Valor Econômico, v. 20, n. 4888, 27/11/2019. Empresas, p. B4

Brasil pede e OMC suspende disputa sobre jato regional

 Assis Moreira 



O Brasil pediu a suspensão por cinco meses da disputa que abriu contra o Canadá envolvendo jatos regionais, na Organização Mundial do Comércio (OMC), alegando que a Embraer está concentrada na sua joint venture com o construtor americano Boeing.

Apesar de o Canadá ter recusado suspender o conflito diante dos panelistas da OMC, o painel atendeu a demanda brasileira e só vai retomar o caso depois de 15 de abril do próximo ano. Esse caso tem potencial para alterar as condições de concorrência no mercado de jatos regionais.

O Valor apurou que o governo brasileiro explicou à OMC que a Embraer está no processo de criar uma joint venture com a Boeing. A companhia americana vai controlar a futura empresa batizada de Boeing Brasil.

Ele observou que essa é uma das maiores e mais complexas transações ocorridas no Brasil e a expectativa na Embraer é de que a operação se resolva a partir do fim de março de 2020.

Além disso, a Embraer reúne suas forças para obter o sinal verde das autoridades regulatórias em diferentes mercados em torno do mundo, o que exige uma montanha de informações que precisa ser fornecida.

Em outubro, a Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia, decidiu aprofundar as investigações sobre o acordo entre Embraer e Boeing no segmento de aviação comercial. A previsão agora é de Bruxelas anunciar uma decisão final sobre a transação até 20 de fevereiro de 2020.

Com isso, o potencial fechamento do negócio, que inicialmente estava previsto para o fim de 2019, necessariamente foi postergado para o ano que vem.

As autoridades europeias, depois de analises da chamada Fase I, manifestaram preocupação com a potencial saída da Embraer, terceira maior concorrente no ranking global de jatos comerciais, de um mercado que já é altamente concentrado a partir da consolidação do negócio, que prevê a venda de 80% dessa divisão da companhia brasileira para a Boeing.

Ao mesmo tempo, na OMC, o Brasil precisa apresentar uma segunda petição diante dos panelistas para sustentar a queixa contra o Canadá. Isso exige apresentação de muitos dados. É preciso um intercambio muito ágil com a Embraer, que visivelmente não conseguiria fornecer todas as informações, inclusive sensíveis, quando a joint venture ainda está para ser implementada.

Quando a canadense Bombardier se juntou à fabricante europeia Airbus, o Canadá fez pedido de ampliação dos prazos na disputa, o que na prática foi a mesma coisa do que o Brasil pediu agora.

O Brasil acionou o mecanismo de disputa da OMC contra o Canadá no começo de 2017, quando ainda não havia negociação conhecida nem entre a Embraer e a Boeing nem entre Bombardier com Airbus.

O governo brasileiro alegou que subsídios fornecidos pelo governo canadense à Bombardier causavam danos à Embraer. A companhia brasileira manifestava preocupações com a concorrência que estimava ser turbinada por bilhões de dólares de ajuda pública obtida por seu concorrente para o desenvolvimento do modelo C-Serie.

Segundo levantamento brasileiro, o governo canadense forneceu US$ 2,5 bilhões de subsídios para a Bombardier no período denunciado. Isso permitiu à companhia oferecer abatimento de preço sem igual e abocanhar encomendas importantes em disputa com a Embraer.

O exame do conflito atrasou bastante na OMC. E passou depois a ser acompanhado de perto pelos Estados Unidos e União Europeia. Sem surpresa, diante do peso da Airbus na Bombardier e da Boeing na Embraer.

Não há surpresa na demora nas disputas envolvendo jatos, pela complexidade dos casos. Basta ver que o conflito entre Boeing e Airbus já dura 15 anos na OMC.