Valor Econômico, v. 20, n. 4815, 15/08/2019. Brasil,  p. A6

Guedes vê avanços, mas diz não estar feliz com reforma da Previdência

 Fernando Exman
 Lu Aiko Otta



O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou a empresários que as medidas do governo podem gerar crescimento de 3% ou 4% por ano nos próximos oito anos. Mas reconheceu não estar feliz ainda com a reforma da Previdência, pois não chegou ao objetivo final, que é a instituição do sistema de capitalização. Sem a reforma completa, segundo ele, o governo não consegue gerar empregos "aos milhões" nem acumular capital.

"Esses dois itens estão faltando", disse em reunião com empresários e entidades que foram à Câmara pressionar pela aprovação da Medida Provisória 881, da Liberdade Econômica. A afirmação foi feita numa reunião fechada à imprensa, mas o Valor teve acesso à fala do ministro.

"Demos um passo inicial na Previdência, mas está todo mundo feliz", comentou. "Nós não estamos ainda."

As mudanças aprovadas na Câmara, agora sob análise do Senado, são suficientes apenas para "consertar ou pelo menos dar fôlego para essa Previdência antiga". Segundo ele, ficou faltando a capitalização: "Que é o objetivo final nosso para colocar o Brasil para crescer".

A MP 881 destrava a economia, na visão de Guedes. "A curto e médio prazos temos um espaço grande de atuação que pode criar um crescimento de 3% e 4% ao ano por três, quatro, cinco, seis, sete, oito anos seguidos, se tivermos sucesso nesse destravamento da economia", estimou. Sua equipe calculou que, em dez anos, a medida pode elevar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 7% e gerar 3,7 milhões de empregos.

Ontem, a Câmara se preparava para concluir a votação dos destaques à MP, enquanto Guedes se reunia com esses interlocutores do setor privado. O secretário de Desburocratização do Ministério da Economia, Paulo Uebel, disse esperar que sejam todos rejeitados. Depois, o texto segue para o Senado.

A proposta é composta por três pilares: os direitos fundamentais do empreendedorismo, a coibição de abusos do Estado e a segurança jurídica. Segundo Guedes, desde a campanha o presidente Jair Bolsonaro falava em "tirar o Estado do cangote do povo". Ao criticar os excessos do Estado, o ministro voltou a afirmar que há no Brasil 200 milhões de "trouxas" sendo abastecidos por "quatro de tudo": quatro empreiteiros e quatro bancos, por exemplo.

"Tem quatro de tudo aqui no Brasil. O resto é pequenininho e massacrado lá embaixo. Não existe uma classe média empresarial emergente. Ou você é grande o suficiente para se acertar lá em cima, e nós sabemos os acertos das criaturas do pântano com os piratas privados. Ou você é pequenininho e fica embaixo do radar. Se você for médio, é uma situação complicada. É muito complicada a situação do empresário médio", discursou.

Em tom descontraído, ainda comentou que o Brasil está sofrendo com a competição, mas fica criticando as engrenagens. "Na Europa, cada indivíduo já nasce aposentado. Enquanto que o chinês que nasce, eles já pegam o bebê, botam uma tela plana nas costas e jogam no Oceano Pacífico para o garoto vir vender para a gente, o europeu já nasce aposentado. E o americano já nasce comprando e vendendo papel. Se não fosse o Vale do Silício, já tinha afundado também", comentou.

De acordo com o ministro, a longo prazo, o enriquecimento de nações e indivíduos depende de acumulação de capital, além do desenvolvimento de tecnologias e da educação, recursos naturais e uma superestrutura institucional. "Países com muitos recursos naturais, como o Brasil, não conseguem transformar em riqueza esses recursos exatamente porque essa superestrutura institucional é muito ruim. Somos prisioneiros cognitivos de modelos obsoletos", afirmou.

Ele acrescentou que o grande desafio do país é transformar esses recursos naturais em capital humano, conhecimento, educação e tecnologia. E isso só é possível com uma superestrutura conceitual, jurídica política mais sofisticada, que o Brasil não tem. "O Brasil está engatinhando ainda. Você vê a dificuldade que é dar um emprego para alguém, é muito difícil você gerar um emprego."

A MP 881 cria um ambiente melhor para o empreendedorismo, afirmou o ministro. Ele informou que, após alterar "o ecossistema" empresarial, o secretário Paulo Uebel vai agora mergulhar na reforma do Estado.

Mudanças na máquina são um dos itens da agenda do governo. O próximo passo, disse o ministro, é a reforma tributária. Além disso, já está começando o choque de energia barata, com a desregulamentação do mercado do gás. "O Brasil vai ter energia termelétrica bem mais barata", afirmou. Com isso, será possível fazer a "reindustrialização" do país.

Haverá também impacto para as famílias de menor renda. "Vamos atingir as classes mais baixas com um botijão de gás 30%, 40% mais barato", disse. O Novo Mercado do Gás, complementou, rompe dois monopólios da Petrobras: o da exploração e o da distribuição. Outra frente são as privatizações, que o ministro quer acelerar. "Vamos fazer a reforma tributária, vamos fazer privatizações, vamos abrir a economia, vamos simplificar o Estado e desregulamentar', listou.