Valor Econômico, v. 20, n. 4810, 08/08/2019. Brasil, p. A2
 

Financiadores do Fundo Amazônia ainda aguardam proposta de reformulação
Daniela Chiaretti 
Rafael Bitencourt



 

Mais de um mês depois de encontrar os embaixadores da Noruega Nils Gunneng e da Alemanha Georg Witschel, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não enviou ainda aos principais doadores do Fundo Amazônia a proposta de reformulação do mecanismo.

Há a promessa de Salles de encaminhar, por escrito, as mudanças que pretende fazer no funcionamento do fundo. Só então os doadores poderão discutir as alterações com Oslo e Berlim.

Salles, contudo, adiantou ontem, em audiência no Senado, como o governo entende que deveria ser a nova arquitetura do fundo.

Até recentemente, o Fundo Amazônia tinha dois comitês. Um deles, o Comitê Orientador (Cofa), era responsável por determinar as diretrizes e acompanhar os resultados dos projetos financiados. O outro, o Comitê Técnico (CTFA), era formado por especialistas nomeados pelo Ministério do Meio Ambiente.

O Comitê Técnico costumava se reunir em outubro ou novembro e produzir um relatório com base no dado oficial de desmatamento anual produzido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe.

Tecnicamente ambos os comitês foram extintos em 28 de junho, com o decreto assinado pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que extinguiu colegiados em todos os ministérios.

Na audiência no Senado, Salles defendeu que o Cofa passe a ter caráter consultivo e seja criada uma "instância intermediária" entre o comitê e o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), que administra o fundo.

O novo colegiado teria o status de comitê-executivo, com poderes de escolher projetos, monitorar a aplicação dos recursos e garantir o "alinhamento" entre as diferentes iniciativas.

Salles defendeu, ainda, que recursos do Fundo Amazônia sejam destinados para o monitoramento da floresta com tecnologia de ponta. O ministro mencionou iniciativa que está sendo estudada com o Ibama, de um novo sistema de monitoramento capaz de acompanhar áreas de floresta com maior precisão.

Ele voltou a contestar o aumento de 278% na área com alertas de desmatamento na Amazônia registrado pelo sistema Deter, do Inpe, em julho, em relação ao mesmo mês do ano passado. Segundo Salles, essa comparação não reflete a realidade como deveria.

"Como já disse, aliás como consta no site, o sistema Deter [Detecção do Desmatamento em Tempo Real] não é o instrumento mais adequado para monitorar o volume de desmatamento mês a mês", disse o ministro.

Ricardo Salles lembrou aos senadores que o fundo conta hoje com R$ 3,4 bilhões disponíveis, sendo que R$ 1,8 bilhão já foi empenhado e R$ 1,6 bilhão ainda não tem destinação definida.

A iniciativa de mudança no funcionamento e governança do Fundo Amazônia partiu do ministro Salles. Em março, ordenou um pente-fino nos contratos e projetos do fundo administrado pelo BNDES. Salles suspeitava de irregularidades e falta de eficiência nos recursos do fundo. Ele nunca enviou aos doadores o relatório com as irregularidades.

O impasse paralisou a aprovação de projetos neste ano, o que representa ao menos R$ 350 milhões para áreas como aumento de produtividade e renda de agricultores e monitoramento do desmate.

Para Salles, gestões anteriores assumiram o que ele classifica como "política de avestruz", em que se "coloca a cabeça no buraco e se finge que nada está acontecendo". Segundo ele, esta é uma das razões pelas quais a aplicação de recursos do fundo não mostra resultados efetivos de combate ao desmate.