Valor Econômico, v. 20, n. 4821 23/08/2019. Brasil, p. A6
STF barra corte salarial de servidor mesmo sem concluir julgamento
Mariana Muniz
Com placar de seis a quatro, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou, ontem, maioria de ministros para barrar o dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que trata da possibilidade de que Estados e municípios em crise reduzam o salário de servidores quando os gastos com pessoal ultrapassarem o teto previsto em lei, de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL) com gasto de pessoal
O resultado não é definitivo: o julgamento foi suspenso pelo presidente da corte, ministro Dias Toffoli, para que o ministro Celso de Mello possa participar. O decano teve que se ausentar devido a uma pneumonia leve.
Embora ainda não seja definitivo, o desfecho desagrada Estados e municípios em crise, que esperavam do Supremo algum alívio aos cofres públicos.
O caso ainda não tem data para voltar à discussão. O impasse se deve porque não foi formada maioria de seis votos sobre a possibilidade da redução da jornada dos servidores - a Constituição determina que uma lei só pode ser declarada inconstitucional com maioria absoluta de votos.
O imbróglio foi gerado pelo voto "médio" da ministra Cármen Lúcia: contra a redução de salários, mas a favor da redução de jornada. Além dela, votaram de maneira contrária à redução dos salários os ministros Edson Fachin, que abriu a divergência, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Marco Aurélio Mello. O artigo que prevê a redução na LRF está suspenso desde 2002 por meio de uma medida cautelar.
Em seu voto, Fachin afirmou que não há como reduzir o salário de servidores públicos já que a Constituição "não merece ser flexibilizada por mais pesadas que sejam as neves dos tempos". "Entendo que a ordem constitucional preconiza como primeira solução em caso de descontrole dos limites de gastos com pessoal o que está no parágrafo terceiro do artigo 169", disse.
Minoria, quatro ministros votaram a favor de permitir redução temporária: o relator, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
O relator afirmou que "estabilidade do serviço público tem uma função importantíssima" e que um meio termo é a "flexibilização" da irredutibilidade dos salários. "Será que o servidor público prefere ser demitido a manter seu cargo, manter sua carreira? A discussão não se dá entre ter essa flexibilização e continuar como está, é entre ter a flexibilização temporária ou ser demitido", disse.
O julgamento de oito ações que questionam 26 artigos da LRF - criada em 2000 - se arrasta no Supremo desde fevereiro deste ano. Ontem, os ministros também suspenderam a conclusão sobre a manutenção, ou não, do dispositivo que autoriza o Poder Executivo a restringir unilateralmente o repasse de recursos aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública quando a previsão de receita não se realizar e esses entes deixarem de promover o corte de despesas por iniciativa própria. Por ora, o placar está empatado.
Ontem, o plenário manteve os artigos 4º, 11 e 14. O artigo 4º, que dispõe que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deve levar em conta o cumprimento de metas, foi declarado constitucional. Essa foi a mesma interpretação dada ao artigo 11, que veda a realização de transferências voluntárias ao Estado ou município que deixar de exercer plenamente sua competência tributária - isto é, deixar de prever e arrecadar os tributos a ele atribuídos pela Constituição.