcas. Os quiosques têm é que oferecer variedade para os clientes ¿ critica Natália Bellard, 25 anos, moradora da Barra da Tijuca e freqüentadora assídua das praias.

¿ Pior será depois do Pan. Duvido muito que seja feita manutenção dos banheiros e quiosques quando os Jogos terminarem.

O prefeito Cesar Maia tranqüiliza: todas as intervenções em andamento na orla não vão descaracterizá-la.

¿ A praia não vai perder sua identidade. Ao contrário: rejuvenesce e floresce. É como se o litoral tivesse conquistado uma super modelo como namorada ¿ compara o prefeito.

Para o diretor de comunicação do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares, Pedro De Lamare, a segurança é a grande conquista para o verão.

Barreto, da Orla Rio, conta que todos os quiosques, assim como os deques, terão câmeras de segurança com imagens monitoradas pela central da concessionária. A idéia é que futuramente a Guarda Municipal e a Polícia Militar também tenham acesso às imagens.

¿ Queremos ainda instalar um botão de pânico nos quiosques ¿ adianta.

Pedro de Lamare acredita que a chegada dos restaurantes e o controle da venda de bebidas vão reduzir as brigas entre gangues.

¿ Além disso, a orla passará a ser ocupada à noite ¿ anima-se o diretor do sindicato.

Barreto informa que uma pesquisa do Ibope encomendada pela Orla Rio constatou que apenas 3% dos cariocas freqüentam os quiosques à noite, principalmente pelo medo de assaltos e pela ausência de infra-estrutura.

¿ Vamos revitalizar uma das áreas mais importantes para turistas e cariocas. A praia é a sala de visitas da nossa cidade e vamos agregar novos serviços, empregos e qualidade de vida ¿ afirma.