O Estado de São Paulo, n. 46824, 29/12/2021. Política p.A10

 

Criticado, Bolsonaro diz que espera não ter de abreviar folga na praia

 

Eduardo Gayer

 

O presidente Jair Bolsonaro passou a enfrentar mais desgaste político neste fim de ano ao manter a folga em São Francisco do Sul, litoral de Santa Catarina, enquanto milhares de pessoas sofrem as consequências das fortes chuvas que assolam a Bahia. O dano à sua imagem ficou caracterizado nas críticas públicas que recebeu e na hashtag "Bolsonarovagabundo" – que chegou ao primeiro lugar entre os assuntos mais comentados do Twitter.

Diante da repercussão negativa na rede social, território de grande atenção do presidente e seu núcleo mais próximo, Bolsonaro disse que esperava não ter de deixar a região praiana. "Espero que eu não tenha que retornar antes", afirmou Bolsonaro em conversa com apoiadores.

O chefe do Executivo embarcou anteontem para São Francisco do Sul com a primeira-dama, Michelle, e a filha Laura, de 11 anos, e só planeja retornar à capital federal no dia 3 de janeiro. É o segundo período de folga de Bolsonaro neste mês. Ontem, o presidente aproveitou o d ia ensolarado para um passeio de moto aquática com Laura. Internautas publicaram as fotos de Bolsonaro no veículo ao lado de imagens de áreas inundadas.

Entre os dias 17 e 23, o presidente esteve no Guarujá, litoral de São Paulo, onde também passeou de moto aquática e de barco. Na ocasião, foi filmado dançando funk em uma lancha.

 

CHUVAS. Desde a quinta-feira da semana passada, a Bahia vive uma nova rodada de chuva intensas que já deixaram ao menos 20 pessoas mortas, 31.405 desabrigadas, 31.391 desalojadas e 358 feridos. De acordo com a Defesa Civil do Estado, o número de municípios atingidos chegou a 116. As primeiras enchentes, no entanto, foram registradas entre novembro e dezembro. Bolsonaro chegou a sobrevoar regiões afetadas em 12 de dezembro, mas não planeja repetir o gesto.

Parlamentares já tradicionalmente críticos ao governo cobraram do chefe do Executivo a interrupção de seu período de descanso. "Enquanto nosso povo padece com fome, desemprego, alta de preços, epidemia, e, como na Bahia, com desastres naturais, Bolsonaro tirou férias! Sim! Omisso a tudo isso, achou merecer folga, como uma grande piada com o povo brasileiro. VAI TRABALHAR, Bolsonaro!", publicou no Twitter o senador Randolfe Rodrigues (Rede-RR).

"Não entendo as críticas ao Bolsonaro por ele estar de férias. Ele está fazendo a mesma coisa que faz quando não está de férias: NADA", ironizou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP)

Bolsonaristas, por sua vez, agiram para tentar minimizar o desgaste, alegando que embora o presidente não acompanhasse fisicamente a emergência social no Nordeste, ministros estavam nas regiões afetadas, como João Roma (Cidadania), pré-candidato ao governo da Bahia, e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional).

Durante a guerra de versões nas redes sociais, o assessor especial da Presidência Tercio Arnaud Tomaz compartilhou nas redes sociais notícias de 2010, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também teria enviado ministros para as enchentes de Angra dos Reis (RJ), em vez de comparecer pessoalmente. Tércio integra o chamado "gabinete do ódio", ala de assessores palacianos responsáveis por alimentar a tropa bolsonarista nas redes com conteúdo favorável ao governo. O grupo é coordenador pelo vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos), filho "02" do presidente.

 

VERBA. Em defesa de Bolsonaro, os governistas também destacam as medidas já anunciadas pelo Executivo na tentativa de conter os efeitos das enchentes. O presidente editou ontem medida provisória que destina R$ 200 milhões para recuperação de rodovias. Os recursos, porém, não vão apenas para a Bahia, mas também para outros quatro Estados: Amazonas, Minas Gerais, Pará e São Paulo.

Dos R$ 200 milhões, R$ 80 milhões serão destinados aos municípios baianos. "Não dão para recuperar as (estradas) da Bahia", disse o governador Rui Costa (PT). Rogério Marinho pediu mais tempo para que o governo possa dimensionar a quantidade de recursos que será necessária. 

 

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Após corte de verbas, Lira diz que vai discutir fundo para catástrofes

 

Após um corte nas verbas para a Defesa Civil no Orçamento de 2022, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse ontem que a Casa vai discutir um fundo específico para casos de catástrofes. "Para prevenção permanente, a partir de fevereiro, com tranquilidade", disse, após reunião de emergência com parlamentares da Bahia.

O fundo citado por Lira já existe, mas não tem sido abastecido com recursos. Ao falar sobre a situação da Bahia, Lira admitiu o corte e apontou o teto de gastos como o responsável. "Muitas vezes um fundo específico consta no Orçamento e é a primeira coisa que sai porque nunca a gente tem a realidade de quando vai acontecer a catástrofe", afirmou. / DANIEL WETERMAN

 

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Siglas de esquerda querem dobrar bancada com federações

Eleição

 

André Shalders

Julia Affonso

 

 

Nas últimas semanas, partidos de esquerda passaram a discutir a possibilidade de criar federações partidárias a partir de 2022. Para legendas menores, como a Rede e o PCDOB, o objetivo é escapar das punições a quem não cumprir a chamada cláusula de barreira nas próximas eleições. Já partidos com mais representação no Congresso, como PT e PSB, veem uma possibilidade de obter mais cadeiras no Legislativo.

A disputa de 2022 será a primeira eleição geral sem coligações para os cargos de deputado estadual e federal. As federações partidárias, criadas pelo Congresso em setembro deste anos, no entanto, serão uma das novidades das disputas. Diferentemente das coligações, as federações criam uma "fusão" temporária entre as siglas envolvidas, que precisa durar pelo menos quatro anos.

Hoje, os partidos de esquerda somam 131 deputados federais, considerando as bancadas do PT (53), do PSB (31), PCDOB (8), PSOL (9), PDT (25), PV (4) e Rede (1). Por enquanto, a discussão mais avançada é a que trata da criação de um bloco com PT, PSB, PC do B e PV. Uma outra possibilidade é a união de três siglas – PSOL, Rede e PCDOB. Dirigentes dessas legendas consideram que é possível alcançar o número de 200 deputados.

 

SOBRAS. As projeções feitas pelos partidos consideram, por um lado, que o conjunto das agremiações passaria a ocupar um número maior das chamadas "sobras" partidárias, que são as cadeiras restantes no Legislativo depois da divisão feita por meio do quociente eleitoral. Por outro, há a ideia de que atuando em conjunto os partidos poderão concentrar recursos nos candidatos com mais chance da coligação; e se beneficiar dos "puxadores de votos" em cada Estado. Alguns políticos consideram também que há um "efeito psicológico" em reunir todas as siglas em uma frente ampla contra o presidente Jair Bolsonaro (PL).

Para valer nas eleições de 2022, as federações precisam ser formalizadas na Justiça Eleitoral até seis meses antes da disputa, isto é, até 2 de abril do ano que vem.