Valor Econômico, v. 20, n. 4813, 13/08/2019. Política, p. A14

Lava-Jato só existe graças ao STF, diz Toffoli

Cristiane Agostine


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro José Antônio Dias Toffoli, afirmou ontem que a Lava-Jato só existe graças à Suprema Corte. Toffoli criticou a atuação do Ministério Público e acusou a força-tarefa da operação de tentar se apropriar das instituições.

"A Lava-Jato só existe graças ao Supremo Tribunal Federal. Se não fosse o Supremo, acabaria isso. O que não se pode permitir é que se apropriem das instituições", disse Toffoli, ao participar de almoço-debate promovido pelo Lide (Grupo de Líderes Empresariais), em um hotel na capital paulista. "A Operação Lava-Jato é fruto da institucionalidade, não é a institucionalidade. É resultado das instituições, não manda nas instituições", afirmou, por duas vezes.

A uma plateia de empresários e advogados, o magistrado criticou indiretamente o protagonismo buscado pela força-tarefa da Lava-Jato e disse que o país "não se faz de heróis, mas sim de projetos". Toffoli atacou a tentativa do Ministério Público de fazer uma fundação privada para gerir até R$ 2,5 bilhões, em negociação com a Petrobras na operação, e elogiou a ação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para impedir o acordo. Em março, Moraes concedeu liminar para suspender a fundação, a pedido da PGR.

Durante a palestra, Toffoli foi estimulado pelo jurista Ives Gandra Martins a fazer a defesa da Lava-Jato, na primeira pergunta do debate. Martins pediu para que o ministro fizesse um "esclarecimento" sobre a operação e abriu espaço para o presidente do STF criticar a força-tarefa.

Toffoli contrariou interesses da Lava-Jato ao longo das investigações e foi alvo de comentários de integrantes da operação, segundo mensagens obtidas pelo "The Intercept Brasil" e publicadas pelo site e pelo jornal "Folha de S. Paulo". O coordenador da Lava-Jato, procurador Deltan Dallagnol, incentivou colegas em Brasília e Curitiba a investigar o ministro em 2016, numa época em que o atual presidente do STF começava a ser visto pela Lava-Jato como um adversário. Ministros do STF não podem ser investigados por procuradores da primeira instância. A força-tarefa disse que é seu dever encaminhar à PGR informações sobre autoridades com direito a foro especial e que isso tem sido feito legalmente.

Na rodada de perguntas no evento de ontem, Toffoli defendeu sua decisão de suspender as investigações que tenham como base dados sigilosos compartilhados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e pela Receita Federal, sem autorização prévia da Justiça. A medida foi tomada a pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), alvo de um inquérito, e beneficiou diretamente o filho do presidente Jair Bolsonaro. O presidente do STF disse que tomou a medida para "proteger a sociedade". "O poder tende a ser absoluto e o poder absoluto corrompe. Não podemos ter instituições que estão com poder absoluto", disse, em mais uma crítica indireta à força-tarefa da Lava-Jato.

O magistrado fez diversos elogios ao governo Bolsonaro e afirmou que é "correta" a decisão de tirar o Coaf do controle do ministro Sergio Moro (Justiça), ex-juiz da Lava-Jato, e transferi-lo ao Banco Central.

Mais cedo, em evento para agentes financeiros promovido pelo Santander, Toffoli defendeu a revogação do artigo da 192 da Constituição, que estabelece a necessidade de leis complementares para regular a participação do capital internacional no mercado financeiro do país. "Ou destravamos o país, ou seremos atropelados pelo povo que vai às ruas, como foi [na manifestações] de 2013".