Título: O desenvolvimento social
Autor: Eduardo M. Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 02/10/2005, Outras Opiniões, p. A15
Durante os últimos meses de atenção à crise política, diminuiu a energia e o espaço para o exame da política econômica e social. É da maior importância, entretanto, que possamos fazer um balanço periódico das ações do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Por ocasião do 6º Foro de Biarritz sobre Desenvolvimento Econômico e Democracia Local, realizado em Bogotá, Colômbia, em 29 e 30 de setembro, tive a oportunidade de interagir com uma das principais lideranças indígenas do Continente, Auki Tituaña, de Cotacachi, o primeiro prefeito indígena eleito na história do Equador, em 1994, e que agora já está em seu terceiro mandato. Ele ficou muito interessado em conhecer melhor o conceito da Renda Básica de Cidadania, por concordar com os princípios de solidariedade e reciprocidade, presentes milernamente na cultura de seu povo, os Kichuas. Em sua exposição, Tituaña ressaltou os princípios importantes para os Kichuas como os de não ser ocioso, não ser mentiroso e não ser ladrão. Explicou que estas diretrizes, com um grande grau de participação democrática, são a razão de ter o respeito e o respaldo de seu povo.
No Brasil, quais os principais programas sociais que mais avançaram?
Até 2006 o programa Bolsa Familia se tornará o mais importante deles: foi o que mais cresceu desde 2003, é o mais abrangente e o que mais terá recursos no ano que vem. Trata-se de prover um complemento de renda a todas as famílias com renda mensal per capita inferior a R$ 100. Seja a familia de apenas um casal, ou que tenha crianças, ela passa a ter o direito de receber R$ 50 mais R$ 15, R$ 30 ou R$ 45, dependendo do número de crianças. Como contrapartida, a família deve vacinar as crianças de até 6 anos, e provar que as de 7 a 16 anos estejam freqüentando pelo menos 85% das aulas na escola.
Desde 2003, quando o governo resolveu unificar os quatro programas - Bolsa-Escola, Bolsa- Alimentação, Auxílio-Gás e Cartao-Alimentação - transformando-os no Bolsa Família, o número de famílias beneficiárias aumentou de 2,3 milhões para 7,7 milhões atualmente, prevendo-se atingir 8,7 milhões até o final deste ano. Para 2006, a meta é de 11,2 milhões de famílias, que corresponderão a aproximadamente 45 milhões de pessoas. O repasse médio por família cresceu de R$ 24,75 em 2003 para R$ 64,83 em junho de 2005. Hoje, o programa atinge cerca de 68% das famílias pobres do país. A meta é estar próxima de 100% até meados do próximo ano.
Os recursos despendidos pelo Bolsa Família evoluíram de R$ 2,3 bilhões, em 2003, para R$ 3,4 bilhões em 2003, e de R$ 5,7 bilhões em 2004, para R$ 6,5 bilhões em 2005. Essa soma corresponde a 183% a mais do que a despendida em 2002. Para 2006, a previsão de gastos é da ordem de R$ 10 bilhões.
O Ministério do Desenvolvimento Social também está coordenando esforços para uma gradual integração do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, o PETI, que prevê um benefício de R$ 25 ou R$ 40 mensais às famílias por criança, respectivamente na área rural e urbana, que deixar de realizar um trabalho precoce. Hoje o PETI atende 930 mil crianças e adolescentes em 2.788 municípios, devendo atingir a 1,1 milhão de crianças até o final deste ano, correspondendo a um investimento de R$ 532 milhões.
Em 2005, o programa de maior investimento do Ministério do Desenvolvimento Social é o de Benefício de Prestação Continuada, que provê um salário mínimo mensal aos idosos a partir de 65 anos e a pessoas com deficiência grave, que estejam em famílias com renda mensal per capita até ¼ de salário mínimo. Os investimentos com esse programa devem chegar a R$ 8,5 bilhoes em 2005, 108% a mais do que em 2001.
O ministério ainda desenvolve programas de acesso à alimentação e à água, como o de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, o do Leite, o da Construção de Cisternas, o de Alimentação Escolar, o de Alimentação para Populações Tradicionais e Grupos Vulneráveis; o de Restaurantes Populares, com bancos de alimentos, cozinhas e hortas comunitárias; o Sentinela, de enfrentamento ao abuso e à exploração sexual contra crianças e adolescentes, incluindo o Disque-Denúncia, e o de atenção integral à familia, através de 1007 unidades das Casas de Familia, que atendem 265 mil famílias, em 734 municípios, incluindo o atendimento de comunidades quilombolas e indígenas.
Na última terça-feira conversei com o ministro Patrus Ananias sobre como será a gradual transição do Bolsa Família e outros programas de transferência para a Renda Básica de Cidadania, conforme prevê a lei 10.835 de 8 de Janeiro de 2004. Ele manifestou algumas dúvidas legítimas, sobre a possibilidade de atingir de fato todas as pessoas no Brasil, a obtenção dos recursos necessários para melhor atender aos objetivos de bem estar para todos. Estes temas serão objeto de reflexão no Seminário Nacional de Transferência de Renda, que será realizado na PUC em novembro próximo, e também no Congresso da ANPEC (Associação Nacional dos Centros de Pós-graduação em Economia), em dezembro próximo, em Natal.