Valor Econômico, v. 20, n. 4829 04/09/2019. Opinião, p. A10

Justiça ainda corre atrás das próprias metas de eficiência


 

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Dias Toffoli, comemorou o desempenho do Judiciário em 2018, divulgado na semana passada no relatório "Justiça em Números". Toffoli festejou especialmente a redução do estoque de processos em tramitação em todas as instâncias, pela primeira vez em dez anos, desde que a série começou a ser calculada. Depois de ter beirado 80 milhões de processos em 2017, ou quase um processo por três habitantes, incluindo crianças, o estoque recuou ligeiramente para 78,7 milhões, em 2018. Mas há ainda um grande trabalho a fazer, reconheceu o ministro.

A Justiça, que adquiriu grande protagonismo nos últimos anos, a partir da Operação Lava-Jato e do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, ainda tem muito a fazer para ser mais eficiente para o cidadão comum e também para as empresas que precisam recorrer aos tribunais. Afinal, o estoque de processos apresentou apenas uma pequena redução de 1,2% de um ano para outro. Ao longo dos últimos dez anos, acumula salto de 30%, saindo de 60,7 milhões em 2009, e é certamente uma das razões de custos e ineficiência da economia.

A taxa de congestionamento, que mede a efetividade dos tribunais levando em conta tanto os casos novos como os baixados e o estoque pendente, teve uma pequena diminuição, mas ainda está acima do patamar do início da década em várias instâncias. Nos julgamentos em primeiro grau, por exemplo, a taxa de congestionamento recuou em 2018 para 78,2% na comparação com os 78,5% de 2017, mas está acima dos 77,4% de 2014. Na segunda instância, o congestionamento foi de 52% em 2018, abaixo dos quase 54% de 2017 e acima dos 48,3% de 2013.

Além disso, a queda inédita do estoque de processos é atribuída principalmente à diminuição de casos novos ingressados nos tribunais ao longo do ano passado, especialmente na esfera trabalhista. Deram entrada na Justiça 28 milhões de processos em 2018, 1,9% a menos do que em 2017. A procura pelos tribunais voltou ao nível de 2013. A reforma trabalhista, que entrou em vigor no final de 2017, teve influência decisiva ao obrigar a parte derrotada a pagar os horários de sucumbência. Anteriormente, mesmo se vencido na Justiça, o trabalhador não precisava pagar o honorário devido ao advogado da parte vencedora. A Justiça do Trabalho recebeu 2,5 milhões de processos no ano passado, 949 mil a menos do que em 2017.

O segundo fator foi o aumento da produtividade dos juízes - que subiu a 4,2% - em todas as instâncias judiciais. Em 2018, foi julgado quase 1 milhão de ações a mais do que em 2017. Em termos absolutos, foram 32,3 milhões de sentenças. Outro fator que teve influência foi a expansão da informatização dos tribunais: só 16,2% das ações judiciais entraram no Judiciário ainda na forma de papel em 2018.

Em relação ao cumprimento das metas fixadas pelo CNJ com participação dos próprios tribunais e juízes, o desempenho é irregular. A primeira meta estabelece que os tribunais devem julgar mais processos do que foram distribuídos. Para a Justiça do Trabalho foi estabelecido o índice de 92%, cumprido com folga dada a queda das novas ações. Na verdade, a Justiça do Trabalho apresentou o índice de 119,9%. Os tribunais superiores se destacaram também, com 120% do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Já a Justiça Estadual cumpriu 99,6% da meta; e a Justiça Eleitoral, 98,1%. Neste ano, o resultado global do primeiro semestre está aquém, com 9 milhões de processos julgados para 9,4 milhões distribuídos. Até o fim do ano devem ingressar 20 milhões de processos no sistema.

Um campo em que há muito espaço para a Justiça melhorar é o das despesas. Os gastos totais do setor somaram R$ 93,7 bilhões em 2018, com queda real de 0,4% em consequência da redução das despesas correntes. Os gastos com pessoal (450,1 mil pessoas) estão estabilizados e absorveram 90,8% do total, sendo 84,8% para pessoal da ativa, inativos e pensionistas, e o restante com terceirizados e estagiários. As despesas médias mensais com magistrados somaram nada menos do que R$ 46,8 mil, incluindo remunerações, indenizações, encargos sociais, previdenciários, e até Imposto de Renda e viagens a serviço. Com servidores, o gasto médio foi de R$ 15,4 mil. O relatório destaca que esses valores não correspondem ao salário dos funcionários, mas ao custo da Justiça; e a soma do IR (até 27,5%) com a previdência (11%), incidentes sobre a remuneração total, podem ter impactos de quase 40% na folha de pagamento.