Valor Econômico, v. 20, n. 4805, 01/08/2019. Brasil, p. A6
Precatórios podem anular ganho com reforma da Previdência em 2020
Arícia Martins
A economia no primeiro ano após a aprovação da reforma da Previdência, estimada em cerca de R$ 12 bilhões, deve ser quase totalmente anulada pelo pagamento de precatórios, despesa obrigatória que não estava prevista pelo governo federal para 2020, afirmou ontem o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida.
Em seminário realizado em São Paulo, o secretário disse que tinha uma "notícia ruim": no próximo ano, como primeiro resultado da reforma previdenciária, o crescimento dos gastos com essa rubrica será entre R$ 12 bilhões e R$ 14 bilhões menor. Nesta semana, porém, o Tesouro recebeu da Justiça, como sempre ocorre nesta época do ano, a previsão de pagamentos de precatórios para o ano seguinte, exatamente no mesmo montante.
"Teve um crescimento de R$ 12 bilhões nessa despesa. Aí você pensa, 'pelo amor de Deus, o que é isso?'", brincou, para em seguida explicar que as despesas com precatórios resultam de decisões de casos em julgamento há décadas. "É uma surpresa que teve no Orçamento do ano que vem que não estava no nosso radar. Também não é culpa de ninguém."
No valor previsto para 2020, detalhou ele, estão pagamentos para usinas de açúcar e álcool, devido à política de congelamento de preços implementada no início da década de 90. "Mais da metade do tempo do gestor público é gasto lidando com problemas do passado."
Assim, o primeiro "ganho fiscal" a ser obtido com a reforma, mesmo pequeno, deve ser perdido devido a decisões judiciais, afirmou, ressaltando que a economia com a reforma previdenciária no curto prazo, na verdade, representa uma desaceleração na expansão dos gastos, e não uma retração das despesas.
Com o imprevisto dos precatórios, o Orçamento de 2020, que será enviado em um mês ao Congresso, deve trazer um corte ainda maior nas despesas discricionárias, afirmou Mansueto. "A gente não tinha a mínima ideia dessa despesa obrigatória nova."
Segundo ele, as despesas previdenciárias continuarão a crescer nos primeiros quatro anos após as mudanças nas regras de aposentadoria. Como o ajuste fiscal necessário é de quase R$ 300 bilhões e a carga tributária já elevada, de cerca de 34% do PIB, impede aumentos de impostos, medidas mais duras do lado dos gastos serão necessárias, disse.
Questionado sobre as perspectivas para uma reforma tributária, Mansueto avaliou que há espaço para debate sobre a simplificação de tributos, mas isso não significa que a mudança a ser aprovada será ampla. Transformar as cinco propostas existentes sobre o tema em apenas uma não será fácil e exigirá diálogo e debate para criar um consenso político sobre a melhor proposição, comentou. "Isso é uma pergunta em aberto. Não está tudo resolvido."
Em sua exposição, o secretário também relativizou a tese de que a União centraliza recursos, em detrimento de Estados e municípios. Excluindo-se despesas como seguro-desemprego, abono salarial e Previdência, o Brasil tem uma estrutura descentralizada no molde de outros países, de acordo com dados do Fundo Monetário Internacional e da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mencionou.
Mansueto participou da primeira edição do Prêmio Otimiza, concedido pelo Insper e pelo Portal Meu Município, em parceria com a Fundação Brava, a prefeituras que tenham boas práticas nas finanças públicas. Também estavam presentes o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung, sem partido, e a ex-senadora Ana Amélia (PP).