O Estado de São Paulo, n. 46816, 21/12/2021. Economia p.B1

 

Orçamento prevê investimento de R$ 44 bi em 2022, o menor da história

Daniel Weterman

Iander Porcella

 

O patamar de investimentos públicos federais será o menor da história em 2022, conforme relatório do Orçamento apresentado ontem no Congresso. Serão R$ 44 bilhões no ano que vem para o governo federal investir em setores como infraestrutura, escolas, postos de saúde, defesa, pavimentação e em todas as áreas que dependem de recursos da União. A previsão é de que o texto seja votado hoje na Comissão Mista de Orçamento e em plenário.

Nem mesmo a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que postergou parte do pagamento de dívidas judiciais e mexeu com o teto de gastos (que limita as despesas à inflação), foi suficiente para recuperar o patamar de desembolsos dos últimos anos. Essa rubrica chegou a R$ 200 bilhões em 2012, caiu para R$ 63 bilhões em 2016 e travou em R$ 48 bilhões neste ano, considerando valores com correção inflacionária.

A queda nos investimentos públicos ficou mais acentuada após a imposição do teto de gastos, regra aprovada em 2016, ainda no governo de Michel Temer. Em boletim divulgado pelo Tesouro Nacional em outubro passado, o investimento líquido do governo geral (que inclui União, Estados e municípios) ficou negativo em R$ 12,2 bilhões no segundo trimestre – ou seja, o que foi investido não foi suficiente para recompor as perdas com depreciação.

“É uma situação dramática. Não estamos sequer repondo a depreciação dos nossos ativos. Temos de potencializar o investimento privado, mas é difícil que o privado dê conta de tudo”, afirma o diretor de Planejamento e Economia da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Igor Rocha.

Diante desse cenário, o diretor da Abdib defende retirar os investimentos públicos do teto de gastos. “Os investimentos têm sido a variável de ajuste do teto, e não estão cortando programas ineficientes nem mexendo na remuneração de castas privilegiadas, como Judiciário e militares”, disse o diretor da Abdib.

O governo só tem R$ 44 bilhões de investimentos no ano que vem enquanto o volume total de despesas sujeitas ao teto de gastos vai chegar a R$ 1,7 trilhão. No entanto, boa parte do Orçamento é engessada com o pagamento de gastos obrigatórios (Previdência e funcionalismo, principalmente). No cálculo da Instituição Fiscal Independente (IFI), a fatia para as despesas obrigatórias consome 93% do montante.

 

PRIORIDADES. Os ministérios que receberam a maior parte dos investimentos para 2022 foram o da Defesa, estratégico para o governo Bolsonaro, na ordem de R$ 8,8 bilhões, e o do Desenvolvimento Regional, o mais agraciado por verbas do orçamento secreto, revelado pelo Estadão – que levou R$ 8,2 bilhões da fatia.

Só para compra de aeronaves e caças da Força Área Brasileira, por exemplo, está reservado R$ 1,2 bilhão, valor maior do que todo o montante previsto para ser gasto em saneamento básico (R$ 1 bilhão) ou a receita total para investimentos do Ministério da Ciência e Tecnologia (R$ 756 milhões) no próximo ano.

As despesas destinadas à Defesa e ao Desenvolvimento Regional superam até os investimentos em infraestrutura previstos no relatório, de R$ 6,8 bilhões. Além disso, são maiores do que os aportes na Saúde (R$ 4,7 bilhões) e na Educação (R$ 3,7 bilhões). “A infraestrutura física do País está regredindo, e isso tem evidente prejuízo econômico. É impossível esperar uma taxa de crescimento econômico significativa quando a infraestrutura física está retrocedendo”, afirma o consultor de Orçamento do Senado Vinicius Amaral.

Inicialmente, o projeto enviado pelo governo previa R$ 25,7 bilhões em investimentos para o ano que vem. Com as emendas parlamentares, o valor subiu para R$ 44 bilhões, mas não foi suficiente para recuperar o montante destinado nos últimos anos. “Nos últimos anos, as emendas estão exercendo menos um papel de aumentar investimentos e mais de recompor as dotações insuficientes de custeio”, disse Amaral, sobre as verbas dos ministérios para pagamento de gastos não obrigatórios, mas que mantêm o funcionamento da máquina pública. 

 

“É uma situação dramática. Não estamos sequer repondo a depreciação dos ativos. Temos de potencializar o investimento privado, mas é difícil.”

 

Igor Rocha

Diretor da Abdib

 

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Auxílio Brasil torna a Cidadania o ministério com mais recursos

 

O Auxílio Brasil fará o Ministério da Cidadania ter o maior orçamento da Esplanada dos Ministérios em 2022. Serão R$ 173,6 bilhões para a pasta, conforme relatório apresentado ontem pelo deputado Hugo Leal (PSD-RJ). A votação foi adiada para hoje, e parlamentares ainda discutem ajustes na peça orçamentária.

O Auxílio Brasil, com um benefício médio de R$ 415, foi lançado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro em substituição ao Bolsa Família. O programa terá uma verba total de R$ 89,9 bilhões.

No governo, o benefício é tratado como estratégico para Bolsonaro no ano que vem, período em que o chefe do Planalto tentará a reeleição. No Congresso Nacional, a avaliação é de que o auxílio dará um fôlego eleitoral para Bolsonaro, mas com efeito limitado devido à inflação.

O orçamento da pasta, comandada pelo ministro João Roma (Republicanos), ficará maior do que o do Ministério da Saúde (R$ 160,6 bilhões) e o da Educação (R$ 137 bilhões). A comparação desconsidera as verbas vinculadas ao Ministério do Trabalho e Previdência (R$ 889,4 bilhões), que são carimbadas para os benefícios previdenciários (aposentadorias e pensões), uma fatia obrigatória que compromete a maior parte do Orçamento da União.

 

FOLGA NO TETO. Após a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, o relatório do Orçamento no Congresso incorporou uma folga fiscal de R$ 113 bilhões no teto de gastos em 2022. Além do Auxílio Brasil, o parecer reajustou os benefícios previdenciários em R$ 27,5 bilhões, já que são atrelados ao salário mínimo, que, por sua vez, é corrigido pela inflação fechada do ano.

O relatório driblou os "carimbos" impostos pela PEC e garantiu R$ 16,5 bilhões em emendas do orçamento secreto.

Além disso, o relator destinou R$ 1,9 bilhão para o programa do vale-gás. O benefício será concedido a cada dois meses e corresponde a uma parcela de no mínimo 50% da média do preço nacional de referência do botijão de 13 kg do gás de cozinha.