Valor Econômico, v. 20, n. 4889, 28/11/2019. Finanças, p. C2
Estímulo monetário não chega a crédito
Alex Ribeiro
Estevão Taiar
As concessões de crédito dessazonalizadas apresentaram em outubro queda generalizada em seus vários segmentos, num sinal de que os estímulos monetários feitos pelo Banco Central (BC) a partir de julho ainda não chegaram às engrenagens da atividade econômica. Por enquanto, os cortes na Selic influenciam apenas as taxas de juros cobradas pelos bancos, que em algumas linhas são as menores da série estatística do BC.
As concessões de crédito total tiveram recuo de 1,96% em outubro, ante setembro, nos dados dessazonalizados, segundo a nota de crédito divulgada ontem. Já as concessões do crédito livre, mais sensíveis aos estímulos monetários, tiveram recuo de 2,4% no mês. O recuo nas concessões do crédito livre atinge tanto o segmento de pessoas físicas (queda de 0,97%) quanto de pessoas jurídicas (redução de 3,59%). A exceção foi o crédito livre não rotativo (exclui cheque especial e cartão de crédito), que apresentou aumento de 2,62%.
O Itaú também calcula queda das concessões dessazonalizadas. Nas estimativas do banco, o recuo do crédito livre foi de 1,1%, já descontada também a inflação. No caso das pessoas físicas e jurídicas, as contrações foram de 0,5% e 1,8%, respectivamente.
O desempenho do mercado de crédito vem sendo acompanhado com especial atenção por membros do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. O colegiado tem chamado a atenção para o risco de os cortes na taxa básica de juros se transmitirem com mais força para a economia depois com a mudanças recentes no mercado de crédito - com mais crédito livre e de bancos privados, e recuo do crédito direcionado e dos bancos públicos.
Num conceito bastante citado pelos membros do Copom - as concessões acumuladas em 12 meses - houve certa estabilidade no período. No crédito total, elas passaram de 12,5% para 12,7% entre setembro e outubro; no crédito livre, recuaram ligeiramente, de 13,5% para 13,4%. O quadro é distinto entre o crédito livre a empresas, cuja taxa de expansão se desacelerou de 12,2% para 11,5%, e o crédito livre a pessoas físicas, que ganhou impulso, de 14,5% para 14,9%, sempre comparando a variação em 12 meses entre setembro e outubro.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, vem citando em especial a taxa de expansão das concessões acumuladas em 12 meses do crédito livre não rotativo a pessoas físicas. Nesse caso, houve um discreto avanço, de 27,2% par 27,7%, entre setembro e outubro.
No mês passado, houve também aceleração do crescimento dos estoques de crédito. O saldo total subiu 0,3% em relação a setembro, para R$ 3,372 trilhões. No acumulado de 12 meses, a alta foi de 6,3% - expansão mais forte do que os 5,8% registrados até o mês anterior. Além disso, a alta de outubro foi a mais forte nesse tipo de comparação desde dezembro de 2015. O crescimento vem sendo puxado principalmente pelo crédito livre, que teve alta em todos os meses do ano, segundo Fernando Rocha, chefe do departamento de estatísticas do BC.
Mas as concessões têm uma correlação mais forte com a atividade econômica do que os estoques - esses últimos podem oscilar devido a fatores como variação da cotação do dólar, renegociação de dívidas a incorporação de juros ao principal.
Embora ainda não tenha tido um efeito expressivo nas quantidades de crédito, os cortes da taxa Selic estão reduzindo os juros bancários. Em outubro, a taxa de juros média ficou em 23,9%, um recuo de 0,6 ponto em relação ao mês anterior. Além disso, quatro linhas foram no mês passado para as suas mínimas históricas. São elas: antecipação da fatura do cartão de crédito (11,2%); aquisição de veículos para pessoas jurídicas (12,4%); capital de giro (15,2%); crédito consignado (20,9%).
A taxa básica de juros está atualmente em 5%. O BC vem sinalizando mais um corte de 0,5 ponto para a próxima reunião do Copom, que será realizada na segunda semana de dezembro.
Historicamente, a resposta do crédito à política monetária está dentro do padrão. Um box do Relatório de Inflação de março de 2018 mostra que os juros bancários começam a reagir um ou dois meses depois de o BC começar o ciclo de baixa da Selic. Já as concessões apresentam crescimento entre seis e oito meses depois.