O Globo, n. 32628, 06/12/2022. Política, p. 7

Lágri­mas e silên­cio em nova agenda pública do pre­si­dente

Daniel Gullino


O presidente Jair Bolsonaro chorou durante evento militar realizado ontem em Brasília. Bolsonaro participou de uma cerimônia de cumprimento a oficiais das Forças Armadas que foram promovidos. O presidente estava acompanhado da primeira-dama Michelle Bolsonaro, que também se emocionou.

Bolsonaro não discursou durante a cerimônia. O chefe do Executivo apareceu visivelmente emocionado enquanto apertava as mãos dos oficiais, no Clube Naval de Brasília. Em alguns momentos, chegou a enxugar lágrimas. Essa é a terceira solenidade militar a que Bolsonaro comparece em um período de dez dias. Nos dois eventos anteriores, o presidente também optou pelo silêncio. Alguns dos aliados veem sinais de que o presidente ainda está deprimido pela derrota.

O presidente Bolsonaro está há mais de um mês sem fazer declarações públicas, incluindo em suas redes sociais. Após sua derrota na eleição presidencial para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no fim de outubro, o chefe do Executivo tem passado a maior parte do tempo no Palácio da Alvorada, sua residência oficial. Bolsonaro tem ido esporadicamente ao Palácio do Planalto.

Reclusão no Alvorada

Pressionado a se posicionar sobre atos antidemocráticos em frente a quartéis, o presidente tem preferido o silêncio. De acordo com pessoas próximas, Bolsonaro teme frustrar a expectativa dos apoiadores que contestam o resultado das eleições e receia que qualquer declaração piore sua situação com a Justiça.

Apesar de seguir reclamando a aliados que foi prejudicado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no pleito deste ano, Bolsonaro não está disposto a liderar um movimento que tente tumultuar a posse do presidente eleito Lula, como pedem os apoiadores. O presidente também não comentou publicamente o relatório das Forças Armadas sobre o sistema eleitoral — que não apontou indícios de fraudes —, tampouco ação do PL que, sem provas, pediu a invalidação de parte dos votos do segundo turno das eleições presidenciais.

Bolsonaro também completou um mês sem fazer sua tradicional live semanal. A redução brusca no ritmo das postagens e a falta de transmissões ao vivo reduziram o fôlego do presidente nas redes sociais.

"Quatro anos na oposição"

Cacique do Centrão e um dos aliados próximo de Bolsonaro, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, reafirmou ontem a promessa de não se aliar ao futuro governo, afirmando que se manterá na oposição a Lula "por quatro anos".

Em entrevista ao site Metrópoles, ele declarou que não vai comparecer à cerimônia de posse do presidente eleito.

"Vou ficar os quatro anos na oposição. E quero ser um dos coordenadores da volta do Bolsonaro à Presidência. O PP vai apoiá-lo em 2026", disse o ministro.

A postura é vista com desconfiança por políticos em Brasília, apostando que o PP aderirá ao novo governo ao negociar cargos na administração federal. Ciro Nogueira afirmou que não vai proibir parlamentares do PP de apoiarem Lula. O partido elegeu 47 deputados, dos quais pelo menos 15 já mostraram interesse de integrar a base do Planalto no Congresso.