Valor Econômico, v.20, n. 4928, 28/01/2020. Política p.A6

 

“Claro que gostaria”, afirma Moro sobre eventual nomeação ao Supremo

 

André Guilherme Vieira

Isadora Peron

O ministro da Justiça, Sergio Moro, deixou claro que está interessado em ser nomeado ao Supremo Tribunal Federal (STF) ao considerar a hipótese uma “perspectiva interessante” e sinalizou que não tomará a iniciativa de deixar o governo federal. “Vou dizer que não gostaria? Claro que gostaria.”

Ele comparou as discussões a respeito de sua permanência no governo, fomentadas pelo recente desentendimento com o presidente Jair Bolsonaro, com o “Dia do Fico” - episódio da história brasileira em que o imperador Dom Pedro 1º recusou-se a deixar o Brasil para retornar a Portugal, em 9 de janeiro de 1822. “Vai ser o segundo Dia do Fico no Brasil, né?”, afirmou ontem, durante entrevista de uma hora e meia concedida ao programa humorístico ‘Pânico’ da Rádio Jovem Pan FM, em São Paulo.

À vontade com piadas sobre sua relação com o presidente, e em tom de brincadeira, lamentou não ser mais possível cercear a imprensa. “Agora tem a lei de abuso de autoridade, não pode mais prender jornalista, né?”, disse Moro, ao reagir a uma imitação de sua voz feita pelo humorista André Marinho.

Ao comentar sobre uma eventual candidatura em 2022, Moro descartou a hipótese. “Isso eu já falei um milhão de vezes, a toda hora me perguntam isso. Vou ter de tatuar na testa”, brincou. Quando um dos entrevistadores insistiu no tema eleitoral, dizendo que parte da população pede que Moro se candidate à Presidência, o ex-juiz titular da Lava-Jato no Paraná aproveitou para frisar que apoiará a candidatura de Bolsonaro à reeleição.

“Em 2022 o presidente já apontou no sentido de que ele pretende a reeleição, é uma decisão dele, unicamente. E, claro, eu sou ministro do governo, eu vou apoiar o presidente Jair Bolsonaro. É até uma questão de lealdade. O presidente está dando apoio às políticas da Pasta”, disse. Moro afirmou que não está disposto a disputar eleições. “Tem vários partidos bons, mas eu não tenho essa perspectiva de ir para a política partidária, ou concorrer a eleições, não está no meu perfil.”

Perguntado se gosta dos apoiadores de Bolsonaro conhecidos como ‘Bolsominions”, o ministro respondeu de pronto. “Os apoiadores do presidente Bolsonaro são meus apoiadores e vice-versa”. Este mês, a relação de Bolsonaro com o ministro ficou estremecida depois de o presidente mencionar a hipótese de dividir a pasta da Justiça, retirando de Moro o comando sobre a Segurança Pública. O presidente alegou que se tratou de uma demanda dos secretários estaduais, mas poucos dias depois recuou da proposta, em entrevista coletiva ao chegar na Índia, onde esteve em visita oficial.

Moro disse que os desentendimentos estão superados e citou a elevação da verba do ministério e o incremento de pessoal para as Polícias Federal e Rodoviária Federal como exemplos de que o presidente estaria apoiando a política de segurança do ministério.

Sobre crítica feita pelo ex-deputado e aliado político de Bolsonaro, Alberto Fraga, que afirmou ao ‘Correio Braziliense’ que o ministro não entende de Segurança Pública e o comparou a um “menino buchudo” que reclama quando se fala em divisão do ministério da Justiça, Moro se esquivou de comentar. Disse que os números da segurança “falam por si”.

“Claro que, e eu sempre falei isso, é um mérito compartilhado com as forças de segurança estaduais e municipais, onde elas existem. Mas, por exemplo, 22% a menos de assassinatos em 2019 é algo que nunca houve... eu não gosto de usar essa expressão, mas nunca aconteceu antes no país e é uma queda muito expressiva.”

Na opinião de Moro, há “muita gente querendo enfraquecer o governo, me tirando do governo e gerando essas intrigas eleitorais.”

Apoiadores do ex-juiz no Congresso veem positivamente eventual indicação dele à vaga de Celso de Mello, que se aposentará do STF compulsoriamente ao completar 75 anos, em novembro.

O presidente da bancada da bala, deputado Capitão Augusto (PL-SP), diz que a maioria dos integrantes da Frente Parlamentar da Segurança Pública simpatiza com a ideia de Moro ser indicado. “Vamos fazer uma campanha bonita”, afirmou. Outro aliado, o deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA), afirma que, apesar da resistência de alguns senadores, o nome do ex-juiz da Lava-Jato deve receber o aval do Senado caso ocorra a indicação. Segundo ele, desde que virou ministro, Moro “ficou mais político” e tem conseguido manter boa interlocução com o Legislativo.

A presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senadora Simone Tebet (MDB-MS), também acredita na aprovação do nome de Moro na Casa. Segundo ela, ao menos na CCJ a indicação não teria problemas para ser avalizada. Para um senador, porém, o Centrão, liderado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deve pressionar Bolsonaro para barrar a nomeação, pondo em xeque até mesmo o avanço de votações importantes, como a reforma tributária.