Valor Econômico, v. 20, n. 4889, 28/11/2019. Brasil, p. A10
‘Regra de ouro’ seria cumprida sem crédito de R$ 248,9 bi
Ribamar Oliveira
Fabio Graner
Ao contrário do que se previa anteriormente, o governo cumpriria neste ano a chamada “regra de ouro” das finanças públicas sem o crédito adicional de R$ 248,9 bilhões, que foi aprovado em junho pelo Congresso Nacional, de acordo com o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. “Do ponto de vista contábil, a regra de ouro seria cumprida sem o crédito”, afirmou, em entrevista ao Valor.
Ao elaborar a proposta orçamentária de 2019, em agosto de 2018, o governo verificou que não cumpriria a “regra de ouro”, que proíbe que o aumento do endividamento público para financiar despesas correntes. Só pode fazê-lo para cobrir despesas de capital (investimentos e amortizações da dívida). Por isso, elaborou o Orçamento com R$ 248,9 bilhões de despesas condicionadas à aprovação futura, pelo Congresso, de uma autorização para emissão de títulos pelo Tesouro.
Na elaboração da proposta, explicou Mansueto, o governo não poderia ter considerado em seus cálculos sobre a “regra de ouro” o saldo final de 2018 da conta única passível de ser usado nesse cálculo (chamado de “superávit financeiro”), que só é conhecido no início do ano seguinte. E outras receitas que só se concretizam durante a execução orçamentária, como o montante do pagamento antecipado pelo BNDES dos empréstimos tomados com o Tesouro.
A mudança na avaliação sobre a insuficiência para o cumprimento da regra de ouro, segundo o secretário, decorreu de três fatores. O primeiro foi que, somente no início deste ano, foi possível saber o montante do superávit financeiro do Tesouro em 2018. Em março passado, por exemplo, o BC transferiu R$ 25,9 bilhões do seu resultado operacional e de equalização cambial relativo ao segundo semestre de 2018. Em setembro deste ano, o BC transferiu mais R$ 21,4 bilhões, em decorrência de seu resultado positivo no primeiro semestre de 2019. Assim, o BC contribuiu com R$ 47,4 bilhões para o cálculo.
O segundo fator foram os pagamentos antecipados dos empréstimos feitos pelo BNDES. O total neste ano, negociado com a direção do banco estatal, será de R$ 123 bilhões, sendo R$ 30 bilhões a serem pagos nas próximas semanas.
O terceiro fator, explicou o secretário, foi a reavaliação do resultado primário do governo central (Tesouro, Previdência e Banco Central) neste ano. Os cálculos anteriores da “regra de ouro” levavam em consideração um déficit primário de R$ 139 bilhões, que é a meta para o ano definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). “Agora, o governo espera um déficit inferior a R$ 80 bilhões”, disse Mansueto.
Ele explicou que o melhor resultado fiscal só ficou evidente recentemente. Assim mesmo, o valor final ainda dependerá do nível de “empoçamento” de recursos que ocorrerá até dezembro. “O empoçamento deve explodir em novembro e dezembro.” A razão é que o governo vai liberar muitos recursos para os ministérios, devido aos vários descontingenciamentos realizados nas últimas semanas, e eles não conseguirão gastar tudo.
O secretário afirmou ainda que o crédito suplementar era indispensável para a execução orçamentária porque as despesas têm prazos definidos para serem pagas e os recursos incorporados ao caixa do Tesouro, como o lucro do BC e os pagamentos do BNDES, ocorreram ao longo do ano. “Há uma questão temporal que precisa ser considerada.”
Além disso, Mansueto chamou a atenção para o fato de a LDO válida para este ano não ter permitido a troca de fonte, ou seja, não autorizou que os recursos que foram sendo incorporados ao caixa do Tesouro pudessem substituir os recursos decorrentes da emissão dos títulos autorizada pelo Congresso. Para 2020, a troca de fontes será possível, pois está autorizada na LDO, explicou.
O uso do crédito suplementar aprovado pelo Congresso para cumprir a “regra de ouro” neste ano permitirá, informou o secretário, manter cerca de R$ 230 bilhões disponíveis no caixa do Tesouro. O dinheiro será usado para reduzir a necessidade do crédito suplementar de R$ 361,5 bilhões, que foi solicitado na proposta orçamentária de 2020.