Título: Poetas e profissionais
Autor: Marcelo Medeiros
Fonte: Jornal do Brasil, 03/10/2005, Outras Opiniões, p. A11

Apurados os votos da eleição para a Presidência do Partido dos Trabalhadores, o deputado paulista Ricardo Berzoini liderou a apuração com 41,9% dos votos, apesar de ter perdido a maioria numérica que serve para determinar o número de integrantes do Diretório Nacional (81 dirigentes) e da Executiva do Partido.

Berzoini disputará o segundo turno, no próximo dia 9, com o deputado estadual gaúcho Raul Pont, que obteve 14,7%.

Pressuroso de suas funções, Ricardo Berzoini, quando ministro da Previdência Social, em 2003, suspendeu o pagamento dos benefícios dos aposentados e pensionistas com mais de 90 anos, até que se recadastrassem novamente.

Cerca de 105 mil aposentados e pensionistas, centenários e nonagenários, foram obrigados a enfrentar as filas do INSS. Muitos tiveram que sair de hospitais e asilos para fazer o recadastramento. O pandemônio foi tal, que em quatro dias a medida teve que ser revogada.

Berzoini representa a corrente governista do ''campo majoritário''. É a corrente do Zé Dirceu, do Delúbio Soares, do caixa dois, do valerioduto, do mensalão, e de todos os petistas envolvidos, criminosamente, na corrupção.

Para Hélio Bicudo, fundador do PT: ''O partido se afastou dos ideais éticos''. Plínio de Arruda Sampaio, também fundador do Partido dos Trabalhadores, lamenta que no PT ''o socialismo tornou-se mera referência retórica; a consulta às bases, uma ficção''.

Os dois deixaram o PT, que está perdendo seus melhores quadros. A bancada na Câmara já não é mais majoritária. O PMDB passou à frente. Lula, que liderava a corrida sucessória, segundo as pesquisas, perde no segundo turno para José Serra. A perspectiva do desempenho eleitoral do PT nas próximas eleições é catastrófica. Em pouco mais de dois anos e meio o partido minguou: pela roubalheira e pela incompetência.

Não considerando a opinião dos banqueiros, tudo deu errado. Quer na política interna, quer na megalômana política externa. O Brasil foi derrotado em todos os pleitos internacionais. Pôs em risco alianças vitais na América do Sul e criou ressentimentos com parceiros comerciais, especialmente a Argentina.

Eleito, Ricardo Berzoini, com o seu notório bom-senso, enfrentará no diretório nacional e na executiva do partido, uma oposição maior e mais agressiva do que enfrentou José Genoino nesses últimos dez anos.

A conseqüência do aumento da participação das correntes contrárias à política do governo Lula, que obtiveram mais de 50% dos votos nas eleições para a direção do PT, será a modificação imediata da política econômica.

Não existe uma fórmula mágica para os governistas se reelegerem, sem a redução dos juros e sem que o país volte a crescer, com aumento de empregos, salários e distribuição de renda.

Em tempo de eleições, os políticos são pragmáticos; disputam, com garra, voto a voto. São profissionais.

Quando perguntaram ao candidato Tancredo Neves, o que ele achava do ministro Mário Andreazza, que ungido pela ditadura pretendia também disputar a eleição presidencial, Tancredo ironizou: ''Trata-se de um poeta....''.

Embora o secretário do Tesouro dos EUA, John Snow, tenha feito reiterados elogios ao ministro Palocci e à política econômica brasileira, o FMI prevê para 2005 uma taxa de crescimento da economia brasileira de 3,3%. Abaixo da média mundial (4,3%) e dos principais países latino-americanos. A América Latina deverá crescer em média 4,1% este ano; a Venezuela crescerá 7,8%, a Argentina 7,5% e o Uruguai, 6%. O Fundo Monetário atribui à alta dos juros e às crises políticas, o crescimento pífio da economia.

Para o ''Informe Econômico'' do JB: ''Quando o secretário do Tesouro dos EUA rasga-se em elogios ao ministro da Fazenda do Brasil - que faz a alegria dos investidores de curto prazo, oferecendo os mais altos juros do planeta -, alguém está fazendo papel de bobo''.