Título: Chacina vira dossiê após seis meses
Autor: Ricardo Albuquerque
Fonte: Jornal do Brasil, 01/10/2005, Rio, p. A14

Seis meses depois da chacina de 29 pessoas na Baixada Fluminense, entidades ligadas aos direitos humanos lançaram ontem, no Centro de Direitos Humanos de Nova Iguaçu, o dossiê Impunidade na Baixada Fluminense sobre o crime que teve repercussão internacional. Com 75 páginas, o documento apresenta 30 propostas ao Ministério Público, ao Congresso Nacional, à Secretaria Nacional dos Direitos Humanos e aos governos federal, estadual e municipal, para dar fim aos grupos de extermínio que atuam na região. Entregue às autoridades, o dossiê será transformado em livro com lançamento previsto para o próximo mês. Parentes das vítimas compareceram ao evento, indignadas com a morosidade da Justiça e a burocracia para obter a pensão vitalícia prometida pelo governo do estado. A presidente da Associação dos Familiares de Vítimas de Violência na Baixada Fluminense, Cátia Patrícia da Silva, 31 anos, protestou contra o fato de sua mãe, Lucinéia Maria Cipriano, 53, ser obrigada a abrir uma conta-corrente para ter direito ao auxílio.

- Há 15 dias, estamos tentando uma audiência com o secretário Marcelo Itagiba. Espero que ele nos receba para dar informações sobre as investigações - afirma Cátia Patrícia, que teve o irmão Marcos Vinicius Cipriano de Andrade, 15, e o primo Francisco José da Silva Neto, 34, assassinados na noite de 31 de março.

O drama das famílias para obter a pensão vitalícia no valor de três salários-mínimos (R$ 900) é minimizado por Rodrigo Lemos de Oliveira, chefe da assessoria jurídica da Secretaria estadual de Direitos Humanos. Segundo ele, dez dos 19 processos abertos pela secretaria caíram em exigência por falta de documentos. Lemos de Oliveira explica que as pessoas devem reunir os documentos (certidões de óbito, nascimento ou casamento; identidade, CPF e comprovante de residência) para dar entrada no pedido, que vira um processo administrativo antes de ser remetido ao Gabinete Civil da governadora para ser publicado no Diário Oficial. A previsão do assessor é de que a partir de dezembro as 31 famílias comecem a receber o benefício.

- Estamos orientando as pessoas para acelerar a operação. Não há burocracia - observa Lemos de Oliveira.

O secretário estadual de Direitos Humanos, coronel Jorge da Silva, reconheceu a truculência dos policiais, e apontou o descontrole dos comandantes de batalhão como um dos principais fatores para a violencia policial. O coronel revelou que pediu à governadora Rosinha Matheus para receber parentes de vítimas em seu gabinete.

- Sinto-me envergonhado de ver isso acontecer na corporação, mas podem ter certeza de que estamos ajudando a Justiça no recolhimento de provas contra esses matadores profissionais - desabafou o secretário.

Na 4ª Vara Criminal de Nova Iguaçu, a juíza Elizabeth Machado Louro negou ontem o pedido de transferência de quatro policiais militares, presos no Batalhão Especial Prisional (BEP), em Niterói, para outras unidades. Os PMs alegaram que temiam sofrer represálias por parte de outros detentos. Os 11 acusados da chacina permanecem presos, três deles no 24º BPM (Queimados) e os demais no BEP. No próximo dia 21, será feita reconstituição do crime no Bar do Caíque, em Queimados, a pedido da defesa.

- O processo está em fase de conclusão. Acredito que eles irão a júri popular em seis meses - prevê o promotor Marcelo Muniz.