Valor Econômico, v. 20, n. 4850, 03/10/2019. Política, p. A10

Supremo adia votação de tese que revê sentenças da Operação Lava-Jato

Luísa Martins


O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou a votação da tese proposta por seu presidente, ministro Dias Toffoli, de limitar o alcance de possíveis anulações de sentenças da Operação Lava-Jato. O julgamento estava previsto para hoje, mas agora não há data definida.

Depois que o plenário decidiu que as alegações finais dos réus delatados devem ser apresentadas após as dos réus delatores, e não ao mesmo tempo, Toffoli sugeriu que as condenações que não obedeceram a essa regra só sejam invalidadas nos casos em que advogados suscitaram o problema na instância originária.

Toffoli também propôs que, para a revogação da sentença, deve ficar comprovado que os citados nas colaborações premiadas tiveram prejudicado o seu direito de defesa. Os demais ministros vão, futuramente, votar se acompanham ou não essa tese.

Na sessão de ontem, embora a maioria já estivesse formada, o ministro Marco Aurélio Mello - que não havia se manifestado na semana passada - votou. Aderindo à corrente minoritária, disse que delatores e delatados têm condição única no processo e que, na fase das alegações finais, não costumam vir à tona novas acusações das quais a outra parte precise se defender. Por outro lado, Toffoli classificou como “uma deslealdade processual” a designação de prazo concomitante para o envio dos memoriais.

Com o placar de 7 a 4 formalizado, o plenário discutiu se o resultado só valeria para o caso concreto - o do ex-gerente da Petrobras Marcio Ferreira - ou se teria impacto nas demais instâncias do Judiciário.

Oito ministros - Toffoli, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Celso de Mello - entenderam que, embora o processo tratasse de um réu específico, a decisão do STF deve servir de parâmetro para outros acusados. Já Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio compreenderam que a anulação só poderia valer para o caso de Ferreira. Mesmo vencidos neste ponto, eles também poderão votar sobre a tese, na futura sessão.

Para o Supremo, o envio simultâneo de memoriais por todos os réus - procedimento determinado pelo ex-juiz Sergio Moro (atual ministro da Justiça) em todos os casos que julgou em Curitiba - viola o direito ao contraditório e o direito de defesa, previstos na Constituição. Isso porque um réu delatado, segundo entendeu a Corte, tem o direito de se defender de todas as acusações que lhe são imputadas, inclusive das provenientes das alegações finais dos réus delatores.

Foi por esse motivo que, em 27 de agosto, a Segunda Turma da suspendeu condenação imposta por Moro ao ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras Aldemir Bendine. Com base nesse precedente, diversos outros réus da Lava-Jato buscam o mesmo benefício. Na prática, as ações penais voltam à fase das alegações, etapa anterior à sentença e que agora deverá ser cumprida aos moldes do que decidiu o STF.

Se o entendimento de Toffoli prevalecer, a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por exemplo, pode buscar nulidade de sentenças. pleiteia a liberdade do ex-presidente, preso em Curitiba por recebimento de propina da OAS, no caso do triplex no Guarujá (SP). Segundo os advogados, o petista apresentou seu memorial junto ao dono da empreiteira, Léo Pinheiro, que era corréu no processo. A controvérsia, porém, está no fato de que, à época, o empresário ainda não havia assinado acordo de delação com o Ministério Público.

Há pelo menos outras duas ações penais contra o ex-presidente em que isso ocorreu: a que trata da obtenção de um terreno para a construção da nova sede do Instituto Lula e a que diz respeito ao sítio de Atibaia. A primeira ainda não teve sentença da 13ª Vara Federal de Curitiba e já voltou para alegações finais, por ordem de Edson Fachin. A outra e segunda instância e aguarda revisão da sentença pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). A força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba demonstrou “imensa preocupação” com a decisão, que “poderá anular praticamente todas as condenações” e levar à prescrição de crimes e à libertação de réus presos. Moro vai aguardar o fim do julgamento para se manifestar.