Valor Econômico, v. 20, n. 4949, 28/02/2020. Finanças, p. C10

Juro do cheque especial cai pela metade após teto

Estevão Taiar
Alex Ribeiro


A taxa de juros média cobrada pelos bancos no cheque especial caiu praticamente pela metade em janeiro, passando de 302,5% ao ano para 165,6% ao ano, de acordo com o Banco Central (BC). O recuo ocorreu depois de entrar em vigor um teto para os juros desta linha de crédito e após uma mudança metodológica na compilação das estatísticas de juros realizada pela autoridade monetária.

O fator que mais pesou foi o limite de 8% ao mês (151,82% ao ano) que as instituições podem cobrar pelo uso do cheque especial — medida imposta pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) no ano passado e que passou a vigorar em 6 de janeiro.

Simultaneamente, os bancos foram autorizados a cobrar uma tarifa de 0,25% sobre o limite de crédito disponível da linha acima de R$ 500. Para o Banco Central, o objetivo é corrigir imperfeições de mercado que existiam no cheque especial até o ano passado, que levavam os clientes de menor renda a arcarem com encargos mais altos do que os de maior renda.

Mas a queda dos juros também refletiu uma mudança no padrão estatístico. O BC permitiu aos bancos contabilizarem a isenção temporária de pagamento de juros na taxa média. Algumas instituições financeiras adotam a estratégia de marketing de isentar de cobrança de encargos por determinado período, adotando slogans como “dez dias sem juros no cheque especial”. Essa mudança no cálculo sozinha fez a taxa anual cobrada em dezembro cair de 302,5% para 247,6%.
“Essa revisão tem um claro viés [para baixo]”, disse Fernando Rocha, chefe do departamento de estatísticas do BC, em entrevista coletiva ontem, após a divulgação dos dados de crédito de janeiro.

A expectativa, no entanto, é que a partir de agora a taxa fique próxima do patamar atual. Isso porque o teto de 8% vale apenas para os juros. Fica de fora a cobrança de outros encargos, como o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que pode fazer com que a quantia total paga pelo usuário no fim do mês supere 8%, segundo Rocha. Em janeiro, por exemplo, os juros mensais médios ficaram em 8,5%. Além disso, a revisão metodológica não terá mais impactos daqui para a frente, de acordo com Rocha.

As estatísticas de crédito mostraram também queda dos empréstimos concedidos no começo de ano. No cálculo já dessazonalizado, as concessões totais recuaram 0,3% entre dezembro e janeiro, para R$ 344,9 bilhões. No caso do crédito livre, o recuo foi de 2,1% — o primeiro desde outubro —, para R$ 315,5 bilhões.

Ainda assim, economistas do setor privado afirmam que os recuos não interrompem a recuperação do mercado de crédito vista no ano passado.
“Os números mostram que as condições de crédito em geral continuaram a melhorar em janeiro, principalmente nos empréstimos para as pessoas físicas”, disse Alberto Ramos, diretor do departamento de pesquisa econômica para a América Latina do Goldman Sachs, em relatório. Ele cita como exemplos o crescimento de 12,2% das concessões no acumulado de 12 meses e os juros de 45,6% ao ano com recursos livres, o menor patamar desde dezembro de 2013.

“Neste início de 2020, o crédito manteve sua tendência de expansão”, segundo o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Na avaliação do instituto, esse desempenho do crédito tem sido “importante para injetar dinamismo no mercado doméstico, ajudando a viabilizar decisões de gasto das famílias e das empresas”.

Para o Banco MUFG Brasil, os números reforçam a “visão de que o mercado de crédito tende a ser um dos principais impulsionadores do crescimento da demanda doméstica” em 2020.