Valor Econômico, v. 20, n. 4911, 03/01/2020. Finanças, p.C8

Como medir o risco do seu fundo de crédito privado?

Natália Coura


Nos últimos anos, é visível a maior intimidade que o investidor brasileiro tem mantido tanto com diferentes tipos de investimentos quanto com diferentes formas de acessar esses produtos.

À medida que a taxa Selic diminuía, víamos uma crescente busca por produtos com rentabilidades superiores, pois já não era mais prudente concentrar os investimentos na poupança ou em fundos DI tradicionais.

Um dos principais destinos dessa migração de investimentos foram os fundos de crédito privado. Eles caíram no gosto do investidor brasileiro tanto por conseguir retornos melhores quanto ela baixa oscilação na rentabilidade. O investidor pisou em um novo terreno, que à primeira vista era firme e agradável.

Para exemplificar esse crescimento, em 2016 havia R$ 10 bilhões em fundos de crédito privado, considerando somente gestores independentes. Atualmente, esse número é de R$ 55 bilhões, um aumento de 550% em apenas três anos.

Por outro lado, uma questão central é que o risco desses produtos não fica expresso na volatilidade. O que fazer para avaliar o risco desses produtos?

O primeiro ponto é avaliar o histórico. Não para saber quanto rendeu, mas para verificar como o gestor se comportou em diferentes cenários. Se o gestor enfrentou alguma inadimplência, como foi o impacto no fundo? Nos períodos de maior risco de crédito, como ele estava posicionado? Quando teve dinâmicas adversas com o passivo, o que o gestor fez?

Outro aspecto de suma relevância é a liquidez. Quanto maior o prazo médio dos ativos, mais o preço pode oscilar, e maior pode ser o custo

para negociar esses ativos. Assim, se o gestor pode ser surpreendido com a necessidade de vender ativos para pagar resgates de um dia para outro, ele tem menos flexibilidade para trabalhar a venda do que se tivesse semanas para se planejar.

Com um prazo maior entre o pedido e o pagamento do resgate, o gestor tem mais flexibilidade para se programar, vender títulos com menos pressão, o que tende a reduzir o impacto desse custo de liquidez para a rentabilidade do fundo.

Ao escolher fundos com um prazo de resgate maior, o investidor permite ao gestor trabalhar com mais eficiência e segurança. A marcação a mercado, que é a precificação diária dos títulos que os fundos possuem em carteira, é outro aspecto que precisa ser bem entendido. Ela é o termômetro mais visível da oscilação na rentabilidade do dia a dia e se dá tanto por questões de melhora/deterioração das métricas de crédito de um emissor, quanto por questões de oferta e demanda desses ativos.

A maneira de medir a remuneração pelo risco de crédito é conhecida como spread de crédito. Essa medida é o quanto esse título rende a mais que o título público equivalente, que é considerado o ativo livre de risco. Em suma, é a taxa das debêntures, e a variação dessa taxa afeta a marcação a mercado.

Um exemplo de fechamento (redução) nas taxas das debêntures ocorreu nesses últimos dois anos. Com a queda da Selic, a qualidade de crédito das empresas melhorou, já que passaram a gastar menos com pagamento de juros. Isso ocasiona uma diminuição do spread de crédito e valoriza os títulos, aumentando o retorno desses fundos.

O cenário de abertura (aumento) de taxas tem efeito oposto, mas a Selic não precisa subir para isso acontecer. E é isso que está acontecendo no mercado de crédito privado nas últimas semanas. Se os títulos estiverem sendo negociados a spreads de crédito tão baixos que deixam de ter demanda, os preços de negociação no mercado secundário precisam se ajustar até que as novas taxas sejam suficientemente atrativas para os investidores.

Embora não signifique uma perda definitiva, essa marcação a mercado gera um impacto desfavorável num primeiro momento, mas deixa os fundos com uma expectativa de retorno mais elevada.

No cenário de fechamento de taxas, os fundos com maior prazo médio e menos caixa devem ter melhor performance, mas no cenário de abertura de taxas, vale o oposto.

Enfim, chegamos ao risco de inadimplência, que é o evento mais dramático de um ativo de crédito privado. Quando um gestor analisa um ativo, faz uma varredura sobre a empresa emissora. Ele verifica o balanço dessa empresa, seu fluxo de caixa, nível de endividamento e outras questões mais qualitativas para avaliar se ela será uma boa pagadora.

Mas essa atividade não termina na aquisição: o gestor do fundo continua monitorando o ativo continuamente, e pode decidir vender o título caso observe uma piora na qualidade de crédito do emissor. Essa é uma das principais vantagens de se investir em crédito privado por meio de fundos.

Apesar do monitoramento contínuo reduzir o risco de inadimplência, imprevistos podem acontecer. Assim, trabalhar com uma carteira amplamente pulverizada faz todo o sentido para que esse impacto, caso ocorra, seja o menor possível.

É notório que os ativos de crédito privado podem trazer retornos melhores que a renda fixa tradicional. E uma forma muito eficiente de investir nessa categoria é por meio de fundos. No entanto, é importante que o investidor aprenda a escolher bons fundos de crédito privado, avaliando as características de cada fundo e o perfil do gestor.

Natália Coura, CFP, é sócia e diretora de distribuição da Sparta

Fundos de Investimentos
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