Valor Econômico, v. 20, n. 4814, 14/08/2019. Brasil, p. A6

Salles promete minuta de 'novo' Fundo Amazônia em uma semana

 Daniela Chiaretti 
 Gabriel Vasconcelos


 

Até a próxima semana, o Ministério do Meio Ambiente enviará às embaixadas da Noruega e da Alemanha a minuta do decreto de "recriação do Fundo Amazônia", disse ao Valor o ministro Ricardo Salles.

A promessa de continuidade do Fundo Amazônia acontece em meio a tensões com os doadores, principalmente com a Alemanha, maior parceiro socioambiental do Brasil. O embate não tem desfecho previsível.

Na semana passada, depois da divulgação da forte tendência de aumento do desmatamento, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, anunciou a suspensão de € 35 milhões destinados a uma nova chamada de projetos para proteção do clima. Ela justificou a decisão dizendo que a política do governo na Amazônia coloca em dúvida se o país ainda busca reduzir o desmatamento.

O anúncio gerou reação de Jair Bolsonaro para quem o país não precisaria destes recursos. O presidente disse que a Alemanha "vai deixar de comprar à prestação a Amazônia". Svenja Schulze subiu o tom na tréplica afirmando que a decisão parece ter sido acertada e pedindo reavaliação dos repasses alemães para o Fundo Amazônia, que pertencem a outra pasta, a da cooperação internacional sob gestão do ministro Gerd Müller.

O embate e a alta no desmatamento têm forte ressonância na imprensa alemã. Dificultam também a aprovação do acordo de livre-comércio Mercosul-União Europeia no Parlamento alemão.

Ontem Salles recebeu uma ligação do ministério alemão de cooperação. "Eles reiteraram a intenção de continuar com o Fundo Amazônia", disse. É desta pasta que vêm os recursos alemães para o fundo (a Noruega é responsável por 93,8% dos valores, a Alemanha aportou 5,7% do R$ 3,4 bilhões) e o grande volume da cooperação internacional com o Brasil.

Para Salles, a proposta de nova governança do fundo "em linhas gerais não traz grandes mudanças". Há, contudo, uma nova instância, um comitê gestor, com oito cadeiras e reuniões mensais. Suas atribuições serão apresentar os novos projetos, fazer um relatório de execução do que estiver em andamento e os indicadores do que tiver sido concluído, diz Salles.

O ministro não adianta como será feita a distribuição dos oito lugares, ponto crítico da proposta. Na gestão atual do fundo, há apenas dois comitês, o orientador (conhecido pela sigla Cofa) e o técnico. O Cofa tem por atribuição discutir diretrizes e critérios dos projetos do fundo e tem três instâncias ocupadas por membros do governo federal, dos governos dos nove Estados da Amazônia Legal e da sociedade civil. Cada uma das instâncias tem o mesmo peso nas votações dos projetos.

O novo comitê estaria subordinado ao Cofa, que continua com a mesma sigla, mas deixa de ser Comitê Orientador e se torna Conselho do Fundo Amazônia. Na proposta do governo, terá reuniões semestrais. "O comitê gestor irá acompanhar mais de perto o andamento dos projetos e o trabalho do BNDES ", explica Salles.

A proposta, na sua visão, "dá mais gestão" ao fundo. "Queremos ter estratégia clara do tipo de projeto [financiado] e o acompanhamento do desempenho destes projetos ao longo de sua execução".

O governo estaria em fase final de preparação de projeto para mitigar emissões de gases estufa com o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), dos países do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Seriam US$ 500 milhões para gestão do lixo, diz Salles. "É recurso novo, independente. Não é Fundo Clima."

Segundo fonte do Banco do Brics ouvida pelo Valor, os termos do empréstimo serão discutidos nas próximas semanas. O representante brasileiro na diretoria do NDB é o secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, que deve advogar pela aprovação do empréstimo.

A fonte do Banco dos Brics explica que o tomador do empréstimo junto ao NDB é o MMA que, a princípio, deve aportar o dinheiro no Fundo Clima, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O formato foi confirmado ao Valor pelo titular da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Economia (SAIN), Erivaldo Gomes, responsável do governo pela aprovação de financiamentos externos.

Segundo a fonte, o empréstimo de US$ 500 milhões terá a garantia do Tesouro Nacional, o que permite um juro anual entre 0,65% e 1,35% acrescido da taxa Libor, o que aumenta de acordo com o tempo de repagamento, de oito a 19 anos.