Valor Econômico, v. 20, n. 4889, 28/11/2019. Brasil, p. A2

Teto do juro será alto para atenuar restrição de oferta

Alex Ribeiro


O limite de 8% ao mês imposto pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) aos juros do cheque especial deve receber críticas dos dois lados. Os liberais mais puristas serão contra limites de preços; os intervencionistas acharão o percentual, que equivale a 151% ao ano, alto demais.

Mesmo num governo neoliberal, porém, pode-se admitir intervenções do governo, quando há as chamadas falhas de mercado. O BC identificou duas no cheque especial: baixa competição e pouca sensibilidade dos tomadores às variações de taxas de juros.

Um sinal da baixa competição é que, em agosto, a Caixa Econômica Federal baixou os juros do cheque especial em 30%, mas seus concorrentes privados não acompanharam a redução.

O produto não reage a preços. Os volumes de crédito contratados no cheque especial não cresceram em 2012, quando a Caixa e o Banco do Brasil cortaram os juros. Nem decresceram a partir de 2015, quando os bancos federais e os privados elevaram as taxas para um patamar ainda mais alto, perto dos 400% ao ano.

Outro sinal de que há pouca competição é que os bancos lucram muito nessas linhas. Embora o cheque especial represente 1% da carteira de crédito dos bancos, eles respondem por 10% da margem de juro do crédito, já excluídas as provisões. Ou seja: o cheque especial dá muito lucro aos bancos mesmo considerando a inadimplência.

Quando falta competição, uma das possibilidades é limitar preços. Outros países fazem isso, incluindo Inglaterra e Estados Unidos. O dilema do BC foi determinar um limite que não provoque restrição na oferta de crédito.

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, vinha lembrando que quem mais toma o cheque especial são os mais pobres. Pagam muito, mas pior seria ficar sem uma das poucas linhas de crédito a que têm acesso. Por isso, vinha argumentando que, na experiência internacional, quando há teto de juros, costuma ser alto.

O teto de 8% ao mês é alto demais? Depende dos parâmetros. O ranking das taxas de juros prefixadas cobrados de pessoas físicas mostra que, dos bancos que trabalham com o produto, apenas 11 cobram menos de 8% ao mês, em geral instituições de pequeno porte. Até a Caixa cobra mais do que esse percentual (9,38, na média, pelo dado mais recente, pois a estatística ainda não captura a baixa recentemente anunciada). Os grandes bancos cobram bem mais: Itaú, 12,43%; BB, 12,11%; Bradesco, 12,63%; e Santander, 14,82%.

Mas, do ponto de vista histórico, o teto de 8% para a taxa parece alto. Em dezembro de 2012, antes de os bancos fazerem uma escalada nas taxas, o Itaú e o Bradesco cobravam perto de 8% ao mês. Apenas o Santander cobrava mais do que o teto atual, com 9,8%. Os federais, seguindo determinação da presidente Dilma, cobravam 5% ao mês ou menos.

Um ponto a se considerar é que o limite vem com a autorização para os bancos cobrarem tarifas dos limites de cheque especial que não são utilizados, o que significa que o total de receitas dos bancos com o produto será bem maior.

O sistema de cobrança de tarifa adotado pelo CMN foi diferente do usado em outros países. No exterior, normalmente é autorizada a cobrança por evento, ou seja, o pagamento de tarifa cada vez que o cliente entra no vermelho no cheque especial. A Inglaterra aboliu o sistema porque tornava o preço mais opaco, já que os clientes entendem mais a taxa de juros anual.

Um dos riscos de impor um limite ao juro do cheque especial é que todo o sistema deve convergir para ele, o que reduz ainda mais as já remotas chances de competição no mercado.