Valor Econômico, v. 20, n. 4885, 22/11/2019. Brasil, p. A6

Estoque de capital estrangeiro cresce US$ 154,4 bi em um ano

Fabio Graner


O estoque de capital estrangeiro no Brasil cresceu US$ 154,4 bilhões em um ano, até setembro. O saldo investido no país ao longo do tempo, chamado tecnicamente de Posição de Investimento Internacional, teve alta substancial, puxado tanto pelas aplicações no setor produtivo como pelo estoque em ações e títulos públicos e privados.

No período, o estoque de Investimento Direto no País (IDP), aqueles voltados para a produção, passou de US$ 721 bilhões para US$ 787 bilhões em um ano. O de investimentos em carteira (ações e títulos públicos e privados) foi de US$ 269,5 bilhões para US$ 335 bilhões, comparando com setembro de 2018.

Os dados são do Banco Central. A autoridade monetária não detalha os fatores de variação, que refletem não só o fluxo de recursos estrangeiros, mas também os valores dos ativos e o efeito cambial (os recursos entram em dólar, mas são convertidos em reais ao entrar no país).

Nos últimos 12 meses, os ingressos de IDP totalizaram US$ 70,3 bilhões, conforme o próprio BC. A variação no estoque, contudo, foi de US$ 66,6 bilhões, o que pode ser explicado pela desvalorização de 3% na taxa de câmbio entre setembro do ano passado e setembro de 2019 ou por alguma perda de valor dos investimentos realizados.

A bolsa de valores brasileira teve nesse período alta superior a 30% e os títulos públicos também tiveram forte valorização com o processo de queda da inflação e dos juros no país, que hoje estão na mínima histórica. Assim, os detentores dos papéis de renda fixa e variável tiveram aumento patrimonial.

O professor de economia da PUC-SP e consultor Antonio Corrêa de Lacerda diz que uma análise dos dados do BC em um horizonte mais longo, a partir de 2016, por exemplo, como consta da nota da autoridade monetária, aponta elementos negativos e positivos sobre a variação na posição de investimento.

Segundo ele, a parte boa é que, de todo o estoque de capital estrangeiro, a maior parte, em torno de 79% ao longo de todos esses anos, é de investimento no qual o risco cambial é do dono do dinheiro. Só em empréstimos e investimentos em títulos e ações brasileiras negociadas em mercados externos, o risco cambial é do país, e não do investidor.

“Essa composição atual é mais saudável, pois o risco cambial é do aplicador. ”

No lado negativo, Lacerda pondera que o forte crescimento do passivo externo brasileiro significa compromissos de remessas de lucros e dividendos crescentes em dólar no longo prazo. Com isso, há um risco de aumento na vulnerabilidade externa do país em um horizonte mais amplo, especialmente pelo perfil do investimento produtivo, muito mais voltado para operações que miram o mercado interno brasileiro, infraestrutura ou em commodities.

O economista defende uma estratégia na qual se busque incentivar o ingresso de capital externo voltado para a produção de bens com maior valor agregado para serem exportados. Com isso, se garantiria geração de receitas em dólares a longo prazo, que contrabalançariam a tendência de alta das remessas de lucros.

Lacerda disse que esse tipo de estímulo pode ser feito sem recursos orçamentários, por meio de articulações do governo com o setor privado, universidade e associações setoriais, o que ocorreu nos Estados Unidos, na Alemanha, no Japão, na Coreia do Sul e na China. “É preciso enfrentar a tendência de aumento na vulnerabilidade externa”, disse.

Enquanto o estoque de investimento externo subiu muito nos últimos 12 meses, o saldo de capital de brasileiros no exterior teve variação pequena, de apenas US$ 6,3 bilhões no mesmo período.