Título: Uma vitória por 15 votos
Autor: Sérgio Prado
Fonte: Jornal do Brasil, 29/09/2005, País, p. A2

Mesmo com seu charme ofuscado pela crise política, a caneta do Executivo conseguiu a duras penas ontem retomar o controle da Câmara, ao eleger um aliado do Palácio do Planalto como presidente. A disputa foi palmo a palmo entre a base do governo e a oposição. Após a apuração emocionante no segundo turno, pouco depois das 21 horas, o painel apontou a vitória de Aldo Rebelo (PCdoB) contra José Thomaz Nonô (PFL-AL) por 258 a 243 votos. ¿ Não presidirei facções, não serei líder de bancada, de governo nem de oposição ¿ discursou Aldo Rebelo, na tentativa de mostrar independência. O governo fez tudo para mostrar seu poder de convencimento e abriu o cofre nas últimas horas com a liberação de emendas de parlamentares. Mais de R$ 1 bilhão foram destinados a obras e projetos de interesse de integrantes de partidos aliados de Luiz Inácio Lula da Silva. Mas o desenrolar da disputa mostrou que só isso não basta. O governo daqui para a frente ficará refém de negociações caso a caso. Afinal, com a pouco diferença de votos, mostrou que sua maioria na Casa é diminuta e precisará ser montada a cada votação.

Além do próprio Lula, vários ministros participaram de um duro mutirão para levantar Aldo Rebelo. Inclusive Walfrido Mares Guia e Márcio Fortes, representantes respectivamente do PTB e do PP, foram na tarde de ontem à Câmara reforçar a busca por apoio. O concorrente oficial contou ainda com um auxílio do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ele foi o principal responsável por detonar a candidatura do deputado Michel Temer (PMDB-SP) que bateu duro no comandante do Senado.

Mas só abocanhar parte do PMDB não seria suficiente, para a vitória. Por isso, o PT voltou a negociar no balcão com PP, PL e PTB, os partidos envolvidos no escândalo do mensalão, denunciado por Roberto Jefferson. Este fato, jogou a Câmara numa crise profunda, que afetou em cheio a gestão de Lula.

Pois a missão de ajudar a contornar a crise é o mais urgente desafio de Aldo, que encontrará ainda em seu gabinete a demanda de reconstruir a imagem da Câmara. O primeiro passo será tocar o processo de cassação de 16 deputados, acusados como beneficiários do esquema de corrupção.

Está também sob a batuta do novo presidente da Casa a tarefa de desobstruir a pauta de votações, travada pelo desentendimento entre as bancadas. Várias propostas são prioritárias, como as reformas política e eleitoral.

Além disso, um presidente da Câmara é peça-chave na construção de uma candidatura à Presidência da República. Como tudo leva a crer que Lula tentará outro mandato, ter um aliado nesta cadeira é vital. As cartas estão na mesa.