Valor Econômico, v. 20, n. 4806, 02/08/2019. Política, p. A9

Bolsonaro troca membros de Comissão sobre Desaparecidos

Mariana Muniz 
Isadora Peron



O presidente da República, Jair Bolsonaro, e a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, trocaram quatro dos sete integrantes da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CMDP), ligada à pasta de Damares. As mudanças foram publicadas no "Diário Oficial" de ontem.

O colegiado está no meio da polêmica envolvendo declarações de Bolsonaro sobre o desaparecimento de Fernando Santa Cruz, pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Na semana passada, a Comissão emitiu uma retificação de atestado de óbito de Fernando Santa Cruz, na qual reconheceu que sua morte ocorreu "em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro".

Após pedido do presidente da OAB, Bolsonaro foi interpelado, ontem, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Luís Roberto Barroso deu 15 dias para que ele responda - se quiser - ao pedido de explicações relativo às declarações feitas por ele a respeito do desaparecimento de seu pai.

Além dos quatro integrantes alterados por Bolsonaro ontem, a Comissão deverá ter em breve uma nova mudança em sua composição. Damares pediu ao Ministério Público Federal (MPF) que indique o nome do procurador da República Ailton Benedito, conhecido pelo perfil conservador, para o colegiado.

A indicação da vaga do MPF cabe à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, mas antes o nome deve ser aprovado pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF). O procedimento já está tramitando no Conselho e a votação deve terminar na terça-feira. A avaliação foi interrompida pelo subprocurador da República Nicolao Dino, que quer mais tempo para analisar o caso. Seis conselheiros, no entanto, já anteciparam os votos a favor de Ailton, inclusive Dodge.

Hoje, a vaga do MPF é ocupada pelo procurador Ivan Cláudio Garcia Marx, que atua na Procuradoria da República do Distrito Federal. Ele foi indicado em 2015 pelo então procurador-geral da República Rodrigo Janot. A interlocutores, o procurador afirma que tem interesse em permanecer no cargo.

Entre os integrantes do colegiado substituídos ontem está a presidente da comissão, a procuradora da República Eugênia Gonzaga. Na segunda-feira, ela criticou as afirmações de Bolsonaro de que sabia o que aconteceu com o pai do presidente da OAB. Em seu lugar foi nomeado Marco Vinicius Pereira de Carvalho, filiado ao PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, e assessor de Damares.

Como advogado, Carvalho pediu a impugnação da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência da República em 2018. O recurso foi apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em agosto de 2018. No pedido de impugnação, dirigido à presidente do TSE, ministra Rosa Weber, o advogado afirma que eventual candidatura de Lula, chamada por ele de "verdadeiro monstro natimorto" era "motivo de piada" e causava uma situação "vexatória" à sociedade brasileira. O registro de candidatura do ex-presidente foi negado pelo plenário do TSE em setembro de 2018.

A atuação de Carvalho como advogado também conta com uma solicitação, no STF, para que o Senado não arquivasse um pedido de impeachment do ministro Dias Toffoli, atual presidente da Corte. A denúncia contra Toffoli pela prática de suposto crime de responsabilidade foi protocolada no Senado por ele e pelas hoje deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF) e Caroline de Toni (PSL-SC). As duas não eram parlamentares à época da ação, proposta em julho de 2018. O pedido foi negado pela ministra Rosa Weber, relatora do caso.

Nas eleições de 2018, o novo presidente da Comissão foi candidato a suplente de senador de Lucas Esmeraldino, que concorreu pelo PSL de Santa Catarina - mas não foi eleito.

Os outros novos integrantes do colegiado nomeados por Bolsonaro são o deputado federal do Filipe Barros (PSL-PR), o coronel reformado do Exército Weslei Antônio Maretti e o oficial do Exército Vital Lima.

Como deputado, Barros atua na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. E, segundo o presidente da comissão, deputado Hélder Salomão (PR-ES), a indicação feita por Bolsonaro não foi discutida no colegiado - o que configuraria, segundo ele, uma usurpação de competência por parte do presidente da República.

Nas redes sociais, Maretti, o coronel reformado, mostra-se favorável à ditadura de 1964 e pede a "exoneração de Dias Toffoli" por razões como "constrangimento de toda a sociedade". Em seu perfil no Facebook, fez postagens entusiasmadas sobre o coronel Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-CODI, um dos órgãos atuantes na repressão política.